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República Battisti
Roberto Romano
Há um texto brasileiro sobre o conceito de “terrorismo” e nele se procura explicitar a punição d e grupos, indivíduos ou governos que intimidam adversários com a força, sem nenhum direito. Falo do trabalho escrito pela jurista Flávia Piovesan, "Terrorismo e o Direito Internacional dos Direitos Humanos, desafios e perspectivas" . Piovesan afirma: “Não há direitos humanos sem democracia e nem tampouco democracia sem direitos humanos. Vale dizer, o regime mais compatível com a proteção dos direitos humanos é o regime democrático. Atualmente, 140 Estados, dos quase 200 Estados que integram a ordem internacional, realizam eleições periódicas. Contudo, apenas 82 Estados (o que representa 57% da população mundial) são considerados plenamente democráticos”. Com ajuda de Piovesan examinei o processo que atrai brasileiros e italianos, o asilo político concedido a Cesare Battisti. Condenado na Itália, escondido na França e no Brasil, ele aqui permanece preso. Piovesan e o ministro da Justiça citam N. Bobbio, fonte de pensamentos na filosofia e no direito. Cito, pois, os textos de Bobbio sobre o terrorista.
Battisti foi condenado pela Justiça em processo aberto, com testemunhas e observadores isentos. Para reprimir os crimes cometidos pelo partido do réu, o Estado italiano gerou instrumentos legais sujeitos a exame jurídico, ético e político. Um deles é a delação premiada, hoje aceita no Brasil na busca de vencer o crime organizado. Marca democrática é a publicidade dos julgamentos e o direito de ampla defesa. Os dois pontos foram obedecidos no caso de Battisti e cúmplices. Tal é a diferença entre as ditaduras e ordem democrática: nas primeiras ocorrem julgamentos secretos, sem defesa efetiva.
A ideologia de Battisti nega todo “procedimento burguês”, como é o caso da justiça aberta. Battisti e sua república, quando adeptos do terror (mudaram?) não aceitaram o julgamento do Estado, exerceram uma justiça particular. Chego a Bobbio: “o terrorista é ou acredita ser, antes de tudo, um justiceiro. O que para nós, segundo o ponto de vista da ordem legal no Estado, se define como um assassinato, para o terrorista que não aceita a ordem estatal e considera o Estado como o principal inimigo a ser abatido, é condenação à morte. De um ato de justiça é perfeitamente inútil buscar os seus fins e os efeitos posteriores. No ato de justiça o alvo é justiçar, o que está implicado no próprio ato”. (“La logica del terrorismo” in L’ utopia capovolta , Torino, La Stampa , 1990).
O terrorista inverte o imperativo categórico. Pessoas seriam meios para o grande Fim, o advento da Virtude. O terrorista tem a máscara da Justiça colada no rosto. Os monopólios do Estado (força, lei, impostos), nas democracias supõem o controle cidadão, múltiplas vontades e cérebros unidos de modo universal. Tais monopólios são açambarcados pelos terroristas, banindo-se os demais humanos sem debate ou transparência. O terrorista se impõe como legislador e decreta leis que devem ser atendidas, mesmo que as pessoas as desconheçam. Sem urnas, ele faz-se poder Executivo e arranca bens de indivíduos e grupos. Ele anuncia a si mesmo como Judiciário e só ele julga o mundo com Justiça. Ele é polícia, espião, carrasco. Entre terroristas a pena de morte é norma e contra ela não existe recurso. A opinião pública é manipulada pelo terrorista, sem a réplica. Ou o mundo aceita a verdade, por definição a dele, ou está imerso na mentira.
Battisti é um Estado em miniatura. O real problema diplomático não ocorre entre Brasil e Itália, mas entre dois Estados e um germe de poder totalitário. O ministro brasileiro evoca o virulento C. Schmitt: a exceção (crime de Battisti) é justificada pela suposta exceção do Estado italiano. Mas assim como existiu uma tenebrosa República de Salò, existe uma República Battisti. Esta última também perdeu para a democracia. Sua acolhida no Brasil lhe confere a legitimidade que nunca teve nem pediu. Battisti negou tribunais às suas vítimas. Que ele obedeça a essência dos direitos humanos: pagar pelos crimes cometidos contra... os direitos humanos. Voltarei ao assunto.
Battisti foi condenado pela Justiça em processo aberto, com testemunhas e observadores isentos. Para reprimir os crimes cometidos pelo partido do réu, o Estado italiano gerou instrumentos legais sujeitos a exame jurídico, ético e político. Um deles é a delação premiada, hoje aceita no Brasil na busca de vencer o crime organizado. Marca democrática é a publicidade dos julgamentos e o direito de ampla defesa. Os dois pontos foram obedecidos no caso de Battisti e cúmplices. Tal é a diferença entre as ditaduras e ordem democrática: nas primeiras ocorrem julgamentos secretos, sem defesa efetiva.
A ideologia de Battisti nega todo “procedimento burguês”, como é o caso da justiça aberta. Battisti e sua república, quando adeptos do terror (mudaram?) não aceitaram o julgamento do Estado, exerceram uma justiça particular. Chego a Bobbio: “o terrorista é ou acredita ser, antes de tudo, um justiceiro. O que para nós, segundo o ponto de vista da ordem legal no Estado, se define como um assassinato, para o terrorista que não aceita a ordem estatal e considera o Estado como o principal inimigo a ser abatido, é condenação à morte. De um ato de justiça é perfeitamente inútil buscar os seus fins e os efeitos posteriores. No ato de justiça o alvo é justiçar, o que está implicado no próprio ato”. (
O terrorista inverte o imperativo categórico. Pessoas seriam meios para o grande Fim, o advento da Virtude. O terrorista tem a máscara da Justiça colada no rosto. Os monopólios do Estado (força, lei, impostos), nas democracias supõem o controle cidadão, múltiplas vontades e cérebros unidos de modo universal. Tais monopólios são açambarcados pelos terroristas, banindo-se os demais humanos sem debate ou transparência. O terrorista se impõe como legislador e decreta leis que devem ser atendidas, mesmo que as pessoas as desconheçam. Sem urnas, ele faz-se poder Executivo e arranca bens de indivíduos e grupos. Ele anuncia a si mesmo como Judiciário e só ele julga o mundo com Justiça. Ele é polícia, espião, carrasco. Entre terroristas a pena de morte é norma e contra ela não existe recurso. A opinião pública é manipulada pelo terrorista, sem a réplica. Ou o mundo aceita a verdade, por definição a dele, ou está imerso na mentira.
Battisti é um Estado em miniatura. O real problema diplomático não ocorre entre Brasil e Itália, mas entre dois Estados e um germe de poder totalitário. O ministro brasileiro evoca o virulento C. Schmitt: a exceção (crime de Battisti) é justificada pela suposta exceção do Estado italiano. Mas assim como existiu uma tenebrosa República de Salò, existe uma República Battisti. Esta última também perdeu para a democracia. Sua acolhida no Brasil lhe confere a legitimidade que nunca teve nem pediu. Battisti negou tribunais às suas vítimas. Que ele obedeça a essência dos direitos humanos: pagar pelos crimes cometidos contra... os direitos humanos. Voltarei ao assunto.