segunda-feira, 17 de outubro de 2011
Entre risos: apreciando o escárnio, a amargura, a inteligência fina, a gramática e o bom humor
Estou falando do livro A árvore de Isaias, de Fábio Campana, publicado em 2011 pela Travessa dos Editores.
Ao  abrir o livro deparo-me com uma dedicatória fantástica. Letra forte com  som. Ouvi-a. Passo para a página seguinte; mais uma emoção: uma frase  do Guimarães Rosa “Qualquer amor já é um pouquinho de saúde, um descanso  na loucura”. Assim fui lendo crônica por crônica. Quarenta delícias. A árvore de Isaias,  primeira crônica, demarca o território onde Fábio Campana abandonou a  esquerda comunista. Na Tirania, capital da Albânia. Pensei: putz, tinha  que ser lá! No paraíso do Enver Hoxa, onde professores universitários  eram presos por ler os gregos antigos.  Aristóteles, antimarxista! Seria cômico se não fosse trágico (desculpem-me o jargão!). 
Avanço  nas crônicas. A história da família. Andarilhos de fronteiras viajam e  fundem-se no mar de terra e água que compõem Argentina a Foz de Iguaçu. 
Mais adiante. Terceira crônica e morro de rir. Pequeno canalha,  o nome da crônica. Ah, não! Eu é que queria ter escrito esse texto. “O  pior canalha é o pequeno canalha. O anão moral”. Vou adiante. Mais uma  crônica de dar inveja, A peste middlebrow.  Campana inspirado em Virgínia Wolf, fala da indigência cultural dos  tipinhos middlebrow, “aquele que olha uma salsicha e pensa logo em  Picasso”. Ri. Ai, quanta gente pude visualizar!
A crônica Da arte de fazer inimigos e irritar as pessoas, foi  quase um identificação a primeira vista. Parece que a gente pensa a  mesma coisa das mesmas pessoas, os inimigos. Mas o avô do Campana era  mais contundente do que o meu. Diego Vera, o avô, dizia que o inimigo é o  sal da terra. Vou adiante. Passo por Almas parvas. Mês do cachorro louco (também  nasci no mês de agosto). Ando pelo livro. Observo as palavras. Perco-me  nas garçonnières. Vejo a decoração. A luz fraca. Acordo na crônica Sólida estupidez.  Leio: “os burros e os conservadores são assim feitos; quando não podem  dominar os fatos, conjuram os espíritos. É mais fácil”. Perfeito! 
Em O invisível professor Da Costa,  Campana chama a memória cruel do período em que bípedes emplumados  expulsaram os melhores professores da Universidade Federal do Paraná. O  Professor Newton Da Costa foi um deles. Foi acolhido pela USP, de São  Paulo e é hoje o maior lógico do planeta. Coisas trágicas são expostas  como a dissolução do mestrado em Psicologia da mesma Universidade por  uma súcia de adoecidos. 
Constato em Reflexões nativas  que o rastro da predação ambiental e intelectual do Paraná. Parece que  entendi a sensação de exílio desde 1986 quando vim morar nesse Norte do  estado. Campana trata essa sensação de exílio no Sul. Como? Eu pensava  que só nessa terra jovem, inculta e vermelha do Norte que a gente se  sentia só. Mas, não. Em Curitiba sofre-se também um certo exílio. “Que  encerre a longa carreira de uma elite laborfóbica, improdutiva e, por  isto mesmo prisioneira de seus piores vícios, a cobiça e a inveja que  habitam a alma do burocrata que um dia pensou ser príncipe”. Como, também em Curitiba? 
Terminei de ler e não queria sair do livro. Aprendi mais. Denso, tenso e intenso.
Livro esteticamente belo. Bem cuidado. Bem editorado. Ilustrações fantásticas. Gramática invejável. Da Travessa dos Editores. www.travessadoseditores.com.br