sábado, 31 de dezembro de 2011

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Entrevista de Roberto Romano à CBN São Paulo, para Petrea Chaves (Revista CBN) 31/12/2011

'Combate à corrupção continua no próximo ano'
Entrevista com Roberto Romano, professor de ética da Unicamp
CBN | Última atualização: 5 horas e 3 minutos atrás






sábado, 31/12/2011
Clique aqui : 


'Combate à corrupção continua no próximo ano'
cbn



Para deixar no passado, o que é passado...xô passado!

Absolvição de Roberto Romano, em instância superior, no processo contra ele movido por Moniz Bandeira.

Escrevi, para a revista Primeira Leitura, uma resenha do livro intitulado Formação do Império Americano: Da  Guerra Contra a Espanha à Guerra ao Iraque. O autor me processou e fui condenado na primeira instância. E absolvido plenamente por magistrados superiores. Segue o texto do Acórdão, que mostra prudência e saber jurídico dos desembargadores. Os sites , portais e blogues que me injuriaram e caluniaram devido à condenação em primeira instância, estão gentilmente convidados a pedir desculpas, segundo os preceitos da civilizade, que serão aceitas conforme também ordena a civilidade. Segue a íntegra do Acórdão.
Boa leitura.

Prof. Roberto Romano da Silva (Unicamp).

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TRIBUNAL DE JUSTIÇA
PODER JUDICIÁRIO
São Paulo


Registro: 2011.0000196087

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos do Apelação nº 921655429.2007.8.26.0000,
da Comarca de São Paulo, em que são apelantes PRIMEIRA LEITURA LTDA, JOSE REINALDO AZEVEDO E SILVA, ROBERTO ROMANO DA SILVA e LUIZ ALBERTO DIAS LIMA DE VIANNA MONIZ BANDEIRA sendo apelados LUIZ ALBERTO DIAS LIMA DE VIANNA MONIZ BANDEIRA e PRIMEIRA LEITURA LTDA.

ACORDAM, em 4ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Deram provimento ao recurso principal para julgar improcedente a ação, invertido o ônus da sucumbência, prejudicado o adesivo.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. DesembargadoresFÁBIO QUADROS (Presidente), NATAN ZELINSCHI DE ARRUDA E ENIO ZULIANI.

São Paulo, 15 de setembro de 2011

FÁBIO QUADROS

RELATOR


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TRIBUNAL DE JUSTIÇA
PODER JUDICIÁRIO
São Paulo


Voto nº 13.439/TJ - 4ª Câmara de Direito Privado

Apelação Cível nº 9216554-29.2007.8.26.0000

Comarca de São Paulo
Apelantes: Primeira Leitura Ltda. e outros
Apelada: Luiz Alberto Dias Lima de Vianna Moniz Bandeira

Danos morais Lei de imprensa Resenha crítica -Embate de filósofos em que um dos requeridos, se
utilizando da revista ré, voltada à economia e ao pensamento político, editou artigo criticando o autor do livro intitulado “Formação do Império Americano: Da Guerra Contra a Espanha à Guerra ao Iraque” Procedência parcial Apelação dos réus pretendendo reformar o julgado ou reduzir o quantum fixado

Decadência afastada, uma vez que a norma pertinente não foi recepcionada pela CF/88 Recurso principal conhecido e provido para julgar improcedente ação, invertido o ônus da sucumbência, prejudicado o adesivo.

Trata-se de recurso de apelação (fls. 783/784, 785/805), interposto pelos requeridos PRIMEIRA LEITURA LTDA., ROBERTO ROMANO DA SILVA e JOSÉ REINALDO AZEVEDO E SILVA, contra r. sentença (fls. 771/780), que nos autos da ação indenizatória por danos morais proposta por LUIZ ANTONIO ALBERTO DIAS LIMA DE VIANNA MONIZ BANDEIRA, em face dos ora apelantes, julgou parcialmente procedente para condená-los solidariamente ao pagamento de valor equivalente a 50 salários



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mínimos, à época da liquidação, assim como nas custas e despesas processuais, além da verba honorária.

Inconformados, apelam, alegando equívoco na manifestação judicial, dizendo que para concretização do dano, mister que a crítica seja de forma incisiva, esta, contudo é voltada para o texto literário, referindo expressões empregadas na resenha, sendo utilizadas apenas em relação ao autor empírico e não ao apelado requerente. Em extensos relatos sobre os fatos, acenam os apelantes com a exceção da verdade, indicando posicionamentos do autor da obra que foi objeto da crítica, referindo manifestações da resenha e tecendo comentários elucidativos, buscando com isto explicar a motivação da manifestação crítica, outrossim, descaracterizar supostas ofensas ao
postulante, mencionando que os comentários acerca de Hegel e a expressão a ele dirigida como “charlatão”, tem o fito de explicar o posicionamento do autor na composição da obra, objeto da crítica. Aduzem que tinham o dever moral de expressar opinião sobre aquela, de acordo com a liberdade de expressão garantida na Carta Política, aliás, como fizeram outros críticos e que, entretanto, não foram indicados à responsabilização pelo apelado. Finalizam referindo que o
valor fixado à indenização é excessivo. Querem a inversão do julgado, alternativamente, reduzir o montante fixado. Buscando ampliação do quantum fixado, apresentou recurso adesivo o autor (fls. 879/880, 881/901), ressaltando a responsabilidade dos requeridos pelo dano moral, dizendo que eles agiram intencionalmente e com propósito deliberado em atingi-lo, baseado nas várias manifestações injuriosas, difamatórias e caluniosas da resenha. Sugere a majoração do valor fixado.



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Contrarrazões (fls. 815/874 e 913/925).

Este é o relatório.

Preliminarmente, afasta-se a alegada deserção, uma vez que a tese relacionada à admissibilidade do recurso levantada nas contrarrazões, com base no parágrafo 6º, do art. 57, da Lei de Imprensa, não encontrou eco ante a nova ordem constitucional (cf. JTJ 258/341, Rel. Des. Cezar Peluso; 255/321, Rel. Des. Cezar Peluso; JTJ 241/168, Rel. Des. Ivan Sartori; JTJ 220/226, Rel. Des. Fonseca Tavares).

Tem-se que referida norma teve por fim inibir interposição de recursos protelatórios, com o fito de acelerar a execução após o julgamento do recurso, de modo a compensar rapidamente o dano moral que se procurou reparar, todavia, o Colendo Superior Tribunal de Justiça acabou pacificando entendimento no sentido da desnecessidade do referido depósito como condição de recorribilidade.

Nesse sentido os julgados da citada Corte:
“Afastadas as condicionantes para indenização tarifada prevista na Lei de Imprensa, não é de ser exigido o depósito do valor integral da condenação para o efeito da admissibilidade da apelação. Recurso especial conhecido e provido (STJ - REsp 241774 Min. CESAR ASFOR ROCHA - 26/11/2002)”.

“STJ - Dano moral. Lei de Imprensa.
Apelação. Depósito prévio. Precedentes da Corte.

1. Já decidiu a Corte, em diversas oportunidades, que o depósito prévio, previsto na Lei de Imprensa para o recebimento da apelação, era compatível com o regime da


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indenização tarifada. Admitindo-se indenização que ultrapasse esse valor impõe-se considerar inaplicável a exigência.

2. Recurso especial conhecido e provido.
(STJ - REsp 168667 Min. CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO -
T3 - 06/04/1999)” “in” Jurid PREMIUM, 51ª ed.

Também neste Egrégio Sodalício o mesmo posicionamento, consoante julgado: "LEI DE IMPRENSA - INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL - RECURSO - APELAÇÃO - PREPARO -DEPÓSITO DO VALOR DA CONDENAÇÃO - DESNECESSIDADE - Pagamento efetuado com base no valor original da causa. Deserção não-ocorrente. Provimento ao agravo. Não incidência do artigo 57, parágrafo sexto, da Lei nº 5.250/67. Na ordem constitucional vigente, não é exigível, como requisito de admissibilidade da apelação, o depósito previsto no artigo 57, parágrafo sexto, da Lei de Imprensa, bastando, nesse ponto, o preparo comum." (TJSP - 2ª Câmara de Direito Privado - AI 208.918-4/0-00 - Rel. Des. Cezar Peluso - j. 19.02.2002).

Assim, afasta-se a preliminar levantada nas contrarrazões, tomando-se conhecimento do recurso principal.

Quanto ao mais, consta dos autos que o recorrente, Roberto Romano, Professor de Ética e Filosofia da Unicamp, convidado pela revista “Primeira Leitura” a ler e comentar obra do autor, que integra lista de leitura obrigatória dos candidatos do curso do Instituto Rio Branco, após o que elaborou artigo, comentando posições do autor, ostentadas no intitulado livro: “Formação do Império Americano: Da Guerra Contra a Espanha à Guerra no Iraque”, que segundo o recorrido foram além dos limites da crítica.



