Organismos aquáticos
 são usados na detecção de
 contaminação por corantes
Pesquisadores da FT avaliam compostosdespejados por indústrias em rios e córregos
A
 linha de pesquisa, que conta com financiamento da Fundação de Amparo à 
Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), foi implantada há três anos, 
com a chegada da docente à Unicamp. “Eu trabalhei durante 22 anos na 
Cetesb [Companhia Ambiental do Estado de São Paulo]. Quando ainda estava
 lá, nós já identificávamos a presença de corantes em mananciais, mas 
até aquele momento ainda não havíamos associado esses compostos a 
efeitos adversos à biota. Somente após minha vinda para a Universidade, 
foi que pude dar prosseguimento às pesquisas iniciadas no pós-doutorado 
realizado nos Estados Unidos”, relata a professora Gisela.
De
 acordo com ela, os testes ecotoxicológicos realizados no laboratório 
têm demonstrado que alguns corantes são bastante tóxicos, pois causam 
efeitos deletérios, ainda que em pequenas concentrações. “Cerca de 100 
microgramas de corante por litro de água já são suficientes para 
provocar, por exemplo, a morte de organismos como a pulga d’água, um 
microcrustáceo, e inibir o crescimento de algas de água doce, ambos de 
elevada importância dentro da cadeia trófica”, afirma a pesquisadora. 
Até aqui, o manancial mais trabalhado pela equipe do LEAL foi o Ribeirão
 dos Cristais, situado em Cajamar, cidade da Região Metropolitana de São
 Paulo.
Naquele local, conforme a 
professora Gisela, o problema relativo à saúde humana foi resolvido. 
“Assim que nós detectamos o lançamento de efluentes contaminados por 
corantes no manancial, a indústria foi notificada. Agora, a empresa de 
saneamento coleta os efluentes e os lança depois da estação de 
tratamento de água. Foi uma medida paliativa, visto que a questão ainda 
não está totalmente resolvida, pois o impacto ao ambiente persiste. Nós 
continuamos coletando amostras de água do ribeirão e observamos que os 
corantes seguem presentes”, diz. Recentemente, prossegue a pesquisadora,
 o mesmo trabalho foi iniciado na região de Americana, onde existe uma 
grande concentração de indústrias têxteis. “Estamos coletando amostras 
do Ribeirão Quilombo e do Rio Piracicaba. Preliminarmente, já 
constatamos a presença de corantes em alguns pontos. O próximo passo 
será identificá-los e quantificá-los”.
Além
 de formar recursos humanos qualificados, o grande objetivo do LEAL, 
conforme a sua coordenadora, é, a partir das avaliações de riscos, 
estabelecer valores seguros que possam preservar a biota e, 
consequentemente, a saúde da população. “Nós queremos dizer para a 
sociedade o seguinte: tais concentrações são aceitáveis, pois não 
representam risco para o ambiente ou o homem. Com isso, nossas 
autoridades também terão elementos para criar regulamentações que 
permitam estabelecer maior controle em torno desses contaminantes 
emergentes”, detalha a professora Gisela. Essa questão é importante, de 
acordo com ela, pois não é possível ao Brasil tomar por base leis de 
países desenvolvidos para adaptá-las à nossa realidade.
A
 pesquisadora destaca que o problema da contaminação da água por 
corantes ocorre principalmente em nações emergentes como Brasil, Índia e
 China, onde os tecidos são tingidos. “Os países ricos compram o tecido 
pronto. É aqui, onde a produção está concentrada, que parte das 
substâncias utilizadas para dar cor às roupas vai para os rios e 
córregos. Estou falando da indústria têxtil, por causa do grande volume 
de água utilizado pelo setor na fase de produção. Entretanto, outros 
segmentos, como o alimentício e o de cosmético, também fazem uso de 
corantes”, pontua a coordenadora do LEAL. A professora Gisela assinala 
que todo esse trabalho não seria possível sem a colaboração de outras 
instituições, como a Universidade Estadual Paulista (Unesp-Araraquara e 
Botucatu) e a Universidade de São Paulo (USP). “Além disso, temos 
mantido parcerias com universidades do exterior, para onde enviamos 
nossos alunos para que ampliem a sua experiência e adquiram novos 
conhecimentos”, completa a coordenadora do LEAL.
Na
 opinião da pesquisadora, o melhor modo de enfrentar o problema da 
contaminação da água por corantes é agir no processo de tratamento de 
efluentes das indústrias. Os sistemas utilizados atualmente, segundo a 
professora Gisela, não foram desenhados para remover esses compostos. 
Normalmente, o que se faz é filtrar e/ou tratar os efluentes 
biologicamente e finalmente adicionar cloro para então lançá-los nos 
mananciais. “Isso não é suficiente. Ainda que, em alguns casos, a 
cloração faça com que a cor desapareça parcialmente da água, os 
contaminantes persistem. Ademais, tal procedimento pode gerar outros 
tipos de compostos ainda mais tóxicos do que os presentes originalmente 
nos efluentes”, alerta.
