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Jornal da Unicamp
Baixar versão em PDF Campinas, 25 de junho de 2012 a 01 de julho de 2012 – ANO 2012 – Nº 531Síndrome de Down
Dissertações da Faculdade de Educação Física avaliam indicadoresde altura e de obesidade em crianças e jovens com o distúrbio genético
Um referencial para a
curva de crescimento
A
 investigação foi conduzida principalmente na cidade de São Paulo, com 
algumas investigações feitas também no interior paulista, em municípios 
como Campinas, Limeira, Valinhos, Vinhedo e Atibaia, mas, segundo a 
mestranda, ela serve como referência nacional, já que são raros os 
estudos no país para um padrão da síndrome de Down nessa faixa etária. 
“A perspectiva futura é fechar a curva de crescimento brasileira até 21 anos”, espera Fábia, “pois a única curva que temos é a de zero a oito anos, desenvolvida através de um estudo da USP. A nossa ideia era acrescentar dados novos.”
“A perspectiva futura é fechar a curva de crescimento brasileira até 21 anos”, espera Fábia, “pois a única curva que temos é a de zero a oito anos, desenvolvida através de um estudo da USP. A nossa ideia era acrescentar dados novos.”
Tais curvas
 de crescimento podem colaborar com pais, profissionais de saúde e 
gestores de políticas públicas, que tomarão conhecimento sobre os 
padrões do que constitui uma boa nutrição, saúde e desenvolvimento 
infantil. Sobrepeso, obesidade e condições associadas ao crescimento e à
 nutrição são, assim, detectadas e cuidadas precocemente.
Ao
 longo da pesquisa, orientada pelo docente da FEF José Irineu Gorla, a 
educadora física confirmou o que dizia o senso comum a respeito do 
crescimento das crianças com a síndrome de Down: que elas de fato têm 
uma estrutura menor. Quando o parâmetro foi o estudo de A. Myrelid, 
feito com crianças suecas em comparação a outras nacionalidades, a 
amostra de Fábia foi pareada com essas crianças em relação ao peso. 
Entretanto, a diferença foi marcante quando comparada a estatura. “Na 
Suécia, a estatura média para a síndrome de Down foi de 1,47 m e 1,61 m –
 oito centímetros a mais que a população brasileira”, conta a autora da 
dissertação.
Já, ao serem comparados 
com resultados de pesquisa de outros países como os Estados Unidos e o 
Japão, os achados da educadora física sugeriram que a sua investigação 
apresentava similaridades com os estudos de Y. Kuroki e de Christine 
Cronk – que empresta o nome à curva de crescimento usada como referência
 para essas populações.
Nesse caso, a
 média da estatura final das meninas, por exemplo, foi de 140 cm para a 
população japonesa e de 140,9 cm para a população brasileira, ao passo 
que, em relação ao sexo masculino, a amostra brasileira apresentou 
valores superiores: 150,5 cm contra 145 cm da amostra japonesa.
Na
 comparação com os resultados da população americana, a amostra 
brasileira apresentou valores ligeiramente superiores, sendo de 2 cm 
para os meninos e para as meninas valores um pouco mais elevados, de 
aproximadamente 4 cm.
Desafios
Ficou
 muito claro para a mestranda que a abordagem desse público-alvo deve 
ser meticulosa, pela complexidade que encerra. Isso envolveu visitas a 
muitas instituições que hoje atuam com crianças deficientes. Somente de 
Apaes, ela esteve em cerca de 30 dessas instituições, sem falar de 
várias escolas da rede municipal e das particulares.
Nessas
 escolas, a mestranda apresentava o seu projeto e, após a devida 
autorização, começava a coletar dados como estatura, peso e medidas de 
prega cutânea, chegando ao IMC, para verificar se os avaliados estavam 
dentro do esperado, abaixo, com sobrepeso ou com obesidade.