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Examinada a questão em primeiro grau, restaram os requeridos solidariamente condenados a pagar ao autor indenização por dano moral no equivalente a 50 (cinqüenta) salários mínimos, além de ônus da sucumbência.

Tem-se, entretanto, que a manifestação judicial laborada, “data vênia”, não se houve com acerto.

É que não constitui difamação ou injúria e conseqüente dano moral o exercício da liberdade de manifestação do pensamento e de informação, a opinião desfavorável da crítica literária,
artística, científica ou desportiva, salvo quando inequívoca a intenção de injuriar ou difamar.

O exercício natural da crítica é mero ato de manifestação, consistente num direito constitucional do cidadão, nada dizendo com o abuso no direito da liberdade de manifestação, no caso de opinião.

Também não há dizer que a “suposta complacência do autor para com a ideologia pregada por Hitler na Alemanha Nazista” tenha constituído ofensa capaz de gerar o pretenso dano moral, por se cuidar de mera referência crítica ao conteúdo da obra sob análise.

Outrossim, nem mesmo a incisiva utilização de pujantes expressões referidas no contexto da crítica, pode dar ensejo aos delitos de injúria ou difamação e conseqüente dano moral indenizável, ainda que as palavras se afigurem com idoneidade ofensiva, quando não vislumbrado o inequívoco propósito, vale dizer, doloso, de atingir a pessoa.

As críticas elaboradas pelo recorrente,


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apenas expõe posições do livro do autor e as circunstanciais qualificações atribuídas, às vezes preconceituosas em relação ao recorrido, ou alinhando-as a personagens de condutas hostilizadas e de
pouca simpatia, diz apenas com a obra analisada e respectivo posicionamento de seu autor. Os adjetivos mais severos, tal como “ignorância pura”, “charlatão” e “tosco”, e a atribuição de ser o autor “indulgente com Hitler” e outros termos assemelhados, ainda que pareçam gravosos, são utilizados apenas com intuito de situar o autor à sua obra e a ela tecer críticas, elucidando o posicionamento dele ao expressar suas idéias, contudo, repita-se, sem o condão de atacá-lo.

É certo que o recorrente acena com adjetivações em relação ao recorrido, referindo severas críticas à sua obra, fazendo comentários à visão político-social do autor, a seu ver equivocada, o qual tece duras críticas ao posicionamento político americano e diz sê-lo indulgente em relação a Hitler, fazendo ainda alusão depreciativa em razão do tipo de formação acadêmica por conta do direcionamento da obra em foco aos aspirantes a embaixadores, do Instituto Rio Branco, contudo e ainda assim, a análise crítica do recorrente é apenas no sentido de expor, como já consignado alhures, posicionamento do autor, circunstância que não induz dano moral.

As expressões utilizadas e indicadas como ofensivas, não o são; é que foram utilizadas no contexto da
análise crítica ou no mérito desta, nem mesmo quando empresta o autor da resenha adjetivos, vinculando, não o autor, mas seu posicionamento a outros personagens históricos, que ante o comportamento deixaram negativas marcas.

Assim, conquanto tenha sido incisiva a



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crítica tecida à obra do autor, com adjetivações, não há evidências de haver configuração dos delitos de injúria e difamação, notadamente por não haver inequívoca intenção dirigida nesse sentido.

Aliás, firme é a jurisprudência a respeito, conforme v. acórdão: “São inconfundíveis o direito de crítica e a intenção de injuriar ou difamar através da crítica. Não se discute, e nem se poderia fazê-lo, que muitas vezes a opinião de um crítico pode ser boa, má, errada e mesmo estúpida, favorável ou desfavorável. Tais circunstâncias não caracterizam, porém, os delitos de injúria e difamação previstos na Lei de Imprensa. Ali se pune, como dispõe o art. 27, I, a inequívoca intenção de injuriar ou difamar. Somente quando a intenção for no sentido inegável, indiscutível, ou induvidosamente
denegridor, é que se configuram os delito em referência” (LEI DE IMPRENSA INTERPRETADA PELOS TRIBUNAIS Acórdãos inseridos - 2ª ed. Ed. Juarez de Oliveira S. Paulo 2005, p. 19).

Ora, se nesse universo de direito de manifestação é permitido noticiar, comentar e criticar, resumida ou amplamente atos ou projetos dos Poderes estatais, desde que não se cuide de matéria de natureza reservada ou sigilosa, não se poderia excluir a crítica a obras literárias, como é o caso, ainda que se mostre um tanto exasperada, como sugere o autor, sendo importante lembrar que o debate de idéias a respeito, apenas enriquece a opinião pública.

Promover a exposição das idéias é fundamental à sociedade no estado de direito e democrático,
entendendo-se que o Estado tem o preponderante dever social de estimular o debate de idéias, não inibir, a não ser que se verifique o abuso, valendo lembrar que há farta jurisprudência relacionada a casos


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assemelhados, em que não restou configurado o dano:

“Não comete ato ilícito a empresa jornalística que se limita a publicar matéria narrando as acusações
feitas pelo Promotor de Justiça, visto que com isso cumpre apenas a ré o seu dever de informar a verdade do fato jornalístico” (STJ 3ª T. REsp 299.846 Rel. Carlos Menezes Direito j. 25.09.2001 DJU
04.02.2002 e RT 802/178).

“Não caracteriza abuso da liberdade de imprensa, mas exercício legítimo do direito de crítica, inofensiva a outros membros do destacamento, a exibição de programa humorístico
de televisão, em que, sob a forma e os exageros artísticos da sátira, se faz reprimenda severa a crimes graves praticados por policiais militares no exercício de sua função duvidosos” (TJSP 2ª Câmara de
Direito Privado Ap. 117.411-4/9-00).

Assim é que a atuação do autor da resenha não se desviou do seu mister, estando, pois, de acordo com a livre manifestação de opinião, nos limites da legalidade, sem que seja constatado algum abuso, eis que não se verifica tenha sido a crítica direcionada ao recorrido, antes ao texto literário, sem intenção de ataque, portanto.

Impende referir que as expressões dirigidas ao recorrido no contexto crítico, têm apenas intenção de
melhor situar ou ressaltar a crítica e ainda que mais incisiva seja, ou que no exercício desta tenha sido ele adjetivado, não há como inferir houvesse intenção do recorrente injuriar ou difamar o recorrido.

A manifestação da crítica literária, repita-se, tem sustentação no consagrado direito constitucional de



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manifestação de pensamento, sendo que a opinião manifestada à obra do autor e o fato de a este serem atribuídas algumas comparações ou alusões, tal como “... a suposta complacência do autor para com a ideologia pregada por Hitler na Alemanha Nazista, deixando assentado que ele havia citado Hitler com indulgência na obra...”, não representa transpasse aos limites da razoabilidade, nem ainda com tais adjetivações, porquanto o faz no afã de elaborar a crítica.

A alegação de que fora ofendido pelo autor da resenha, na medida em que emite conclusões a seu respeito, a seu ver equivocadas, inclusive quando faz alusões e outros personagens da história, deixa evidente que o recorrido não se dá bem com a crítica e inadmite conclusões outras que não estejam situadas ao seu ponto de vista, notadamente quando se mostrem incisivas, valendo dizer que a
análise literária por outros profissionais da mesma área que tenham visão político-social diversa da sua, podem ser vista quase como proibitiva, ou inadmissíveis, consoante se pode verificar.

Ora, o fato da manifestação crítica, na elaboração analítica da obra fazer alusões a outros personagens da história, ainda que se tratem de figuras humanas hostilizadas ou indesejáveis ante o comportamento manifestado perante a sociedade da época, não significa tenha maculado a honra do recorrido, uma vez que se cuida de mera manifestação tocante à liberdade de expressão, notadamente com vínculo no mister do crítico, o que evidencia ação desvinculada do intuito de ataque.

Não é possível ignorar que os cronistas dos mais diversos periódicos, com certa freqüência emitem suas opiniões em suas colunas jornalísticas, muitas vezes com críticas



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ferrenhas e severas em relação a determinadas obras literárias, ou ideais que entendem controvertidas, até com adjetivações a seus autores, e nem por isso constitui tal circunstância agravo à pessoa, valendo ressaltar que tal comportamento deve ser visto como salutar e apropriado ao aperfeiçoamento do debate das idéias.

Nota-se do embate processual, evidente conflito de idéias entre os litigantes, notadamente de posições sóciopolítico internacional, evidenciado pelo fato de que o recorrente critica postura do autor, que desenvolve na obra um paralelo entre a política adotada pelo Estados Unidos e a outra adotada pela Alemanha Nazista.

Portanto, o que está em pauta no debate telado é apenas o conflito de idéias, antes de ataques pessoais com fins difamatórios ou injuriantes.

