Fotos comprovam que morte de guerrilheiro foi omitida por 20 anos
'Estado' descobre imagens de Ruy Carlos Berbert em pasta do Arquivo Nacional
07 de julho de 2012 | 3h 03
Alana Rizzo e Leonencio Nossa, de O Estado de S. Paulo
BRASÍLIA - Imagens até agora inéditas do corpo do
guerrilheiro Ruy Carlos Vieira Berbert, desaparecido em janeiro de 1972,
aos 24 anos, revelam que, por duas décadas, três governos militares e
dois civis sabiam de sua morte numa cadeia de Natividade, hoje município
do interior do Tocantins, e nunca informaram o fato a seus parentes.
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Divulgação
Corpo de Ruy Berbert em cadeia de Natividade, no interior de Tocantins
Por meio da Lei de Acesso à Informação, que liberou documentos antes mantidos em sigilo, o Estado
localizou seis fotografias de Berbert morto. Uma pasta de imagens do
Arquivo Nacional mostra que o Centro de Informações do Exército,
principal órgão de repressão à luta armada, identificava o guerrilheiro
oficialmente e de forma correta já em janeiro de 1972.
Apesar da insistente procura dos parentes, os responsáveis pelos
serviços de informações dos governos dos generais Emílio Médici, Ernesto
Geisel e João Figueiredo, e os dos presidentes civis José Sarney e
Fernando Collor não informaram a existência das fotos nem confirmaram
sua morte.
A família conseguiu a primeira informação oficial só em 1992, ao ter
acesso a dados disponíveis a partir daquele ano pelo antigo Dops de São
Paulo. Os arquivos citavam a prisão de Berbert e a possibilidade de o
guerrilheiro ter se suicidado na cadeia. A suspeita, porém, é que ele
tenha sido assassinado pelo regime.
À época, os parentes tiveram de confrontar a informação do Dops com o
registro da morte de um certo "João Silvino Lopes" em Natividade, dado
divulgado em 1979 por um general da reserva.
Desaparecidos. Até hoje não se sabe onde estão os restos mortais de Berbert. Ele está na lista oficial que computa 475 mortos ou desaparecidos no período de governos militares no País (1964-1985).
As fotos de Berbert são as primeiras divulgadas, após a
redemocratização, de um guerrilheiro morto nas dependências de um órgão
do Estado.
De Jales, no interior paulista, Regina, única irmã de Berbert,
recebeu com serenidade a notícia da existência das imagens no Arquivo
Nacional. "Meu pai, também chamado Ruy, morto há 11 anos, sempre fez
questão de divulgar com orgulho a história dele."
O Estado enviou as fotografias para o marido de
Regina, Moacir Pereira. A família decidiu que não mostraria as imagens
para a mãe do guerrilheiro, Ottília, com 93 anos.
'Ironia da vida'. Berbert integrava o Movimento de Libertação Popular
(Molipo), que tinha 28 integrantes - a maioria dos quais foi dizimada
nos dias subsequentes à sua morte.