Enfrentou
 muitas dificuldades para a obtenção dos dados, mesmo afirmando que o 
seu trabalho não era invasivo. Uma delas foi a falta de respaldo das 
instituições. “Quando se pronuncia a palavra ‘pesquisa’, isso ainda 
assusta muito”, expõe Fábia. “E minha tarefa consistia somente em fazer 
medições. Mesmo assim, em algumas, nem conseguimos ganhar acesso às suas
 instalações para realizar o estudo.”
Outra
 dificuldade envolveu a abordagem da família que, conforme apurou a 
mestranda, em geral já vem cansada de tantas pesquisas e do pouco 
retorno. “Há carência de informações, e os familiares têm que lidar por 
si com a deficiência. Daí aparece mais uma pessoa tentando reunir dados 
para um levantamento e nem sempre é bem-aceita”, lamenta.
Esses
 dados seriam basicamente alimentação, atividade física e doenças. “É 
preciso saber se as crianças têm deficiência de zinco e doença congênita
 do coração, fatores que influenciam em seu crescimento, como também 
diabetes associado que, junto com hipertensão e obesidade, constitui a 
síndrome metabólica”, assinala Fábia. 
Avanços
Quando
 a pesquisadora pensou nesse estudo, informa o professor Gorla, a ideia 
era fortalecer uma lacuna dentro da educação física adaptada chamada 
“Crescimento e desenvolvimento”, a qual dispõe de pouca literatura de 
quanto essas crianças brasileiras têm dentro dos percentuais de 
estatura, peso, massa corporal e percentual de gordura.
“Ao
 ingressar no mestrado, ela estudou essa proposta mais a fundo, pois as 
tabelas disponíveis são internacionais e não servem de parâmetros para a
 realidade da nossa população. Então buscamos ver um percentual de 
gordura ideal, de peso e de estatura para termos a noção da realidade 
dessas crianças”, relata o orientador. Essa conquista, realça, também 
poderá contribuir para as ciências médicas do país, uma vez que esses 
dados podem ajudar nas escalas de desenvolvimento dessas crianças.
 A
 área de atividade motora adaptada da Unicamp hoje é bastante destacada 
no país. Tem uma história de 20 anos e surgiu com o Departamento de 
Estudos de Atividade Motora Adaptada, idealizado por um grupo de 
professores, entre eles Edison Duarte, Paulo Araújo e José Júlio Gavião 
de Almeida.
Ao criarem esse 
Departamento, o intuito era ter um grupo estudando a atividade física 
para pessoas com deficiência. O trabalho se fortaleceu, formando um 
contingente de mestres e doutores. O próprio Gorla fez o mestrado e o 
doutorado ali.
Fábia acentua que a 
Unicamp é um celeiro da atividade física adaptada e de estudos com 
deficiências. “Aqui no Brasil é uma das principais instituições a 
contemplar todas as áreas de deficiências dentro de um campus 
universitário. Temos os esportes paraolímpicos como o rúgbi, a esgrima e
 a bocha, e os esportes adaptados como o handebol em cadeira de rodas, 
além do trabalho com atividades motoras para crianças com síndrome de 
Down.”
A relevância do seu estudo foi
 ter colaborado com a curva de crescimento. “É algo muito difícil de 
conseguir com uma pesquisa de corte transversal, que tem mais latente a 
questão temporal, isso porque se observa uma falta de retornos das 
fontes entrevistadas”, dimensiona a autora. Por essa razão, teve que 
limitar o seu trabalho mais à Capital, depois de tê-lo iniciado também 
no interior paulista. No doutorado, buscará uma amostra nacional.
“O
 nosso foco é ter informações para trabalhar com elas em direção a um 
peso ideal, que isso resulte em padrões saudáveis, que eles tenham uma 
melhor qualidade de vida. É também atuar na prevenção”, salienta Gorla. 
“Daqui a alguns anos já encontraremos profissionais com mais informações
 para trabalhar com essas crianças em academias e em clínicas de 
reabilitação.”
Fábia mostrou ser 
possível trabalhar com equações de percentual de gordura, com prevenção e
 com atividade física específica para que essas crianças melhorem a sua 
qualidade de vida.
