"Eleição em São Paulo vive a hora da xepa", diz Roberto Romano
Janaina GarciaDo UOL, em São Paulo
 O acordo selado entre o PP de Paulo Maluf e o PT do ex-presidente Luiz 
Inácio Lula da Silva e seu pupilo, Fernando Haddad, representa uma 
espécie de “xepa” que tem marcado não apenas a política eleitoral em São
 Paulo, como no restante do país.
 A avaliação é do professor de ética e política da Unicamp (Universidade
 Estadual de Campinas) Roberto Romano, que comparou o cenário eleitoral 
em São Paulo ao “vale-tudo” de fim de feira, nesta quinta-feira (20), em
 entrevista ao UOL. Ontem, o PT perdeu a deputada 
federal Luiza Erundina (PSB) na chapa encabeçada por Haddad à prefeitura
 paulistana. A parlamentar se insurgiu à aliança entre os petistas e 
Maluf, seu adversário histórico.
A polêmica foto de Lula com Maluf
Foto 7 de 14 - 18.jun.2012
 - O ex-prefeito Paulo Maluf cumprimenta o ex-presidente Luiz Inácio 
Lula da Silva e o candidato do PT à Prefeitura de São Paulo, Fernando 
Haddad, durante encontro na casa do líder do PP no qual sua legenda 
anunciou o apoio à candidatura petista Mais Adriana Spaca/Brazil Photo Press
 “Estamos no momento da xepa no qual se vende um programa de partido, 
uma ideologia ou um conjunto de propostas em troca de 1min35s de 
campanha”, disse Romano. O tempo é o que a propaganda eleitoral do PT na
 TV receberá a mais por ter o PP na coligação.
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Os partidos como "negocistas"
 Para Romano, o acordo do PT com o PP na pré-campanha paulistana ilustra
 um processo de “corrosão do Estado” e de “perda dos conteúdos 
programáticos” que atinge outros países, desde o fim da União Soviética,
 e no qual partidos de direita e de esquerda passam a agir como meros 
negocistas em busca do poder.
 “É um momento em que não se está mais preocupado com o conteúdo 
programático do partido, mas se vai ou não ganhar as eleições para 
chegar aos postos e se servir aos próprios propósitos. Aí, quando se 
chega ao poder, retribui-se se o apoio --mas é algo muito arriscado, 
pois o resultado não é garantido”, disse.
 O estudioso afirma que a situação reflete “uma espécie de 
flexibilização ideológica e ética”. “Nesse modelo figuram os negociantes
 dos partidos. Para eles, dentro dessa grande feira política, tudo que 
lhes possibilite ganhar a eleição pode ser aceito --é a figura dos 
‘bossistas’ [de “boss”, "chefe", em inglês], ou dos compradores e 
vendedores de eleições”.
A fotografia da discórdia e a “briga” comprada por Lula
 Romano falou também sobre a consternação de Erundina com a foto que 
simbolizou a união de Maluf com os petistas --na qual aparecem o 
ex-prefeito, o ex-presidente e Haddad, na casa do pepista, pouco antes 
da feijoada que selaria o acordo. Para ele, a reação de Erundina reflete
 a de uma militância que, em certa medida, acabou confrontada pelo 
próprio Lula.
 “É uma foto que confere simultaneidade a personagens distantes, e esse 
contraste choca. E o Lula tem uma espécie de complexo de Maquiavel, que é
 o de achar que pode fazer coisas não boas, como impor sua própria 
vontade, mas rapidamente, achando que em pouco tempo as pessoas vão 
esquecer”, declarou Romano.
 “E a imagem tem um elemento nuclear na civilização ocidental; ela 
desenvolve outros sentidos. Só que a maior fonte de poder do PT ainda é a
 militância, apesar de o [marqueteiro do PT] João Santana ser um grande 
manipulador de imagens”, observou.
 É com a militância e com eleitores simpáticos à esquerda, por sinal, 
que os efeitos de uma aliança como essa mais deveriam preocupar, aponta 
Romano.
 “Essa militância fica perplexa, paralisada, podem nem sair às ruas em 
campanha. Imagine ver todas as suas certezas indo por terra ao se 
defrontar aliado com tudo o que você sempre combateu, ou a burguesia 
nacional da qual Maluf faz parte e representa. Aí se cria uma divisão 
entre até na burguesia, entre as que apoiam o Maluf e as que podem 
começar a ver o PT como opção”, afirmou.
 Mas o estudioso faz um alerta: “O vale-tudo político tem limites, se 
esgota”. “Porque, em situações de crise, as pessoas podem, por medo, 
optar pela via autoritária porque esta tem um lado definido. É esse medo
 quando se vê quando não se pode ter confiança em instituições e 
programas que leva as pessoas a quererem um poder forte”, disse.