Resta, pois, demonstrado, a toda evidência, que o intuito do recorrente está voltado tão só à crítica da
obra literária do autor e, ainda que nesse mister tenha ele elevado o tom da crítica, pelo calor e paixão de seu ofício, mesmo que adjetivando o autor com as expressões referidas, consideradas as circunstâncias informadas no processo e levando em conta a consagrada liberdade de manifestação de pensamento esculpida na Carta Política, tem-se que não é caso de ser reconhecida pretensão indenizatória ao caso.

Importa nesse sentido assentar que eventual abuso, desde que não ultrapassados limites constitucionais e infraconstitucionais inerentes à manifestação de expressão no mister de
criticar, deve ser aquele mitigado, valendo aqui transcrever a lição doutrinária de Freitas Nobre, referindo que: “desde que seja o interesse público a predominar na crítica, no seu objetivo, desaparece o abuso




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da informação, para prevalecer os altos interesses da sociedade que deve e que necessita ser bem informada” (COMENTÁRIOS À LEI DE IMPRENSA 3ª ed., Saraiva P. 126).

Irrelevante, ademais, o fato de haver sido a resenha veiculada perante grande público, e nem poderia ser diferente, já que se trata de interessante obra direcionada a um importante universo acadêmico e específicos leitores, de sorte que, inimaginável seria que obra desse quilate e com tal importância não fosse submetida à exposição pública e nem sofresse crítica de cronistas e importantes analistas.

Destarte e nas circunstâncias verificadas, toma-se conhecimento do recurso principal, dando-se-lhe provimento para julgar improcedente a ação, invertendo-se as disposições sucumbenciais, prejudicado o adesivo.

Ante o exposto, toma-se conhecimento do
recurso principal, prejudicado o adesivo.

FÁBIO QUADROS
Relator

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Segue o texto da resenha (RR)


A FORMIGA QUE MARCHAVA CONTRA O IMPÉRIO.
UMA FÁBULA HEGELIANA.

Francis Bacon distinguia entre formas lucíferas e frutíferas de pesquisa. As primeiras, por atingir paragens elevadas do intelecto, levam à ciência. As segundas perdem importância na hora do consumo. Paolo Rossi (1) recorda as imagens usadas pelo suposto empirista para descrever os vários tipos de intelecto. Em primeiro, acadêmicos formiga: recortam dados indefinidamente sem processá-los no pensamento. Depois chegam os aranha que tecem silogismos sem base efetiva no mundo. Como descartaram os dados, eles vivem suspensos em sistemas filosóficos. Finalmente, com base em Platão e poetas como Horácio, vem o pesquisador abelha que recolhe o néctar das flores (os dados), o elabora e entrega um belo e alimentício produto, o mel.

Os “sábios” europeus e seus herdeiros desprezam a filosofia anglo-saxã. Esquecem a lição de I. Kant, cuja honestidade proclama que sem Hume o sono dogmático dominaria a sua mente. Não por acaso Bacon é citado na Critica da Razão Pura: “calamos sobre nós mesmos, falamos sobre as coisas”. Hegel é um charlatão a mais a espalhar preconceito contra a cultura inglesa. O mesmo Hegel, no seu doutoramento, errou uma citação essencial de Newton (2) mas disse sem pudor algum : “Newton é pensador tão bárbaro no plano conceitual que, à semelhança de outro inglês, se espantou ao descobrir que falava em prosa. Quando imaginava manipular coisas físicas, Newton não tinha consciência de usar conceitos”(3).

Luiz Alberto Moniz Bandeira se proclama hegeliano. Dados os elementos acima, acredito. Ele afirma ser preciso “penetrar no âmago dos acontecimentos, conhecer a causa e a essência dos fenômenos, o que é real e racional por trás da aparência”. O jargão escolástico foi dado. Vejamos as conseqüências. Bandeira segue a lógica do mestre, aplicando-a sem cautelas ao mundo histórico. Aliás, trata-se de um estranho hegelianismo que amontoa fatos empíricos e teses a priori, sem que os dois elementos se unam. Em muitas páginas o autor mimetiza a formiga baconiana e acumula dados, mas não os pensa. Ao mesmo tempo, insiste em esquemas paranóides que anunciam uma indemonstrada “ditadura mundial do capital financeiro”. E a salada empírico-transcendental vem recheada de “denúncias” que, sem exagero, atribuem ao governo norte-americano plena cumplicidade com o ataque de 11/setembro. Essas histórias fantásticas recordam invenções como o Protocolo dos Sábios de Sião. Mas vamos por partes. O livro começa errando e termina do mesmo jeito. Nele se fala em “fundamentalismo” dos founding fathers americanos. Ignorância pura. Se tivesse lido uma linha dos ditos senhores, Bandeira saberia que eles estudavam teologia em bases tão rigorosas quanto as obedecidas pelos teóricos europeus. A filosofia, a teologia, a retórica, a lógica de Petrus Ramus, a panóplia conceitual sofisticada movida por eles, tudo somado a um saber científico e literário de fazer inveja à Sorbonne, mostram que de “fundamentalistas” eles nada possuem (4). Caso oposto, inexistiriam as universidades norte-americanas produtoras de amplos saberes científicos, técnicos, humanísticos. Mas não se espera sutileza teológica de alguém que escreve ser Jesus apologista do “não pagamento de tributo ao César”. Erro feio demais para ser apenas erro(5). O autor, para fundamentar sua “tese” sobre o terror (6), apela com singeleza a certo Cristo inscrito na guerrilha e …no terror “libertário”. Assim fala o hegeliano: se os dados históricos e textuais negam a lógica assumida, danem-se eles.

ANTIAMERICANISMO
Bandeira assume o mais vulgar antiamericanismo, e cita oráculos franceses que descrevem os EUA como “esse povo do qual todas as forças vivas são dirigidas pelo excesso no crescimento indefinido dos bens materiais” (Joseph Patouillet, 1904). Se é para catar preconceitos, porque não descer à base do etnocentrismo europeu defendido por De Pauw ? Este, nas Pesquisas sobre os Americanos (7), afirma serem podres o povo e a terra daquele continente. Mas a lógica hegeliana é conhecida por seus truques. Bandeira, bom hegeliano, transforma “a parte” num todo. Ele cita Aron, para quem os norte-americanos possuem “uma parte da responsabilidade no desencadeamento da guerra dupla no Atlântico e no Pacífico”. Daí, o autor passa ao “notável” Gore Vidal (retórica das seitas: os “nossos” são notáveis, os “outros” recebem adjetivos impublicáveis) : “hoje, ninguém nega com seriedade que Roosevelt queria a guerra dos EUA contra Hitler”. Para mim, se Hitler declarasse guerra ao inferno, eu também me aliaria ao diabo. Mas para Bandeira, não. A beligerância contra Hitler é crime. Ele cita Hitler com indulgência, num discurso contra “a ilimitada ditadura mundial norte-americana”(8). Encontra-se aí uma perigosa coincidência entre a tese central do livro em pauta e o discurso totalitário: os EUA querem impor uma ditadura sem limites ao mundo.

Hitler é citado pelo autor como personagem neutro. Semelhante técnica de citação chega a ser escandalosa. Veja-se a seguinte seqüência: “Hitler considerou um ´trágico encadeamento´(eine tragische Verkettung), um ´infeliz acaso histórico´(ein unglücklicher geschichtlicher Zufal) o fato de que sua ascensão ao poder na Alemanha ocorreu quando ´o candidato do mundo judaico´(der Kandidat des Weltjudentums), Roosevelt, assumiu o governo da Casa Branca”. No juízo do hegeliano só está errado nesta série de frases o fato de que “Hitler se precipitou”, nada mais. Ao expor a fabricação de armas, Hitler é novamente citado num discurso como alguém que só denuncia os instrumentos letais nas mãos norte-americanas. Em passagem rápida a “política” nazista é referida com as suas “enormes atrocidades”. Mas logo o autor tira a lição silogística: se Hitler dizimou o povo russo, este “logicamente” apoiou Stalin e a sua tirania.

Num texto que defende a tese de uma ditadura mundial maquinada pelos EUA e onde o leitor é forçado a topar com certo Hitler estadista sóbrio, é no mínimo bizarro que o autor cale quase tudo o que se relaciona com o tema jurídico da ditadura, os debates sobre o artigo 48 da Constituição de Weimar (9). O dilema do autor, com tal silêncio, é claro: se os EUA têm uma Constituição democrática, neles não haveria a legalidade da qual se beneficiou Hitler. Se os EUA seguem para uma ditadura nos moldes do artigo 48 (existem pessoas que pensam desse modo), então aprenderam com a Alemanha. E seria preciso, para denunciar o imperialismo yankee, descer ao parentesco com a “civilizada” Alemanha.

