Por um novo padrão de política |
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Escrito por Leo Lince |
Qui, 01 de Setembro de 2011 |
No último trimestre, temporada outono/inverno da política oficial brasileira, os escândalos desfilaram de mãos dadas na esplanada dos ministérios. Uma seqüência impressionante de abalos. Houvesse para a micro-política o mesmo rigor de medição que impera na macroeconomia ou nas catástrofes naturais, o alerta geral estaria ligado no grau máximo.
Primeiro desabou a fortíssima Casa Civil. Aquele que se supunha inamovível, alardeado como o primeiro entre os pares, teve que sair de fininho, sem tugir nem mugir. Palhoças, as secretarias das Relações Institucionais e da Pesca trocaram de titular no vácuo do primeiro desabamento.
A Casa Militar, o Ministério da Defesa, desabou em seguida. O sempre temível poder armado viu seu titular ser afastado por razões peculiares. Boquirroto, ele fez jus ao apelido sulista que carrega desde priscas eras: “Leão de Coleira”, aquele que ruge na rua e apanha da mulher em casa.
Duas jóias da coroa, gigantes por onde vazam pedaços polpudos do orçamento, desabaram com estardalhaço. O Ministério dos Transportes, manjedoura das grandes empreiteiras; e o da Agricultura, reserva de domínio e pasto do agronegócio. Como indica a sujeira revelada até agora, são dois pontos de uma mesma malha de cumplicidade, na qual se articulam o intestino grosso da pequena política e os barões assinalados da renovada oligarquia brasileira.
Outros ministérios seguem pendurados por um fio. O caso do Turismo é um escárnio. O titular da pasta, por conta daquela farra em motel paga com dinheiro público, já chegou queimado. A Polícia Federal, na sequência, completou o serviço: prendeu o alto escalão inteiro da pasta, que se tornou um valhacouto de indiciados. Na fila de espera, basta puxar o fio da meada, estão os ministérios das Comunicações e o das Cidades.
O caso do Ministério das Cidades, que parece ter encerrado a temporada, é emblemático. O titular da pasta botou a boca no trombone. Disse que iria “contar tudo”, ameaçou vazar currículos, “ou melhor, folha corrida”, de deputados de seu próprio partido e alertou para os riscos em briga de família, onde “irmão mata irmão e morre todo mundo”. São declarações que, por si só, justificariam sua demissão sumária, mas foram dadas para garanti-lo no cargo. Papo de mafioso, “omertá”, coisa de desqualificados, mas funcionou.
Casos isolados que se repetem? “Malfeitos” que se resolvem com puxões de orelha, campanhas de propaganda e rearmamento moral? Nada disso. São expressões concretas da corrupção sistêmica. Um padrão estrutural de política, funcional ao sistema dominante, do qual o governo atual, assim como os anteriores, os partidos da ordem, da base aliada ou da oposição, não conseguirão jamais se afastar.
O estigma que Pedro Simon lançou sobre o governo FHC (“não sei se o Fernando Henrique rouba ou deixa roubar, mas sei que ele não deixa investigar”) continua valendo. Valeu no governo Lula e agora paira sobre a cabeça da presidente Dilma.
Coalizão de governo nada programática, montada na base do interesse puro e alimentada no nascedouro pelas tetas gordas do mensalão, não suporta transparência nem tolera faxina ética. Os da base do governo batem cabeça, brigam pelo pirão primeiro, mas não se emendam. Com a crise batendo à porta, este será, cada vez mais, um governo de “colisões”.
Ainda assim, não sai coelho da cartola do governo. Tampouco dos partidos de oposição comprometidos com a ordem dominante. As sementes da mudança estão sendo lançadas no terreno certo, na sociedade civil. A Ordem dos Advogados do Brasil pode ter dado um passo histórico ao instituir o Observatório da Corrupção. Esperança nova para a estação primavera/verão e alento na luta por outro padrão de política.
Léo Lince é sociólogo. |