Outra
 coisa: “é importante que o pai não olhe seu filho com medo ou com pena.
 Os profissionais, afinal, conhecem os problemas que afligem as pessoas 
com a síndrome de Down”, conclui o orientador.
Uma
 forma que ela e Gorla encontraram de tornar públicos os resultados foi 
escrevendo um livro, que em breve será publicado. O título provisório é 
Síndrome de Down: Crescimento, Maturação e Atividade Física. A obra 
ainda reúne outros trabalhos do grupo de pesquisa em Avaliação Motora 
Adaptada (Gepama) da FEF.
■ Publicação
Dissertação: “Crescimento da pessoa com síndrome de Down: contribuição para a construção de um referencial”
Autora: Fábia Freire da Silva
Orientador: José Irineu Gorla
Unidade: Faculdade de Educação Física (FEF)
Autora: Fábia Freire da Silva
Orientador: José Irineu Gorla
Unidade: Faculdade de Educação Física (FEF)
Estudo caracteriza forma
e composição do corpo
O
 pesquisador considera que os estudos sobre a prevalência da obesidade, 
da distribuição da gordura corporal e da forma física corporal 
(somatotipo) em indivíduos com SD são de extrema importância como fontes
 de informações relevantes para a prevenção de doenças associadas ao 
maior acúmulo de gordura corporal. Além de contribuírem para compreensão
 dos fatores que predispõem esse público ao maior acúmulo de gordura em 
comparação à população sem a síndrome, as pesquisas oferecem subsídios 
para programas de atividades físicas adaptadas, destinadas a pessoas com
 essa deficiência, e a todos os profissionais que os atendem, como 
educadores físicos, terapeutas ocupacionais, médicos, fisioterapeutas, 
nutricionistas, entre outros.
Bertapelli
 explica que o biotipo corresponde ao formato do corpo e está 
relacionado à composição do corpo humano. Com base nesse conceito, a 
análise do corpo físico pode ser realizada através de um método 
denominado somatotipo (soma, corpo), desenvolvido com o objetivo de 
fornecer um sistema tridimensional do corpo humano por meio de recursos 
fotoscópicos e antropométricos. Em outras palavras, o somatotipo é um 
método quantitativo que permite a caracterização conjunta da forma e da 
composição do corpo humano em três grupos: endomorfo, mesomorfo e 
ectomorfo. No endomorfo estão os indivíduos com predomínio da gordura 
corporal; no mesoformo, aqueles em que prevalece a massa muscular; e no 
ectomorfo, os sujeitos identificados pela linearidade relativa do corpo,
 ou seja, caracterizados pela "magreza".
Normalmente,
 as pessoas apresentam uma somatória de cada uma dessas características e
 o predomínio de uma delas é que determina a inserção em um dos grupos. 
Na população com SD há escassez de estudos em relação aos componentes 
somatotipológicos entre meninos e meninas. Esta lacuna levou o autor a 
analisar o somatotipo em crianças e adolescentes com a síndrome no 
município de Campinas, com a finalidade de fornecer subsídios para a 
compreensão dos componentes envolvidos no processo de crescimento físico
 dessa população. A técnica do somatotipo envolve 13 medidas 
antropométricas, incluindo peso, estatura, diâmetros biepicondilar do 
fêmur e úmero, perímetros da perna medial e braço, dobras cutâneas 
tricipital, bicipital, subescapular, suprailíaca, abdominal, coxa e 
perna.
Com base na 
literatura consultada, o autor se deparou como primeira indagação: por 
que ocorre a prevalência da obesidade nas pessoas com SD? Procurou as 
possíveis causas que estariam relacionadas a fatores genéticos, 
fisiológicos e ambientais. Levantou então alguns fatores que podem ser 
relacionados à SD e que contribuem para a obesidade. Entre eles, 
menciona a alteração do hormônio leptina e insulina, micronutriente 
zinco e taxa metabólica basal.