Quando se fala em “império” e “ditadura mundial”, tais asserções entram na polissemia lingüistica, elas não brotam de “fatos” a exemplo de Minerva da cabeça jupiteriana. É preciso interpretar documentos e dados com óptica plural. Em pontos delicados assim, o preceito da justiça é imperativo: quem julga tem o dever de ouvir a outra parte. Não se encontra um norte-americano defensor de sua terra e gente, nas oitocentas páginas do calhamaço. Fico no caso mais notório, pois trata-se de um filósofo especialista em estratégica militar. Trata-se de Victor Davis Hanson(10). Além dos que dizem cobras e lagartos dos EUA, ralas são as referências aos seus defensores idôneos. Todo país possui valores negativos e positivos. Mas o autor afirma trabalhar sine ira et studio e que não faz reflexão ética, só expõe uma cadeia de fatos. É preciso dizer que, entre os fatos a serem levados em conta pela razão científica, em se tratando de política e não de matemática ou física (e mesmo aí Hegel errou…), a boa lógica exige o exame dos arrazoados trazidos pelos que defendem o campo “inimigo”.

Outros equívocos, agora de leitura filosófica, surgem ao longo do livro. Todo estudante de primeiro ano conhece a passagem da Fenomenologia do Espírito sobre “o Reino animal do Espírito”. Baseando-se numa leitura não provável de Marx, Bandeira reduz o significado daquele trecho, jogando-o totalmente sobre a sociedade de mercado e para a concorrência. Hegel era tosco, mas nem tanto. A seqüência inteira é dirigida aos intelectuais, parte essencial das Luzes. Para quem analisa a ditadura mundial estadunidense talvez o erro seja pequeno. Mas para um hegeliano…

Em suma: em tedioso agenciamento de números, documentos e discursos, como diligente intelectual formiga, o autor exibe sua riqueza, a qual constrasta com a miséria de uma ideologia raivosa que não hesita em repetir slogans anti-semitas ao discorrer sobre o Partido Democrático, além de outras repetições de enunciados totalitários cujo lugar deveria ser debaixo do rio chamado Esquecimento. Bandeira se proclama hegeliano e nele acredito. Ele também diz só levar em conta “os fatos, como cientista”, abandonando todo esforço axiológico. Assim, os “fatos” terroristas são coletados como se fossem apenas… fatos. Mas eles expressam juízos de valor e definem uma prática covarde de intimidação, ao jogar sociedades inteiras na morte aninhada nos ventres fanáticos. Sim, Bandeira é hegeliano e diz levar em conta os fatos. “Mas quem aprendeu antes a curvar as costas e inclinar a cabeça diante da ´potência da história´, acaba acenando mecanicamente, à chinesa, seu ´sim´a toda potência, seja esta um governo ou uma opinião pública ou maioria numérica, e movimenta seus membros no ritmo preciso com o qual alguma ´potência´puxa os fios. Se todo sucedido contém em si uma necessidade ´racional´, se todo acontecimento é o triunfo do lógico ou da ´Idéia´ —então, depressa, todos de joelhos e percorrei ajoelhados toda a escada dos ´sucedidos´! Como, não heveria mais mitologias reinantes? Como, as religiões estariam à morte? Vede apenas o religião da potência histórica, prestai atenção nos padres da mitologia das Idéias e em seus joelhos esfolados” (Considerações Extemporâneas). Nietzsche falava, nestas frases, dos hegelianos. Enquanto eles, agora, apresentam a imagem mais horrenda dos EUA, “inclinam a cabeça à chinesa”, literalmente. Na cena mundial, depois do nazismo e da URSS, sobraram os EUA, a UE e a China. Não aposto um centavo para saber em qual país Bandeira enxerga razões para solapar o Estado norte-americano. Não gosto de inclinar a espinha diante da História, mesmo ainda contada no padrão idealista.

NOTAS
1) "Ants, Spiders and Epistemologists", in Francis Bacon, Seminario Internazionale, ed. Marta Fattori, Roma, 1984.
2) “Quando Hegel cita a definição quinta dos Principia de Newton como uma definição da força centrífuga, seu erro tem graves consequências pois invalida quase toda a crítica de Newton feita por ele; o mais incômodo é que ninguém notou o erro no ato e Hegel repetiu publicamente o mesmo erro (por exemplo na Encliclopédia das Ciências Filosóficas, § 266) até o fim da vida”. De Gandt, F: “Introdução” à edição da tese De orbitis planetarum (Paris, Vrin, 1979), p. 47.
3) Leitor amigo: se deseja rir mais, abra as Lições sobre a História da Filosofia no item “Newton”. Cito na edição seguinte: Werke in zwanzig Bänden (FAM, Suhrkamp, 1975), III, p. 231. Hegel inicia o método Chaui de leitura científica.
4) Da imensa bibliografia, cito apenas Miller, Perry: The Americans Puritans, their prose and poetry. (NY, Doubleday, 1956) e The New England Mind. The Seventeenth Century (Boston, Beacon, 1968).
5) Pergunta: Licet censum dare Caesari, an non?. Resposta: Reddite ergo quae sunt Caesaris, Caesari: et quae sunt Dei, Deo. (Mateus, 22, 17-21).
6) A benção ao terror repete-se, como cantilena, em muitas passagens : “…quando as grandes potências desprezam a força do Direito e impõem o direito da força, os povos mais fracos, oprimidos, são levados a recorrer ao terrorismo, como ferramenta de luta, no processo de insurgência”, “no curso da história, o terrorismo serviu como a arma dos mais fracos, com o objetivo de quebrar o monopólio da violência exercida pelo Estado e, no mais das vezes, identificou-se com a insurgência, o método da guerrilha”, e outras jóias de mesmo quilate.
7) C. De Pauw, Recherches philosophiques sur les Américains, 1774. O texto pode ser lido na edição eletrônica Gallica da Biblioteca Nacional da França.
8) O termo germânico é preciso: “…unbegrenzte Weltherrschaftsdiktatur”. Discurso de Hitler em 11/12/1941.
9)"Caso a segurança e a ordem públicas forem seriamente (erheblich) perturbadas ou feridas no Reich alemão, o presidente do Reich deve tomar as medidas necessárias para restabelecer a segurança e a ordem públicas, com ajuda se necessário das forças armadas. Para este fim ele deve total ou parcialmente suspender os direitos fundamentais (Grundrechte) definidos nos artigos 114, 115, 117, 118, 123, 124, and 153."
10) Cf. Carnage and Culture (Anchor/Vintage, 2002), tradução com o título de Porque o Ocidente Venceu. Massacre e cultura- da Grécia antiga ao Vietnã (RJ, Ediouro, 2001). O autor publicou muitos outros livros e artigos sobre a Grécia antiga e a Guerra, incluindo a questão da democracia. Dentre os mais importantes, listo os seguintes: Warfare and Agriculture in Classical Greece (Ed. University of California Press, 1998); The Western Way of War (University of California Press, 2000); Hoplites: The Ancient Greek Battle Experience (Routledge, 1992); The Other Greeks: The Family Farm and the Agrarian Roots of Western Civilization (Ed. University of California Press, 2000); Fields without Dreams: Defending the Agrarian Idea (Ed. Touchstone, 1997); The Land Was Everything: Letters from an American Farmer (Free Press, 2000); The Wars of the Ancient Greeks (Cassell, 2001); The Soul of Battle ( Anchor/ Vintage, 2000); An Autumn of War (Anchor/Vintage, 2002); e Mexifornia: A State of Becoming (Encounter, 2003).




E Kubrick...ano novo, festa, luzes, shining...

The Shining

Kubrick...

Kubrick...



E Kubrick...


The_dawn_of_man_2001_a_space_odyssey-400-400

Neste fim de ano e começo do mistério (caos, harmonia ?), nada mais certo do que rever Kubrick....

E para confirmar o profeta Roque Sponholz...


