Contra o “ativismo do judiciário”, governo do PT pretende mutilar a Constituição |
Escrito por Raphael Tsavkko |
Qui, 25 de Abril de 2013 |
Em primeiro lugar é preciso deixar claro que o atual governo reclamar
de um suposto "ativismo do judiciário" quando é o responsável pela
indicação de maioria dos ministros do STF é o cúmulo da cara-de-pau.
Dito isto, vamos ao que interessa. Finalmente compreendemos porque o
PT preferiu assumir a CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) ao invés
da Comissão de Direitos Humanos e Minorias (CDH), entregando-a para o
Feliciano, do PSC:
Comissão aprova proposta que submete decisões do STF ao Congresso
De acordo com o texto do deputado Nazareno Fonteles (PT-PI),
parlamentares poderão vetar determinadas deliberações dos ministros da
Corte; projeto segue para colegiado especial.
Em outras palavras, a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 33/11 é
um verdadeiro golpe contra o judiciário, fruto apenas do desejo de
vingança por parte do PT (pelo mensalão) e de seus aliados da Bancada
Teocrática (que não aceita os avanços promovidos pelo STF em relação aos
direitos LGBTs e das mulheres), com apoio entusiasmado do PSDB (para
quem a Constituição sempre foi um detalhe, vide a reeleição fraudulenta
de FHC), é uma tentativa de neutralizar o STF, intervindo no judiciário.
Trata-se de uma iniciativa que visa forçar que decisões do STF em
relação a súmulas vinculantes, e declarações de inconstitucionalidade a
emendas à Constituição propostas pelo Congresso passem por ele mesmo. Ou
seja, o Congresso promove uma alteração inconstitucional, o STF barra e
o mesmo Congresso passa por cima, dizendo que quem decide é ele.
Além disso, a PEC ainda propõe uma alteração ao quórum necessário
para aprovar decisões no STF; não mais 7 de 11 votos, mas 9 de 11. Ou
seja, uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) só será aprovada
por 9x2! Isto se o presidente votar, o que nem sempre faz, aí teríamos
9x1!
A proposta foi apresentada pelo PT (Nazareno Fonteles) e relatada por um teocrata do PSDB (João Campos).
O que o governo pretende é ter a última palavra em questões
constitucionais, tirando-a do judiciário, ou seja, quer usar sua maioria
para passar por cima do Judiciário e de garantias constitucionais. É
óbvio que tal iniciativa agrada aos evangélicos e teocratas em geral,
que podem impor seu projeto de medievalização sem se preocupar em serem
barrados pelo Supremo, já que contam com apoio e entusiasmo petistas e
não são desafiados pela maioria do Congresso.
O projeto é uma clara afronta à Constituição, mas fica a dúvida: se o
Congresso aprova a PEC e esta for derrubada pelo STF, ela voltaria ao
Congresso, que a aprovaria baseada nela própria?
Subseção II
Da Emenda à Constituição
Art. 60. A Constituição poderá ser emendada mediante proposta:
I - de um terço, no mínimo, dos membros da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal;
II - do Presidente da República;
III - de mais da metade das Assembléias Legislativas das unidades da
Federação, manifestando-se, cada uma delas, pela maioria relativa de
seus membros.
§ 1º - A Constituição não poderá ser emendada na vigência de intervenção federal, de estado de defesa ou de estado de sítio.
§ 2º - A proposta será discutida e votada em cada Casa do Congresso
Nacional, em dois turnos, considerando-se aprovada se obtiver, em ambos,
três quintos dos votos dos respectivos membros.
§ 3º - A emenda à Constituição será promulgada pelas Mesas da Câmara
dos Deputados e do Senado Federal, com o respectivo número de ordem.
§ 4º - Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir:
I - a forma federativa de Estado;
II - o voto direto, secreto, universal e periódico;
III - a separação dos Poderes;
IV - os direitos e garantias individuais.
§ 5º - A matéria constante de proposta de emenda rejeitada ou havida
por prejudicada não pode ser objeto de nova proposta na mesma sessão
legislativa.
O PT se iguala ao PSDB em termos de desrespeito à Constituição. Não
bastou se igualar na corrupção, com seu mensalão próprio, mas resolveu
imitar os tucanos e sua afronta à Constituição durante a reeleição de
FHC.
Mas foi além, colocando em real perigo a democracia brasileira, cujo STF e o judiciário são garantidores.
Esta iniciativa, porém, não pode ser compreendida em separado de
outra PEC polêmica, a PEC37, onde o governo busca eliminar o poder de
investigação por parte do Ministério Público, cujo líder, o Procurador
Geral da República Roberto Gurgel, é objeto de ódio por parte do governo
desde que processou os agora condenados mensaleiros petistas (e
aliados).
São duas PECs que, juntas, pintam um quadro assustador, onde o
governo não aceita ser investigado, condenado e muito menos contrariado.
É uma reforma profunda e perigosa no judiciário, feita à revelia dos
interesses da população e mesmo da democracia.
Não é possível também descartar que o entusiasmo do PT com a PEC
33/11 venha da possibilidade de ampliar a vulneração aos direitos
humanos de, por exemplo, povos indígenas, no momento em que o Congresso
busca aprovar projeto para mudar do Executivo para o Legislativo a
prerrogativa de criação de terras indígenas e que o governo invade o
território dos Munduruku para a criação de usinas hidroelétricas no
Tapajós. Ou mesmo enquanto espiona movimentos sociais e de trabalhadores, visando, dentre outras coisas, garantir Belo Monte e a privatização dos portos brasileiros.
É uma forma de o governo atentar livremente contra os direitos
humanos básicos da população – indígenas, LGBTs, quilombolas etc. – sem
ter o STF para freá-lo.
Graças ao ódio – não há outra palavra para descrever – de tal partido
contra os ministros que ele próprio indicou, reforçou-se a aliança com
os teocratas e coloca-se em perigo a democracia brasileira e nossas
garantias constitucionais.
Basicamente, o governo – qualquer governo, quando o PT deixar o poder
irá se arrepender – terá o poder de, com maioria (e se tiver minoria
será sempre atropelado), aprovar QUALQUER mudança na Constituição, por
mais ilegal e inconstitucional que ela seja, pois o STF não terá o poder
de impedir a alteração.
O PT tem o poder de indicar ministros para o STF, exerceu diversas
vezes tal prerrogativa e, ainda assim, prefere passar por cima da
própria Constituição e mutilá-la. Em termos simples, o PT tem o poder de
indicar ministros para o STF, mas não teve a competência (sic) de
indicar ministros que eles pudessem controlar, logo, altera as regras
do jogo ou, em bom português, escolhe o time, perde e está
levando a bola embora.
Meus parabéns. Caminhamos a passos largos para o precipício. Esta PEC
não tem outro nome, senão golpe, e isto vindo de partido cujos
fanáticos apoiadores gritam golpe sempre que a mídia – financiada pelo
governo do PT – ou o STF – indicado em maioria pelo PT – os contradiz.
Raphael Tsavkko Garcia, jornalista e blogueiro, formado em
Relações Internacionais (PUC-SP), é mestre em Comunicação (Cásper
Líbero).
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