As
 pessoas com a síndrome têm aumentados os índices de leptina, 
responsável pelo controle do apetite, o que as leva a comer mais. Da 
resistência à insulina resulta maior acúmulo de gordura e diabetes. A 
deficiência de zinco dificulta o crescimento e, em consequência, a menor
 estatura determina maior propensão ao acúmulo de gordura. Como a 
maioria nasce com alterações cardiovasculares, as suas atividades 
físicas tendem a ser mais restritas. Em geral nascem também com falta de
 massa muscular e, em decorrência, apresentam taxa metabólica basal 
baixa, ou seja, gasto energético menor do que uma pessoa normal em 
repouso, o que leva ao automático acúmulo de gordura. A maioria 
apresenta hipotireoidismo, que contribui também para o seu aumento.
Na
 pesquisa, realizada com 50 crianças (6 a 12 anos) e adolescentes (13 a 
19 anos) – faixas etárias consagradas em estudos realizados sobre o 
comportamento da gordura corporal em jovens – junto à Apae de Campinas, 
Bertapelli se propôs a verificar qual a diferença entre meninos e 
meninas (crianças) e moças e rapazes (adolescentes); entre crianças e 
adolescentes; e entre sexos nos dois grupos. Um dado, não presente na 
literatura, particularmente despertou a atenção do pesquisador: a 
maioria dos meninos não apresentou obesidade. Pelo contrário, neles os 
resultados indicaram valores normais de gordura corporal, enquanto 
meninas, moças e rapazes, conforme esperado, apresentaram grau alarmante
 de obesidade. As razões dessa diferença nos meninos não constituiu 
objeto do seu estudo e precisam ser investigadas. Em relação ao 
somatotipo, os resultados foram coerentes aos de prevalência de 
obesidade: os meninos apresentaram predomínio da massa muscular 
(mesomorfos) e os demais grupos caracterizaram-se pelo excesso de 
gordura (endomorfos).
Em
 decorrência da revisão bibliográfica e dos dados colhidos junto ao 
universo pesquisado, o autor conclui que as pessoas com SD precisam de 
atividades físicas, mas reconhece que essa inserção não é fácil, porque 
existe carência de programas específicos para essa população. Ele 
destaca o papel da família, que embora em geral preocupada com os 
aspectos clínicos, muitas vezes não está conscientizada da existência de
 programas de esportes que, embora poucos, podem ser frequentados pelas 
pessoas com SD. Por sua vez, a reeducação alimentar pode ser facilitada 
através da intervenção de nutricionistas que levem a mudanças de hábitos
 alimentares não só da criança e do adolescente como da família, que em 
geral desconhece também que as pessoas com a síndrome tendem a comer 
mais, às vezes em decorrência do aumento do índice de leptina presente 
no organismo.
Ao 
considerar as razões que o moveram ao trabalho, Fabio Bertapelli 
manifesta a preocupação com a contribuição social, cada vez mais 
presente em jovens pesquisadores: "Com a pesquisa, pretendo 
principalmente contribuir para a sociedade que é carente de informação, 
preocupado simultaneamente em divulgar os resultados conseguidos de 
forma compreensível a não especialistas. Espero contribuir ainda para a 
evolução social e para o desenvolvimento científico do país com 
publicações de temas correlatos e ainda não devidamente esclarecidos."
No
 trabalho, o educador físico se propôs mais especificamente a avaliar a 
prevalência da obesidade na criança e no adolescente com SD e verificar 
que fatores levam à obesidade nessa população e ainda analisar alguns 
instrumentos utilizados na determinação da gordura corporal, como as 
técnicas do somatotipo e da composição corporal. Em decorrência do 
estudo, ele propõe relacionar essas variáveis ao crescimento, ao nível 
de atividade física, ao desempenho motor, aspectos ainda pouco 
estudados. 
■ Publicação
Disssertação: “Composição corporal e somatotipo em pessoas com síndrome de Down”
Autor: Fabio Bertapelli
Orientador: José Irineu Gorla
Unidade: Faculdade de Educação Física (FEF)
Autor: Fabio Bertapelli
Orientador: José Irineu Gorla
Unidade: Faculdade de Educação Física (FEF)