Justamente 
por causa dessa deficiência no tratamento dos efluentes, destaca a 
pesquisadora, é que o projeto desenvolvido pela sua equipe contempla 
também estudos sobre diferentes formas de remoção de contaminantes da 
água empregada no processo de produção industrial. “Estamos avaliando 
vários tratamentos, inclusive os oxidativos avançados, realizados por 
pesquisadores da Unesp de Araraquara. Nosso objetivo é verificar, 
através de ensaios, se a qualidade da água é pior com ou sem a cor. 
Vamos seguir nesse trabalho até que consigamos reduzir tanto a cor, 
quanto a toxicidade e a mutagenicidade. Em outras palavras, queremos 
chegar a um tratamento que seja eficaz. Dessa forma, estaremos 
contribuindo para proteger o ambiente e, consequentemente, a população”,
 reforça a docente da FT.
Mais 
recentemente, continua a professora Gisela, o LEAL introduziu na linha 
de pesquisa alguns organismos marinhos. A intenção dos pesquisadores é 
utilizá-los para avaliar a qualidade da água do mar e de estuários. A 
decisão decorre do fato de a costa brasileira ter uma importância muito 
grande em termos econômicos e sociais. “Esse trabalho, porém, é mais 
difícil de ser feito. É que os organismos marinhos vivem em um meio que 
contém sal, substância que interfere nas análises químicas e na 
solubilidade dos corantes. Trata-se de um grande desafio, que 
pretendemos superar com a qualificação da nossa equipe. Vários de nossos
 pós-graduandos estão realizando estágios em outras instituições, tanto 
dentro quando fora do Brasil, para que possamos aprender mais sobre 
estudos nessa área”.
Qualidade
Paralelamente
 a todo esse trabalho, o LEAL também está se preparando para adotar um 
sistema de qualidade que lhe permita receber um certificado de 
acreditação de acordo com a norma ISO/IEC17025. Ao atingir essa 
condição, o laboratório poderá prover dados inclusive para instituições 
estrangeiras interessadas em contratar testes ecotoxicológicos. “Na 
Europa, existe uma demanda grande por análises com organismos 
aquáticos”, informa a professora Gisela. Ademais, diz a pesquisadora, 
pesquisas realizadas a partir de ensaios feitos em laboratório 
acreditado ganham em credibilidade. “Nesse caso, os procedimentos 
dificultam condutas inadequadas ou fraudes, pois o controle é muito 
grande. Vale observar, porém, que o objetivo desse controle não é inibir
 a criatividade ou a iniciativa do pesquisador. Tudo pode ser feito, até
 protocolos podem ser mudados, desde obviamente que cada passo seja 
registrado”.
Tão importante quanto 
tornar o LEAL um laboratório acreditado, no entender da professora 
Gisela, é formar recursos humanos dentro de uma cultura de qualidade. 
“Penso que já alcançamos 40% do processo. Já criamos o arcabouço: 
providenciamos boa parte da documentação necessária e estabelecemos 
regras. O que nos falta, ainda, é implementar a garantia da qualidade, 
que vem por meio, por exemplo, da calibração de equipamentos e 
utilização de materiais de referência. Nesse esforço, estamos tendo 
completo apoio por parte da alta administração da Faculdade. 
Posteriormente, nossa intenção é levar essa experiência para os demais 
laboratórios da FT. Trata-se de um projeto audacioso, mas que pode ser 
plenamente alcançado. Para atingir essa meta, vamos precisar da 
colaboração da Universidade, visto que são processos que exigem 
investimentos significativos”, considera.
■ Publicações
OLIVEIRA, R. L. ; ANDERSON, M. A. ; UMBUZEIRO, G. A. ; ZOCOLO, G. J. ; ZANONI, M. V. B. .
 Assessment of By-Products Of Chlorination And Photoelectrocatalytic 
Chlorination Of An Azo Dye. Journal of Hazardous Materials, v. 205, p. 
1-9, 2012.
FERRAZ, E. R. A. ; UMBUZEIRO, G. A. ; DE-ALMEIDA, G. ; CALOTO-OLIVEIRA, A. ; CHEQUER, F. M. D. ; ZANONI, M. V. B. ; DORTA, D. J. ; OLIVEIRA, D. P. Differential toxicity of Disperse Red 1 and Disperse Red 13 in the Ames test, HepG2 cytotoxicity assay, and Daphnia acute toxicity test. Environmental Toxicology, v. 26(5), p.489-497, 2011.
CARNEIRO, PATRICIA A. ; UMBUZEIRO, GISELA A. ; OLIVEIRA, DANIELLE P. ; ZANONI, MARIA VALNICE B. . Assessment of water contamination caused by a mutagenic textile effluent/dyehouse effluent bearing disperse dyes. Journal of Hazardous Materials , v. 174, p. 694-699, 2010.
CARNEIRO, PATRÍCIA A. ; OLIVEIRA, DANIELLE P. ; UMBUZEIRO, G.A. ; ZANONI, MARIA VALNICE BOLDRIN. Mutagenic activity removal of selected disperse dye by photoeletrocatalytic treatment. Journal of Applied Electrochemistry v. 40, p. 485-492, 2010.
CLAXTON, LARRY D. ; UMBUZEIRO, GISELA DE A. ; DEMARINI, DAVID M. The Salmonella Mutagenicity Assay: The Stethoscope of Genetic Toxicology for the 21st Century. Environmental Health Perspectives, v. 118, p. 1515-1522, 2010.
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