Gramado de R$ 500 mil do Castelão, em Fortaleza, virou jardim de prédio público
Gramado de R$ 500 mil do Castelão, em Fortaleza, virou jardim de prédio público
31/12/2011 - 06h01

Desperdício de dinheiro público em 2011 com preparação para Copa chega a R$ 776 milhões

Vinícius Segalla
Em São Paulo



O desperdício de dinheiro público com os preparativos do Brasil para a Copa do Mundo de 2014 alcançou a cifra mínima de R$ 776 milhões em 2011. Esta é a soma do que foi gasto em oito episódios protagonizados pelos governos federal, estaduais e municipais em que foram consumidos recursos em obras que não saíram do papel, compras mal sucedidas, eventos privados pagos com dinheiro público e convênios irregulares com ONGs.
O Estado de Mato Grosso lidera a lista dos pouco atentos com os cofres estatais. Em uma só obra, uma linha de VLT (Veículo Leve sobre Trilhos), o dinheiro mal empenhado foi de R$ 700 milhões. É que a obra de mobilidade urbana original planejada para Cuiabá, uma das sedes da Copa, eram dois corredores exclusivos de ônibus (BRT - Bus Rapid Transit).
Era este o empreendimento planejado pelo Estado e previsto na Matriz de Responsabilidades da Copa, assinada em janeiro de 2010 pelo Ministério do Esporte e Estados e cidades-sedes do Mundial de 2014.
A escolha do modal aconteceu após a encomenda de estudos técnicos e teve a aprovação unânime de especialistas em transporte público de três universidades (USP, UFRJ e UFMT). Os políticos de Mato Grosso, porém, manobraram para que o projeto fosse substituído pela linha de VLT, elevando os custos para R$ 1,2 bilhão, R$ 700 milhões a mais do que o projeto original.
Em outro episódio no mesmo Estado, em novembro, o governo cancelou o contrato da obra de um teleférico na Chapada dos Guimarães, no valor de R$ 6 milhões, que estava sendo construído dentro do planejamento do Estado para a Copa do Mundo de 2014 (e com os recursos destinados a este fim) como equipamento que fomentaria o turismo na região. O equipamento seria construído a 67 quilômetros da capital Cuiabá, sede da Copa.
O contrato assinado em 2009 com a empresa Zucchetto Máquinas e Equipamentos Industriais, que construiria o teleférico, não sobreviveu a uma auditoria interna do Poder Executivo de Mato Grosso. A empresa, porém, já havia recebido R$ 600 mil do governo matogressense, e não irá devolvê-los aos cofres públicos. À Procuradoria Geral do Estado do Mato Grosso, cabe ingressar na Justiça para reaver os recursos.
Fialmente, ainda no pantanal, em novembro, um imbróglio envolvendo uma compra frustrada por parte do governo de Mato Grosso de dez veículos Land Rover equipados com radares móveis fez com que os cofres públicos do Estado sofressem um prejuízo de R$ 2,2 milhões.
Os carros, comprados junto a uma empresa brasileira que representa uma fábrica russa, tinham um custo total de R$ 14 milhões, e foram adquiridos pela Secopa-MT (Secretaria Especial da Copa). A justificativa era que eles seriam utilizados no patrulhamento da fronteira matogrossense com a Bolívia para reforçar a segurança brasileira durante o Mundial de futebol, em 2014. O negócio foi fechado em julho deste ano. Cada veículo sairia por R$ 1,4 milhão.
A aquisição, porém, de acordo com o TCE-MT (Tribunal de Contas do Estado de Mato Grosso) e com o Ministério Público do Estado, foi feita com uma série de irregularidades, a começar por uma compra sem licitação injustificável, feita junto a uma empresa "constituída às pressas" e "sem nenhuma experiência comprovada", conforme descreve o relatório do TCE-MT sobre o caso.

Obras para a Copa de 2014

Foto 1 de 217 - Em imagem de 20 de dezembro de 2011, suportes para as arquibancadas começam a ser montados no Itaquerão Robson Ventura/Folhapress
Assim, no dia 4 de novembro, o governo de Mato Grosso resolveu cancelar a compra, e os veículos nem chegaram ao Brasil. O problema, porém, é que a Secopa-MT já havia feito o pagamento de R$ 2,2 milhões antes de receber as Land Rovers, a título de "cheque caução". Quando o negócio foi desfeito, a empresa não quis devolver o dinheiro, e os cofres públicos de Mato Grosso amargam o prejuízo.
Já no Rio de Janeiro, em julho, a Geo Eventos, empresa de eventos das Organizações Globo e do Grupo RBS, recebeu R$ 30 milhões do governo estadual e da prefeitura do Rio de Janeiro para organizar o sorteio preliminar das eliminatórias da Copa do Mundo de 2014.
A empresa foi contratada em regime de exclusividade pelo Comitê Organizador Local (COL) da Copa do Mundo de 2014 para produzir a cerimônia. Quando foi ao mercado à caça de patrocinadores para bancar a festa, encontrou apenas dois: a prefeitura do Rio e o governo estadual. Cada um assinou um contrato de patrocínio no valor de R$ 15 milhões.
Ou seja, a Fifa, que era a dona da festa, não investiu qualquer quantia no evento, que foi feito pela Globo e pago integralmente com recursos públicos.
Também em julho, em Fortaleza (CE), o gramado do estádio do Castelão, que está sendo reformado para a Copa, virou jardim de prédios públicos e relvado de campo de "pelada" de soldados da Polícia Militar. O gramado havia sido adquirido pelo Estado em dezembro de 2009, a um custo de R$ 500 mil.

R$ 600 MIL PELO RALO

  • Arte/UOL A ideia de construir um teleférico na Chapada dos Guimarães acabou em nada, a não ser um prejuízo de R$ 600 mil ao contribuinte de Mato Grosso. LEIA MAIS
O governador de Mato Grosso, Silval Barbosa (esq), junto com o secretário da Secopa, Éder Moraes, foI até a Rússia em julho conhecer as Land Rovers. Gostaram, mas não consultaram o Ministério da Defesa para efetuar a compra. LEIA MAIS
À época, as autoridades públicas justificaram o investimento com argumento de que tratava-se de um tipo de gramado com alta maciez e que requer manutenção apenas a cada dez anos. Não durou nem dois anos.
Em setembro, foi a vez de Minas Gerais e Belo Horizonte abrirem os bolsos públicos. Estado e prefeitura uniram forças para patrocinar uma festa comemorativa para os mil dias que faltavam para a Copa, no dia 15 daquele mês.
O povo mineiro bancou a festa, orçada em R$ 650 mil, que contou com jantar de gala para cartolas da Fifa e políticos do Brasil, apresentações musicais e contratação de agências de marketing e empresa de segurança.
Por fim, o governo federal deixou seu quinhão de desperdício, avaliado em mais de R$ 42 milhões, através de convênios com associações que foram reprovados por órgãos de fiscalização e projetos que não produziram resultado algum, além de prejuízo.
Em setembro, o programa do Ministério do Turismo "Bem Receber Copa", que visava elaborar treinamentos e cursos para recepcionar os milhares de turistas no Mundial através de convênios com entidades privadas, foi suspenso por ser alvo de investigações que indicavam desvio de recursos públicos.
A Polícia Federal acredita que houve desvio de dois terços dos R$ 4,4 milhões destinados pelo Ministério ao Instituto Brasileiro de Desenvolvimento de Infraestrutura Sustentável (Ibrasi).
No mesmo mês, quatro funcionários do Ministério do Esporte foram pegos pelos auditores do  Tribunal de Contas da União por descumprirem a lei de licitações 8666/93. Os auditores do TCU pediram que os funcionários fossem multados por terem autorizado pagamentos a quatro empresas do Consórcio Copa 2014 sem ordens de serviço e, pior, sem relatório detalhado do trabalho realizado.

Avanços e falhas na preparação das cidades-sedes

Foto 12 de 12 - São Paulo Arte UOL
Os funcionários também autorizaram pagamentos de despesas não previstas no edital, como passagens aéreas dos consultores contratados, computadores, hotéis. A exceção custou R$ 700 mil. O Consórcio Copa 2014 foi contratado em licitação de julho de 2009 para dar “suporte de gerenciamento ao Ministério do Esporte”.
O caso foi agravado porque, após auditoria do TCU, o Ministério do Esporte decidiu aumentar o valor do contrato de prestação de serviços em quase 80%. Como se não bastasse, as empresas felizardas renovaram o contrato até julho de 2013.
O custo do serviço foi orçado em R$ 13,1 milhões em 2009 e em 2011, graças a aditivos, o preço saltou para R$ 24 milhões. No total, as empresas vão ganhar cerca de R$ 40 milhões, se não houver mais aumentos, e ninguém explicou ainda quais são efetivamente os serviços prestados nem por que o valor final ficou tão acima do previsto inicialmente.
Como sempre, Roque deu o tom...

Para os amigos, Marta Bellini, Roque Sponholz, Alvaro Caputo, Paulo Araújo, e todos os amigos, Deus esteja com vocês em 2012 !

