quarta-feira, 3 de julho de 2013

O Globo, 02/07/2013

Para especialistas, distância do poder favorece imagem de político

  • Datafolha: Dilma Rousseff sofre mais desgaste de apoio do que Lula
  • Marina Silva, possível candidata, cresceu 7 pontos em pesquisa
Larissa Ferrari (Email)
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RIO - Especialistas concordam que políticos os quais não estão exercendo um mandato podem ter sua reputação mais preservada em relação aos que estão no poder diretamente. A pesquisa do instituto Datafolha divulgada no último domingo revelou que a presidente Dilma Rousseff (PT) sofreu um desgaste maior de sua imagem do que o ex-presidente Lula (PT).

O estudo apontou que Luís Inácio Lula da Silva poderia até vencer em primeiro turno se disputasse a próxima eleição presidencial contra Aécio Neves (PSDB), Eduardo Campos (PSB) e Marina Silva. Ela, que tenta viabilizar o seu partido Rede Sustentabilidade, foi a possível candidata que mostrou maior crescimento nesse estudo de opinião. Marina, atualmente, não ocupa nenhum cargo público. Além disso, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Joaquim Barbosa, que se nega candidato, teve intenções de voto dobradas nesse levantamento.

Mauro Paulino, diretor do Datafolha; Roberto Romano, professor de Filosofia da Unicamp; e Rubens Figueiredo, diretor do Centro de Pesquisa e Análise de Comunicação (Cepac) chegam ao consenso de que Marina Silva e Joaquim Barbosa ganham força por conta da imagem desvinculada aos atuais partidos e à corrupção, em um cenário de protestos motivados justamente pela insatisfação em torno da representação política e o modelo tradicional.

O cientista político Rubens Figueiredo destaca que, mais do que a distância do poder, a impressão deixada pelo político no imaginário popular é fundamental para ele se destacar em momentos de crise do governo vigente. Para Figueiredo, Lula se encaixa bem nesse quadro por ser praticamente um mito para o seu eleitorado.

— Em situações de muita insatisfação, o que se procura é um “outsider”, um opositor ou um mito. O “outsider” seria a Marina Silva ou o Joaquim Barbosa. O opositor seria o Aécio Neves ou o Eduardo Campos, embora este esteja no mandato. O mito é o Lula, que teve um governo de inflação controlada, uma oferta generosa de crédito, mais consumo e desemprego caindo — comentou o cientista político.

Segundo o professor de Filosofia da Unicamp Roberto Romano, Luís Inácio consegue manter melhor a admiração de seus seguidores porque é “blindado” por seus colegas de partido e demais aliados, além de deter forte capacidade de persuasão.

— Lula tem a rapidez de retórica, de jogar contra os adversários os argumentos. Ele era um líder sindical. Acredito que os companheiros sempre assumiram os erros para salvar sua liderança. Esta é uma prática que parece substancial para a legenda petista. Lula garante um pacto interno. Você não sabe até que ponto ele desconhecia o mensalão e os seus comandados levaram a culpa para eximi-lo. Sua campanha publicitária tem a capacidade de mover multidões. A questão não é se as pessoas acreditam no Lula, mas que é muito difícil quebrar a relação de confiança com um líder que sabe mexer com o povo — afirmou Romano.

O professor da Unicamp também atribui o enfraquecimento da opinião pública sobre a gestão de Dilma à falta de informação que existe sobre as distribuições das funções políticas. Roberto Romano entende que todo o sistema brasileiro costuma ser hegemonizado pelo presidente.

— A população percebe no chefe de Estado a concentração de todo o poder político. Isso é uma coisa que herdamos há muito tempo do regime ditatorial. As pessoas confiavam demais em Getúlio Vargas por exemplo. Existe uma propaganda de que o presidente é aquele que realiza as coisas. Este é o principal problema. A hegemonia da Dilma é paga. É dando que se recebe. O aliado só apoio se receber um cargo. Aparece para a população que o grande feito é do governante, e quando dá problema, todo mundo joga para cima dele também — disse Romano. Para ele, falta em Dilma essa articulação e o carisma de Lula.

Roberto Romano percebe que a imagem de Joaquim Barbosa pode estar sendo associada a de um salvador moral da pátria, como aconteceu com Jânio Quadros e Fernando Collor, “que subiram com a promessa de moralidade e eficácia ética, mas duraram pouco”. Para Romano, essa experiência com Barbosa pode ser problemática por falta de sustentação política no congresso e nacionalmente.

Ademais, Mauro Paulino explica que a constante reprodução de notícias sobre as manifestações pelos meios de comunicação também foi responsável pelo desgaste do eleitorado em relação a presidente Dilma.

— Nós nos lembramos das Diretas Já e do impeachment de Collor. Nenhum desses casos de manifestações contundentes foram tão transmitidos pela televisão, pelo menos com tantos horas dedicadas. Isso ajudou a disseminar também o descontentamento em outros setores da sociedade, que foi retratado na pesquisa. Hoje, esse descontentamento está generalizado, por todas as camadas — declarou Paulino.

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