Sexta-feira, 7 de Janeiro de 2011
A CORRUPÇÃO E A CAMPANHA PARA A PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA
“Talvez convenha perceber duas coisas sobre corrupção. Primeira, onde há poder há corrupção. E onde há pobreza há mais corrupção. Destes dois truísmos resulta necessariamente que quanto maior é o poder ou a pobreza maior é a corrupção” – Vasco Pulido Valente.
Em plena e azeda campanha eleitoral, em que o “soberaníssimo bom senso”, evocado por Antero, anda tão arredado, há acusações de corrupção que podem vir a afectar a dignidade dos políticos e da própria nação, fazendo perder a fé na Democracia porque, para Aldous Huxley, “nos estados autocraticamente organizados, o espólio do governo é compartilhado entre poucos. Nos estados democráticos há muito mais pretendentes, que só podem ser satisfeitos com uma quantidade muito maior de espólio que seria necessário para satisfazer os poucos aristocratas; a experiência demonstrou que o governo democrático é geralmente muito mais dispendioso do que o governo por poucos". Por outro lado, dá que pensar aos amantes da liberdade que, segundo Edmund Burke, “no meio de um povo geralmente corrupto a liberdade não pode durar muito”.
“Et pour cause”, pela sua actualidade, sem querer, de forma alguma, generalizar o que deve ser particularizado para não ferir, com infundadas suspeitas, a honra de simples cidadãos, transcrevo um meu artigo de opinião, publicado no Público (26/09/2005), intitulado “Portugal e a corrupção”, em que escrevi:
“Era um vez um pequeno país, na feliz imagem de Afonso Lopes Vieira, “onde a terra acaba e o mar começa”, obrigado, pelo interesse e cobiça da União Soviética, da China Popular e do próprio Estados Unidos, então sob a presidência de J. F. Kennedy, para que Angola e Moçambique deixassem de ser territórios sob administração portuguesa, passando Portugal a “viver orgulhosamente só”. Como se viu posteriormente, os verdadeiros motivos dessas grandes potências mundiais tinha por finalidade uma nova e mais impiedosa forma de colonialismo – o neocolonialismo económico. Tudo isto obedeceu a fortes pressões que se faziam impor nos areópagos internacionais, sob o manto hipócrita de nobres intenções humanitárias, que confinariam Portugal a meras fronteiras europeias, assistindo-se, hoje, apesar da torrente caudalosa dos fundos comunitários (até quando?), a este triste panorama: o salário mínimo nacional é inferior ao da Grécia; os ordenados em Espanha são maiores e o custo de vida menor; os automóveis são 15% mais caros do que a média europeia; a bolsa dos portugueses é onerada com impostos mais elevados que os da grande maioria dos paises europeus; e, “last but not least”, alguns países do Leste Europeu começam a aproximar-se – ou mesmo a superiorizarem-se – ao seu desenvolvimento cada vez menor.
Não fossem os relatórios, nada abonatórios para o nosso país, que nos chegam em catadupa do estrangeiro, e são publicados nos media (bendita liberdade de imprensa!), quase poderíamos ser levados a pensar que o bem-estar da Pátria e a felicidade dos portugueses residem, tão-só, em encontrar respostas para perguntas que lhe angustiam a alma, como estas: Será que a condição de octogenário de Mário Soares deve ser ou não impeditiva da sua corrida ao Palácio da Ajuda? Ou, mais prosaicamente, qual o clube da Superliga de Futebol se sagrará campeão nacional da época 2005/2006?
Numa nada “ditosa Pátria”, com uma tantas personagens com responsabilidade políticas que, em momentos de grave crise nacional, se preocupam com questões de “lana caprina” ocupando os tempos de ócio, sob o derradeiro sol de Agosto, com intrigas de soalheiro e desavenças de comadres, a opinião pública foi, de supetão, sacudida pelo artigo de Daniel Kaufmann que relata, na edição de Setembro deste ano da revista “Finance & Development”, editada pelo Fundo Monetário Internacional (FMI), que “Portugal podia estar ao nível da Finlândia se melhorasse a sua posição no “ranking “ de controlo da corrupção”.
Em fim de férias, que normalmente provocam um certo estado depressivo nas pessoas, grande “maldade” a deste articulista na escolha da altura para a denúncia de um “statu quo” em que Portugal deixou de estar “orgulhosamente só” para passar a estar vergonhosamente acompanhado pela corrupção, como que a modos, como diria Pessoa, de um 'cadáver adiado que procria'” .
Numa altura em que a salvação da nossa economia, mercê das asneiras que têm sido feitas e se continuam a fazer com sucessivos Programas de Estabilidade e Crescimento, em que as tentativas de cura se prenunciam como simples e cada vez mais dolorosas panaceias, é encarada, como salvação, “in extremis”, a possível vinda do FMI que poderá fazer recair, como até aqui, sobre os justos as asneiras dos pecadores de um (des)governo que conduziu Portugal à triste e penosa situação actual em que se não divisa a luz ao fundo do túnel. Por mais bruxuleante que seja!
E aqui não se pode deixar de pôr a questão. Será que Jorge de Sena, em sua vida de crítico impiedoso dos (maus) costumes nacionais, mudaria uma vírgula que fosse ao que então escreveu? Escreveu ele: “Cada vez mais penso que Portugal não precisa de ser salvo, porque estará sempre perdido como merece. Nós é que precisamos que nos salvem dele”.