PMDB une cúpula, mas na base divisões ainda persistem
Por Jeferson Ribeiro
BRASÍLIA, 23 de setembro (Reuters ) - O maior partido da base aliada do governo, o PMDB, vive um raro momento de calmaria na sua cúpula, mas essa tranquilidade sofre continuamente com percalços nas bancadas da Câmara e do Senado, que por ora têm sido contidos pelo comando da legenda.
O PMDB de hoje está distante daquele de anos atrás quando as convenções nacionais eram contestadas por alas do partido na Justiça e podiam acabar até em pancadaria, como ocorreu em 1998, quando o ex-presidente Itamar Franco tentava conseguir o apoio dos peemedebistas para disputar a eleição contra o então presidente Fernando Henrique Cardoso.
Isso não quer dizer, porém, que o PMDB está completamente unido e que suas divisões internas não trarão dificuldades para o atual governo, como o qual está aliado formalmente com o vice-presidente Michel Temer.
Como costumam dizer os peemedebistas quando o assunto é a unidade da legenda: "é um partido grande demais para estar plenamente unido".
O líder da bancada na Câmara, Henrique Eduardo Alves (RN), por exemplo, considera "razoável" que até uns 15 por cento dos deputados discordem das posições da cúpula.
Recentemente, por exemplo, um grupo de aproximadamente 35 deputados, de uma bancada de 80, causou preocupação ao Planalto quando ameaçou apoiar a abertura de uma CPI para investigar corrupção no governo caso não tivesse algumas demandas atendidas por Alves.
Eles reivindicavam mais debate interno para as decisões tomadas na cúpula do partido e conseguiram reverter uma escolha de Alves para relatoria da reforma do Código do Processo Civil.
Aquela pequena rebelião foi contornada depois que Temer chamou o grupo de rebeldes à sua sala e determinou o fim da guerra pública.
Também por conta da mão forte do comando partidário, o PMDB viu três de seus ministros deixarem o governo deputados e senadores peemedebistas não se lançaram numa disputa aberta pelo cargo vago, o que ocorria até pouco tempo no governo Lula, e nem causaram grandes embaraços para a escolha da cúpula.
Para o professor Roberto Romano, da Unicamp, a visível calmaria no PMDB é fruto de duas condições principalmente. Uma delas é que não há contestação aberta à liderança do grupo do presidente do Senado, José Sarney (AP).
E a segunda é que Sarney tem em Temer um aliado que comanda a máquina partidária e tem capacidade de diálogo que permite "cimentar a atual unidade".
O presidente do PMDB, senador Valdir Raupp (RO), acredita que as divisões mais profundas do partido foram suavizadas também pelo momento político nacional.
"A eleição do Temer como vice ajudou a pavimentar essa união, hoje somos parte formal do governo. As divisões que temos nas bancadas são pontuais", avaliou.
RISCOS DE DESUNIÃO
Romano acredita, contudo, que há riscos internos e externos para a manutenção dessa atual fase do PMDB. O professor analisa que se Temer ou Sarney perderem essa capacidade de articulação o partido voltará ao período de desunião de anos atrás.
"Essa manutenção da unidade também vai depender muito do destino do PSD e vai depender da reação do PT no Congresso", salientou.
O professor analisa que o Partido Social Democrático (PSD), criado pelo prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, e que aguarda para receber o registro formal do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), pode tomar espaços do PMDB numa eventual reforma ministerial. Isso poderia abalar a relação dos peemedebistas com o governo.
Outro risco a essa unidade da cúpula pode vir de dentro do partido na avaliação de Romano. Um exemplo desse aspecto são os deputados novos, ainda no primeiro mandato, e que estavam à frente da rebelião de meses atrás.
O deputado Danilo Forte (CE), um dos líderes desse grupo, afirma que esses novos deputados estão "trabalhando para que se tenha um novo modelo" de comando no PMDB. "Todo salto de qualidade que a sociedade deu veio de uma ruptura", afirmou o parlamentar.
Para ele, a unidade atual faz bem ao partido, "mas não pode servir para beneficiar ninguém individualmente". O alvo da crítica é o próprio líder da bancada. PT e PMDB têm um acordo para que, depois de Marco Maia (PT-RS), um peemedebista venha a presidir a Câmara, e Alves é considerado o candidato natural do PMDB.
Mas os movimentos de Alves com vistas ao cargo têm provocado reações entre os colegas de partido. Inclusive no núcleo próximo a Temer há preocupação com a atuação do experiente aliado, segundo disse à Reuters uma fonte do Palácio do Planalto sob condição de anonimato.
Alves, que está no 11o mandato de deputado, rejeita as insinuações de que estaria preocupado apenas em encaminhar uma eleição tranquila para a presidência da Câmara em 2013.
"Se fosse isso, eu não teria enfrentado o governo na votação do Código Florestal, por exemplo. Isso é coisa daqueles que não tiveram seus interesses atendidos, o que é natural numa base aliada tão grande", argumenta.
Na avaliação dele, as divisões do PMDB vêm do nascedouro e pelo tamanho do partido sempre existirão. "O PMDB nasceu da divisão. Eram os moderados, de Tancredo Neves, e os autênticos, do Ulysses Guimarães, e sempre houve diálogo," analisa.
Tancredo e Ulysses são os dois maiores expoentes do PMDB. O primeiro foi eleito indiretamente como primeiro presidente brasileiro após fim do regime militar e o segundo comandou a Câmara dos Deputados depois da reabertura política e também presidiu a Assembleia Nacional Constituinte, em 1988.