Quarta-feira, 21 de Setembro de 2011
As fraudes em trabalhos académicos estão na rua - 1
As fraudes em trabalhos académicos saíram definitivamente dos gabinetes e corredores das escolas e universidade para os jornais, televisões, blogues, rádios. Estão na rua.
Não era assim até há bem pouco tempo: os plagiadores faziam do seu acto grande segredo e creio que a consciência de alguns ganharia peso com o passar do tempo. Quem sabia por ter escutado qualquer coisa em surdina à mesa do bar, olhava-os como pecadores para o resto da vida. Mesmo que ganhassem graus académicos perdiam em reputação. Alguns eram afastados discretamente, com um “convite” para desistirem das provas ou para deixarem lugar vago. A poucos se fazia passar a vergonha da divulgação pública. Nos casos que conheci, vi aliada a punição à complacência.
Porém, de um momento para o outro tudo mudou, e apenas falo da minha experiência na universidade, naquela a que pertenço e noutras que visito: passo pelos corredores e ouço um estudante dizer, muito naturalmente, qualquer coisa do género, “manda-me o trabalho que apresentaste em… para eu apresentar amanhã em…”; leio a parte de uma tese que se me afigura familiar e percebo que fui eu que a escrevi; passo os olhos por um ensaio e o que vejo é uma manta de retalhos sem qualquer sentido, com umas partes em português de Portugal e outras em português do Brasil, porque o seu “autor” nem se deu ao trabalho de o tratar e uniformizar;
E isto em licenciaturas, mestrados e… doutoramentos. Falo de jovens, mas também de pessoas na meia idade; falo de quem nunca desempenhou nenhum cargo, mas também de quem desempenha cargos que implicam responsabilidade e honestidade.
Quando confronto os estudantes, sempre com evidências na mão, por mais diversos que sejam, duma coisa posso ter a certeza: porão um ar desentendido e terão dois tipos de reacção. Uma reacção é uma quase não reacção, do tipo “sim, e depois!?”, reconhecem, portanto, mas não vêem onde está o problema; outra reacção é mais reacção e pode traduzir-se na negarão, ou na afirmação repetida de não perceberem onde quero chegar, ou que não tiveram qualquer intenção de usar obra alheia, ou de nunca lhes terem explicado como se pode usar essa obra… ou, ainda, tudo isto.
Mais grave do que as reacções dos estudantes são as circunstâncias que têm permitido a sua expansão e consolidação. Parece que foi preciso que a comunicação social desse atenção continuada às fraudes para que se começasse a estudar o assunto nas universidade. Mas daqui a fazerem algo substancial para as reduzir pode falar pouco ou pode faltar muito tempo. Convinha que não faltasse muito porque é o prestígio dos graus académicos, já tão ameçados por outros factores, que está em causa.