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Índice geral São Paulo, sábado, 31 de dezembro de 2011Ilustrada
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Entrevistas 2011/2012 Christopher Hitchens (1949-2011), Jornalista
Meu inimigo é o absoluto, aquele que quer o controle da sua mente
Em sua última entrevista, Hitchens debate com Richard Dawkins temas que ocuparam sua trajetória, como a relação entre igreja e estado, o ensino da religião e os riscos do totalitarismo Da “New statesman”
Como estudioso de George Orwell, você deve ter uma visão particular da Coreia do Norte, de Josef Stálin e da União Soviética e se irritar com o refrão constante: "Stálin foi um ateu".
Não sabemos se foi. Hitler, com certeza, não foi. De qualquer modo, o ateísmo não supõe nenhuma espécie particular de posição política.
As pessoas que fizeram o trabalho sujo de Hitler foram quase todas religiosas.
Lamento dizer que a relação da SS com a Igreja Católica é algo que a igreja ainda precisa enfrentar.
Se você está escrevendo sobre a história dos anos 1930 e a ascensão do totalitarismo, pode, se quiser, tirar a palavra "fascista" em relação à Itália, Portugal, Espanha, Tchecoslováquia e Áustria e substituí-la por "partido católico de extrema direita".
Quase todos os regimes foram instalados com a ajuda do Vaticano. Isso não é negado. Em muitos casos os entendimentos com a Santa Sé persistiram após o fim da Segunda Guerra e se estenderam a regimes comparáveis na Argentina e outros países.
Mas houve sacerdotes que fizeram coisas boas.
Não muitos, ou saberíamos seus nomes. Do mesmo modo como os nazistas pensavam ser uma raça separada, queriam sua religião própria.
Eles desencavaram os deuses nórdicos, mitos e lendas extraordinários de todo tipo saídos das sagas antigas. Queriam controlar as igrejas. Estavam dispostos a fechar um acordo com elas.
A Igreja concordou em dissolver seu partido político, e Hitler ganhou o controle da educação alemã; foi um ótimo acordo. As comemorações do aniversário dele eram ordenadas desde o púlpito.
Não há dúvida, os nazistas queriam o controle -e estavam dispostos a entrar em choque com as igrejas para conseguir isso.
As pessoas juravam por Deus que jamais desrespeitariam o juramento feito ao Führer. Isso não é nem secular, o que dirá ateu.
Agradecia-se a Hitler nas orações antes das refeições.
Creio que sim.
Você mencionou a Coreia do Norte. Ela é um Estado teocrático, em todos os sentidos. É quase sobrenatural, na medida em que os nascimentos na família (governista) Kim são vistos como sendo misteriosos e acompanhados por acontecimentos fora do comum. É uma "necrocracia" ou uma "mausoleucracia", mas não seria possível dizer que seja um Estado secular, o que dirá um Estado ateu.
As tentativas de fundar religiões novas deveriam atrair nosso desdém, tanto quanto o atraem as alianças com as religiões velhas.
Tudo o que se afirma é que não é possível dizer Hitler tenha sido nitidamente cristão: "Talvez, se ele tivesse continuado, teria se descristianizado um pouco mais". Isso é tudo baboseira absoluta. É falho como história e é falho como propaganda política.
E é falho como lógica, porque não existe conexão entre ateísmo e atos hediondos; por outro lado, essa ligação pode facilmente ser traçada no caso da religião, como vemos com o islã moderno.
Na medida em que a adoração a Stálin e o "Kim Il-sungismo" são novas religiões, nós, como todos os ateus, as repudiamos absolutamente.
Acusam você de ser do contra, que é uma descrição que vocês mesmo já fez de si.
Na realidade, não fiz. Eu a rejeitei. Mas a penduraram em meu pescoço e não tenho como me livrar dela.
Sempre desconfiei da dimensão política esquerda-direita.
Para mim ela já se rompeu.
Mas é espantoso como o contínuo esquerda-direita ainda exerce influência. Se você sabe o que alguém pensa sobre a pena de morte ou o aborto, sabe o que ela pensa sobre tudo. Você é uma exceção à regra.
Tenho uma coerência, que é ser contra o totalitário -o de esquerda e o de direita. O totalitário é o inimigo: aquele que é absoluto, que quer o controle do que acontece na sua cabeça, não apenas sobre suas ações e os impostos que você paga. E as origens disso são teocráticas, obviamente.
O começo disso é a ideia de que existe um líder supremo, ou papa infalível, ou rabino-chefe capaz de receber e expressar o pensamento divino e então nos dizer o que fazer.
Há formas seculares disso, com gurus e ditadores; essencialmente, é a mesma coisa.
Alguns pensadores -acima de todos, Orwell - compreenderam que, infelizmente, os humanos possuem uma forte tendência inata a adorarem, a se tornarem abjetos.
Portanto não estamos apenas combatendo ditadores. Estamos criticando os outros humanos por tentarem usar atalhos, simplificar suas vidas, rendendo-se e dizendo: "Se você me oferecer a felicidade suprema, é claro que abrirei mão de parte de minha liberdade mental em troca disso". Afirmamos que essa é uma barganha falsa: você não receberá nada, tolo.
A parte de você que foi, ou é, da esquerda radical sempre é contra ditadores totalitários.
Sim. Fui trotskista; para nós, o movimento socialista só poderia ser reavivado se fosse purgado do stalinismo. Considerávamos o stalinismo uma teocracia.
Uma das minhas principais queixas quanto à religião é o modo como rotulam uma criança como "católica" ou "muçulmana". De tanto reclamar disso, estou até chato.
Nunca tenha medo de ser acusado de chato, ou de excessivamente rigoroso. Não há mal no excesso de rigor. O rigor é o mínimo que você deve empregar como arma. Se você continuar a insistir em algo, o pior que podem dizer é que você é tedioso.
Hoje mesmo recebi um texto de conselhos, de um site do governo britânico, intitulado "As Responsabilidades dos Pais" ou algo assim. Uma das responsabilidades era "determinar a religião do filho". Literalmente, determinar. Mas quando me queixo a esse respeito me dizem que ninguém rotula as crianças.
O governo, sim. A meu ver, isso vem de uma política imperial britânica, que, por sua vez, veio de impérios otomanos e anteriores: você classifica seus novos súditos segundo a fé deles.
Você pode ser um cidadão otomano, mas é um cidadão otomano judeu ou cristão armênio. E algumas dessas religiões dizem às crianças que as crianças de outras religiões vão para o inferno. Acho que não podemos proibir isso, nem podemos descrevê-lo como "discurso de ódio" -embora eu tenha minhas dúvidas-mas deveria causar alguma desaprovação.
Eu chamaria isso é abuso infantil mental.
Como libertário, não tenho como dizer que as pessoas não deveriam educar seus filhos segundo seus direitos, por exemplo. Mas a criança possui direitos, e a sociedade, também. Não permitimos a mutilação genital feminina, e acho que não deveríamos tolerar a masculina.
Mas seria muito difícil afirmar que você não tem o direito de dizer a seu filho que ele tem sorte e que ingressou para a única fé verdadeira. Não vejo como deter isso. Acho apenas que o resto da sociedade deveria olhar para isso com um pouco de desaprovação, coisa que não acontece.
Há uma tendência entre liberais de achar que a religião deveria estar fora de discussão.
Ou até mesmo de achar que existe um racismo antirreligioso, algo que, a meu ver, é uma limitação terrível.
Você acha que os EUA correm o risco de virar uma teocracia?
Não. As pessoas em quem pensamos quando falamos disso -os evangélicos protestantes extremos, que querem realmente uma América comandada por Deus e acreditam que ela foi fundada segundo princípios fundamentalistas protestantes- talvez sejam a ameaça mais superestimada no país.
Que bom.
Eles já foram derrotados em toda parte. Por que isso?
Na década de 1920, tiveram uma sequência de vitórias. Proibiram a venda, manufatura, distribuição e consumo de álcool. Incluíram isso na Constituição. Mais ou menos conseguiram proibir a imigração vinda de países de maioria não branca, não protestante. Eles nunca se recuperaram dessas vitórias.
Nunca se recuperarão do fracasso da Lei Seca. Ou do julgamento Scopes [de 1925, envolvendo o ensino da teoria da evolução nas escolas]. Cada vez que tentaram introduzir o ensino do criacionismo, os conselhos de ensino, pais ou tribunais derrotaram as tentativas, e na maioria dos casos graças ao trabalho de pessoas como você, que mostraram que é bobagem.
Isso é muito animador.
O que me preocupa um pouco mais é a natureza reacionária e extrema do papado neste momento. Por outro lado, parece que o papa não consegue muita fidelidade junto à congregação americana, que desobedece à Igreja abertamente com relação aos anticoncepcionais, o divórcio, o casamento gay, em grau extraordinário e que eu não teria previsto.
Ela está até mesmo se mantendo firme com relação ao aborto, que, em minha opinião, é uma questão moral muito forte e não deveria ser decidida levianamente.
A única ameaça religiosa real nos EUA é a mesma que, lamento dizer, existe em muitos outros países: uma ameaça externa. É o jihadismo, parcialmente cultivado no próprio país; mas em parte o jihadismo americano é fraco e se desacredita sozinho.
Chega a preocupar você a ideia de que, se vencermos e destruirmos o cristianismo, por assim dizer, o vazio poderia ser preenchido pelo islã?
Não. É engraçado, mas não me preocupo com a possibilidade de vencermos. O único que podemos fazer é nos assegurarmos de que as pessoas saibam que existe uma alternativa muito mais maravilhosa, interessante e bela. Não, não acredito que a Europa se encheria de muçulmanos à medida que se esvaziasse de cristãos. O cristianismo derrotou a si mesmo na medida em que se tornou uma coisa cultural. Não há realmente cristãos crentes, como havia gerações atrás.
Na Europa isso é verdade, certamente. Mas e nos EUA?
Acho que há uma tendência que vem de longa data, no mundo desenvolvido e em grandes áreas fora dele, de as pessoas enxergarem as virtudes da separação entre igreja e Estado, porque já experimentaram a alternativa.
A cada vez que algo como uma jihad ou movimento de sharia tomou conta de qualquer país -é verdade que isso só foi possível em casos muito primitivos-, o país é uma ruína ainda em brasa, com produtividade zero.
Analisando a religiosidade nos países do mundo e nos diferentes Estados dos EUA, constata-se que a religiosidade tende a estar correlacionada à pobreza e a vários outros índices de carência social.
Sim, é também disso que ela se alimenta. Mas não quero ser condescendente em relação a isso. Conheço muitas pessoas altamente instruídas, muito prósperas e muito reflexivas que creem. Não é inédito que pessoas tenham a ilusão de serem Deus ou o Filho sagrado. É uma ilusão comum, mas, novamente, acho que não precisamos condescender.
Rick Perry [pré-candidato republicano à Presidência dos EUA] declarou certa vez: "Não apenas creio que Jesus seja meu salvador pessoal, como creio que os que não acreditam nele vão para o castigo eterno". Ele foi contestado em relação a essa última parte e respondeu: "Não tenho o direito de modificar a doutrina. Não posso dizer que ela vale para mim, e não para outros."
Frequentemente me perguntam por que os EUA, uma nação de base secular, é tão mais religiosa que países europeus ocidentais que têm uma religião oficial, como os da Escandinávia ou o Reino Unido.
[Alexis] de Tocqueville acertou na mosca. Se você quer uma igreja nos EUA, tem de erguê-la com o suor de sua fronte, e muitos já o fizeram. É por isso que são tão ligados a elas. Os judeus -mas não todos-, surpreendentemente, abandonaram sua religião pouco tempo depois de chegar do Leste Europeu.
Então a maioria dos judeus abandonou sua religião?
Nos Estados Unidos, cada vez mais. Quando as pessoas vieram para escapar da perseguição religiosa e não quiseram reproduzir a perseguição, essa era uma memória muito forte.
Os judeus se secularizaram muito rapidamente quando vieram. Os judeus americanos, como coletivo, devem constituir a força mais secular do planeta, hoje. Isto é, se considerarmos que formam um coletivo, o que não parece ser realmente o caso.
Embora não sejam religiosos, muitas vezes ainda observam o shabat e esse tipo de coisa.
Isso só pode ser algo cultural. Eu celebro o Pessach todo ano. Às vezes até faço um seder [jantar em comemoração à páscoa judaica], porque quero que minha filha saiba que vem de outra tradição, de modo muito distante.
Se ela encontrasse seu bisavô, isso explicaria, porque ele fala iídiche. É cultural, mas o seder do Pessach é também o fórum socrático. É dialético. É acompanhado por vinho. Tem todos os elementos de uma discussão muito boa. E há o destino manifesto.
As pessoas sentem que os EUA são um lugar de sorte. É um país que fica entre dois oceanos, repleto de minerais, de beleza, de riqueza. Para muitas pessoas, realmente parece providencial.
A terra prometida.
Tudo isso e mais o desejo de outro jardim do Éden. Alguns utópicos seculares vieram para cá com a mesma ideia. Thomas Paine e outros todos pensaram na América como o maravilhoso recomeço para a espécie.
Mas isso tudo foi secular.
Muito foi, mas é impossível fugir da liturgia: ela é poderosa demais. Você acaba dizendo coisas como "terra prometida", e isso pode ser usado para fins sinistros.
Mas, em muitos casos, é uma crença benigna. Trata-se só de dizer: "Devemos compartilhar nossa boa sorte". A razão pela qual a maioria de meus amigos não é crente não tem a ver especialmente com terem participado de discussões como as que você e eu temos tido, mas com o fato de que a religião obrigatória na escola os tornou indiferentes à religião.
Ficaram entediados.
Ficaram fartos. Eles pegavam da religião, de vez em quando, aquilo de que precisavam: se precisassem se casar, sabiam aonde ir. É claro que alguns deles são religiosos, outros gostam da música, mas, de modo geral, os britânicos são benignamente indiferentes à religião.
E o fato de haver uma igreja estabelecida aumenta esse efeito. As igrejas não deveriam ser isentas de impostos, como são. Não automaticamente, de todo modo.
Com certeza, não deveriam. Se a Igreja pede que seja dado tempo igual a especulações criacionistas ou pseudocriacionistas... Qualquer igreja que ensina isso em sua escola e recebe dinheiro federal da iniciativa religiosa deveria, por lei, também ensinar o darwinismo e conhecimentos alternativos, para que se ensine o debate. Acho que elas não querem isso.
A religião comparativa seria uma das melhores armas, desconfio.
Hoje a coisa ficou tão insípida em partes dos Estados Unidos que muitas crianças crescem sem qualquer conhecimento de qualquer religião de qualquer tipo. Isso porque seus pais não lhes transmitem esse conhecimento; eles deixam a cargo das escolas, e as escolas têm medo de mexer com isso. Eu gostaria que as crianças soubessem de que trata a religião, senão algum guru ou alguma seita pode fazer a cabeça delas.
Elas são vulneráveis. Eu também gostaria que elas conhecessem a Bíblia, por razões literárias.
Precisamente. Uma parte enorme da literatura inglesa seria de difícil compreensão se as pessoas não conhecessem a Bíblia.
Você teria algo a dizer sobre o Natal?
Sim. Não poderia deixar de haver um feriado no solstício do inverno. A religião dominante não poderia deixar de tomar conta dessa festa, e isso teria acontecido mesmo sem Charles Dickens e todos os outros.
A árvore de Natal vem do príncipe Albert [consorte da rainha Vitória da Inglaterra]; os pastores e os três reis magos são todos invenções.
Cirênio não era governador da Síria, tudo isso. Cada vez mais, o Natal vem se secularizando. E essa mania de desejar "boas festas" é algo de que também não gosto.
É horrível, não? "Boas festas"
Prefiro nossas frases sobre o cosmos.
Tradução de CLARA ALLAIN Texto Anterior | Próxim

sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

Após 16 anos de tucanato e petismo...vocês não acham que algo se esconde nas dobras do poder conivente? O primeiro nome na lista, deveria ser do ... governo.

30/12/2011 - 17h13

Governo insere 52 nomes na "lista suja" do trabalho escravo

Leonardo Sakamoto
Comentários 20
Atualizada nesta sexta (30), o cadastro de empregadores flagrados com mão-de-obra análoga à de escravo cresceu com a entrada de 52 novos registros, chegando ao número recorde de 294 nomes, de acordo com notícia divulgada no Blog do Sakamoto. Entre os que entraram na “lista suja” estão grupos sucroalcooleiros, madeireiras, empresários e até uma empreiteira envolvida na construção da usina hidrelétrica de Jirau. A relação inclui também médicos, políticos, famílias poderosas e casos de exploração de trabalho infantil e de trabalho escravo urbano. Para ver a lista atualizada, clique aqui.

A “lista suja” tem sido um dos principais instrumentos no combate a esse crime, através da pressão da opinião pública e da repressão econômica. Após a inclusão do nome do infrator, instituições federais, como o Banco do Brasil, a Caixa Econômica Federal, o Banco da Amazônia, o Banco do Nordeste e o BNDES suspendem a contratação de financiamentos e o acesso ao crédito. Bancos privados também estão proibidos de conceder crédito rural aos relacionados na lista. Quem é nela inserido também é submetido a restrições comerciais e outros tipo de bloqueio de negócios por parte das empresas signatárias do Pacto Nacional pela Erradicação do Trabalho Escravo – que representam mais de 25% do PIB brasileiro.

O nome de uma pessoa física ou jurídica é incluído na relação depois de concluído o processo administrativo referente à fiscalização dos auditores do governo federal e lá permanece por, pelo menos, dois anos. Durante esse período, o empregador deve garantir que regularizou os problemas e quitou suas pendências com o governo e os trabalhadores. Caso contrário, permanece na lista.

Abaixo, trechos da apuração de Bianca Pyl, Daniel Santini e Maurício Hashizume, da Repórter Brasil, que monitora o cadastro desde sua criação em novembro de 2003:

Entre os novos registros, há casos como o de Lidenor de Freitas Façanha Júnior, cujos trabalhadores, segundo os auditores fiscais do trabalho envolvidos nas operações de libertação, bebiam água infestada com rãs, e o do fazendeiro Wilson Zemann, que explorava crianças e adolescentes no cultivo de fumo. Entre os estados com mais inclusões nesta atualização estão Pará (9 novos nomes), Mato Grosso e Minais Gerais (8 cada). A incidência do problema no chamado Arco do Desmatamento demonstra que a utilização de trabalho escravo na derrubada da mata para a expansão de empreendimentos agropecuários segue presente.

Nesta atualização, apenas dois nomes foram retirados do cadastro (Dirceu Bottega e Francisco Antélius Sérvulo Vaz), o que pesou para que a relação chegasse a quase 300 registros.

Escravos da cana

Entre os destaques da atualização estão libertações que chamam a atenção pelo grande número de escravos resgatados em plantações de cana-de-açúcar. Só na Usina Santa Clotilde S/A, uma das principais de Alagoas, foram flagrados 401 trabalhadores em situação degradante em 2008. Também entra nesta atualização a Usina Paineiras, que utilizou 81 escravos em Itabapoana (RJ) em 2009. Um ano após o flagrante que resultou nesta inclusão, a empresa comprou a produção da Erbas Agropecuária, onde foram flagrados 95 trabalhadores escravizados.
Mesmo com o aumento da preocupação social por parte das usinas, real ou apenas declarado, o setor ainda tem ocorrências de mão-de-obra escrava.

A Miguel Forte Indústria S/A foi flagrada explorando 35 trabalhadores, incluindo três adolescentes, na colheita de erva-mate em Bituruna (PR). A madeireira, que mantinha o grupo em barracões de lona sob comando de “capatazes”, anuncia na sua página que “o apoio a projetos sociais que promovem a cidadania e o bem-estar, principalmente entre a população carente, mostra o comprometimento da Miguel Forte com os ideais de uma sociedade mais justa e humana”. À frente da empresa, Rui Gerson Brandt, acumula o cargo de presidente do Sindicato das Indústrias de Papel e Celulose do Paraná (Sindpacel).

Hidrelétrica de Jirau

Não é só na monocultura ou no campo que os flagrantes acontecem. As condições degradantes em projetos bilionários do país têm sido uma constante e, nesta atualização, uma das empreiteiras envolvidas na construção de uma hidrelétrica também entrou na lista. A Construtora BS, contratada pelo consórcio Energia Sustentável do Brasil (Enersus), foi flagrada utilizando 38 escravos na construção da Usina Hidrelétrica de Jirau. Além de enfrentarem problemas relacionados aos alojamentos, segurança no trabalho e saúde, os empregados ainda eram submetidos a escravidão por dívida, por vezes em esquemas sofisticados que envolvem até a cobrança por meio de boletos bancários, conforme denunciado, na época, pela Repórter Brasil.

Roupas da Zara são produzidas por escravos

Foto 4 de 7 - Equipes de fiscalização do governo federal flagraram, por três vezes, trabalhadores escravos produzindo peças de roupa da marca Zara na cidade de São Paulo Mais Bianca Pyl/Repórter Brasil
Mesmo após o flagrante, as condições de trabalho não melhoraram, segundo denúncias recentes. Em abril deste ano, um grupo de 20 trabalhadores procurou o Sindicato dos Trabalhadores da Construção Civil de Rondônia (Sticcero) alegando que a BS não havia pago o aviso prévio e eles estavam dormindo no galpão da Construtora, sem ter como voltar para casa. Uma liminar chegou a bloquear os bens da empresa em 2011.

O isolamento, aliás, continua sendo utilizado como ferramenta para escravizar pessoas. Nesta atualização da lista, foi incluído Ernoel Rodrigues Junior, cujos trabalhadores estavam em um local de tão difícil acesso que foi necessário um helicóptero para o resgate dos trabalhadores. ??Entre os libertados estavam dois adolescentes de 15 e 17 anos e uma de 16 anos. Para chegar no local em que o grupo estava, foi necessário percorrer a partir de São Félix do Xingu (PA) por 14 horas um caminho que contava com uma ponte de madeira submersa, balsa e estradas de terra em condições tão ruins que foi necessário o uso de tratores para desatolar alguns dos veículos. De acordo com os relatos colhidos pela fiscalização, todos tinham medo de reclamar porque o fazendeiro e o segurança da propriedade andavam armados. Para que conseguisse fazer a denúncia, um trabalhador explorado conseguiu fugir e teve de caminhar durante seis dias pela mata e por estradas de terra.

Outro destaque na atualização da “lista suja” neste ano é a inclusão de Fernando Jorge Peralta pela exploração de escravos na Fazenda Peralta, em Rondolândia (MT). O Grupo Peralta é um conglomerado empresarial poderoso, do qual fazem parte a rede de supermercados Paulistão, a Brasterra Empreendimentos Imobiliários, as concessionárias Estoril Renault/Nissan (em Santos, Guarujá e Praia Grande), os shoppings Litoral Plaza Shopping e Mauá Plaza Shopping (cuja construção, na época, envolveu uma denúncia de propina), a Transportadora Peralta (Transper) e a PRO-PER Publicidade e Propaganda, só para citar os principais ramos de atividade do grupo. O flagrante que levou Fernando Jorge à “lista suja” aconteceu em 2010 e envolveu a libertação de 11 trabalhadores de sua fazenda.

Luiz Carlos Brioschi e Osmar Brioschi, que também entram na lista nesta atualização, foram flagrados se aproveitando de 39 trabalhadores na colheita do café em Marechal Floriano (ES). Eles mantinham os empregados em regime de escravidão por dívidas e em condições extremamente precárias de trabalho e vida. Dois dias após a libertação ter sido divulgada, Osmar Brioschi esteve entre os homenageados com placas e diplomas na Assembleia Legislativa do Espírito Santo pelo “trabalho realizado em favor do campo capixaba”, por iniciativa do deputado Atayde Armani (DEM-ES).

Devastação ambiental

Outro aspecto reforçado pela atualização da lista é o elo entre escravidão e devastação ambiental. O uso de escravos em grandes projetos de desmatamento e em áreas com conflitos agrícolas é bastante comum. Desta vez, foi incluído na relação Tarcio Juliano de Souza, apontado como responsável pela destruição de milhares de hectares de floresta amazônica nos últimos anos. Ele é considerado pela Polícia Federal responsável por montar um esquema para desmatar cerca de 5 mil hectares de floresta nativa na região de Lábrea (AM), onde mantém a Fazenda Alto da Serra. Chegou a ser preso em Rio Branco (AC) pelos crimes de redução de pessoas a condições análogas à escravidão, aliciamento de trabalhadores e destruição de Áreas de Preservação Permanente (APPs) e foi denunciado por tentar comprar um fiscal. Na época, o superintendente regional do trabalho Dermilson Chagas declarou que Tárcio estava à frente de um “consórcio de fazendeiros” do Acre formado para transformar grandes áreas de Lábrea (AM) em pastos, com a utilização criminosa de escravos para o desmate, para criar gado bovino.

Políticos e doutores

Um ex-prefeito, um ex-secretário municipal do Meio Ambiente e dois médicos estão entre os que entraram na relação nesta atualização. O ex-prefeito Edmar Koller Heller foi flagrado em 2010 explorando mão-de-obra escrava em um garimpo na Fazenda Beira Rio, que fica em Novo Mundo (MT), a 800 km da capital mato-grossense Cuiabá (MT), próximo à divisa com o Pará. Edmar foi prefeito de Peixoto de Azevedo (MT) em 2000, pelo extinto PFL (hoje DEM). Teve seu mandato cassado após ser acusado de desvio de recursos públicos, contratação de pessoal especializado sem licitação e contratação ilegal de veículos automotores de auxiliares de confiança.

Em 2007, ele se envolveu em outro escândalo político e chegou a ser preso. Como secretário de Administração da prefeita Cleuseli Missassi Heller, sua esposa, ele foi considerado responsável por improbidade administrativa, configurada pelo favorecimento de uma única empresa em processos licitatórios do município. Em 2009, a Terceira Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Mato Grosso manteve a condenação.

Outro político que passa a fazer parte da lista é Evanildo Nascimento Souza, flagrado com escravos quando ainda era secretário de Meio Ambiente de Goianésia do Pará (PA). O homem que deveria zelar pela natureza foi flagrado explorando trabalhadores justamente no corte e queima de madeira para produção de carvão. De acordo com o Ministério Público do Trabalho (MPT), foram encontrados na Fazenda RDM (onde se localiza a Carvoaria da Mata), em julho de 2009, nove trabalhadores laborando em condições degradantes no corte de madeira, transporte, empilhamento, enchimento dos fornos, vedação do forno com barro e carbonização. Os trabalhadores não possuíam equipamentos de proteção individual (EPIs) e estavam alojados em um barraco em péssimas condições, sujo com detritos, restos de maquinário e peças de veículos, armazenamento de combustível, sem separação para homens e mulheres, nem ventilação e iluminação.

Os médicos incluídos na relação são José Palmiro Da Silva Filho, CRM 830, flagrado com cinco escravos na Fazenda São Clemente, em Cáceres (MT), e Ovídio Octávio Pamplona Lobato, CRM 3236, flagrado com 30 escravos na Fazenda Tartarugas, em Soure (PA).