Título: "A Era Lula - Risco autoritário", com Roberto Romano Data: 3/1/2005 Fonte: Correio Braziliense.
"A Era Lula - Risco autoritário", com Roberto Romano
Professor da Unicamp critica comportamento ético do governo e denuncia tentativas de controle da sociedade
O filósofo Roberto Romano , professor titular de ética e de filosofia política da Universidade de Campinas (Unicamp), 58 anos, foi mais um daqueles seminaristas que, nas décadas de 60 e 70, militavam ativamente nos movimentos de esquerda. Por conta disso, foi preso e passou por constrangimentos — mas não se abalou. Afastou-se da batina e foi continuar a luta no meio acadêmico. Lá, reciclou conceitos e hoje é um dos maiores críticos do governo Luiz Inácio Lula da Silva. Acha que alguns petistas do governo — ‘‘os de origem stalinista’’ — tentam controlar o Estado. ‘‘Eles fizeram internamente no PT, com a expulsão dos radicais. E agora seguem para a sociedade e outros setores do Estado’’, avalia. Cita como exemplo o controle externo do Judiciário e as tentativas de diminuir as prerrogativas do Ministério Público.Romano também se confessa decepcionado com o comportamento ético de alguns integrantes do governo.
CORREIO BRAZILIENSE — Alguns estudiosos, o senhor entre eles, costumam dizer que o governo Lula tem estratégias para dominar o Estado e a opinião pública... Essa avaliação não é exagerada? Se não for, como se dá esse domínio? E com qual objetivo?
ROBERTO ROMANO — As tentativas de controlar o Estado e a opinião pública não se localizam em todo o governo. Mas em determinados setores formados pelo stalinismo, como o chefe da Casa Civil (José Dirceu). Outros integrantes se formaram na tradição centralista, a exemplo de ex-trotskistas como o Palocci (Antonio Palocci, ministro da Fazenda). Para os dois setores, são ilógicos o debate, a consulta, o contraditório antes de se tomar um rumo político. A direção é a única encarregada de pensar, agir, voltar atrás, etc. É a antiga estratégia de tudo dirigir do alto, da cúpula. José Genoino (presidente nacional do PT) possui a mesma formação. Ninguém muda subitamente uma forma de agir e de pensar nem arranca hábitos como se fossem paletós fora de moda. Essas alas do PT tentam enfeitar o próprio discurso com piruetas à democracia. Mas a forma de sua atividade traz a marca do centralismo. A rigidez no comando não é contraditória com a flexibilidade nas decisões, sobretudo se estas últimas favorecerem a expansão do poder dos líderes. Lembre-se que o Partido Comunista oscilava num pêndulo permanente de apoio ou recusa aos governos. A recusa a Getúlio Vargas e o apoio depois ao mesmo governante é um exemplo.
CORREIO — E em relação à população...
ROBERTO ROMANO — Bem, o controle da opiniões começa no interior do partido, com a expulsão dos ‘radicais’, e segue para a sociedade e outros setores do Estado. O controle externo do Judiciário, as tentativas de diminuir as prerrogativas do Ministério Público, o Conselho de Jornalismo, a censura aos filmes com base num conceito de ética e de valores familiares dignos da Era Vargas, tudo configura um controle gradativo das instituições pelo poder Executivo. Some-se o abuso das medidas provisórias que aposenta o Congresso Nacional (com a conivência dos parlamentares, diga-se) de sua função precípua, a de legislar, e temos a figura que está muito longe do Estado democrático de direito. Cada um dos ítens arrolados não elimina a democracia, mas a sua soma traz uma clara mensagem: o autoritarismo aumenta, sobretudo se forem adicionados o carisma do presidente e o seu vezo de se considerar pai do povo. Demagogia e centralismo dão-se as mãos, como em episódios anteriores da história mundial e brasileira. Os resultados são previsíveis, mas boa parte dos intelectuais, da mídia, do clero, prefere fazer vistas grossas. A crítica sempre é louvada depois que o furacão do poder causou danos irreparáveis. Mas ela é sempre acolhida com suspeitas pelos bajuladores da hora.
CORREIO — Então, o governo Lula tem tendências monocratas?
ROBERTO ROMANO — Os principais dirigentes do governo desejam a monocracia. Se existem teses não abandonadas pelo atual ocupante do Planalto como bravatas, uma delas é a que ele declarou em antiga entrevista: ‘‘Acho que a liberdade individual está subordinada à liberdade coletiva. Na medida em que você cria parâmetros aceitos pela coletividade, o individualismo desaparece’’. E a pérola que ainda norteia os gestos do presidente e de seus auxiliares é retratada numa entrevista dada por ele no final de 1985: ‘‘Não achamos que Parlamento é (sic) um fim, ele é um meio. E vamos tentar utilizá-lo até onde for possível. Na medida em que a gente perceber que pela via parlamentar, pela via puramente eleitoral, você não conseguirá o poder, eu assumo a responsabilidade de dizer à classe trabalhadora que ela tem que procurar outra via’’.
CORREIO — O presidente Lula foi cooptado pelas elites? Aliás, o que isso quer dizer: fazer o jogo da direita? Esquecer temas caros à esquerda, como a redução das desigualdades sociais?
ROBERTO ROMANO — O presidente, como seus auxiliares, pertence à elite sindical cujo projeto inclui a própria ascensão social no jogo das negociações com os setores da elite verdadeira, a econômica e política. Ele acostumou-se aos tratos com empresários e oligarcas, o que lhe concede a desenvoltura para as tratativas com (o senador) Antonio Carlos Magalhães (PFL-BA) e outros representantes das oligarquias que sempre estiveram no poder, desde a Colônia. Ao mesmo tempo em que se preparou para o diálogo com os segmentos superiores, o presidente e seus partidários espalharam profusamente mitos sobre a sua origem humilde, seu período de prisão, etc. Hoje, o seu governo não faz o jogo da direita, mas o da sua própria segurança no mando. Depois de chegar ao Planalto é preciso guardá-lo por longo tempo (a receita encontra-se em Maquiavel, seguido no grupo que responde pelo governo), a partir de 2006. Daí, seguem-se todas as reformas favoráveis ao controle e negação de direitos dos que residem nos setores dominados ou na classe média. A esquerda brasileira sempre padeceu de oficialismo. Ela odeia estar na oposição, adora os gabinetes. A sua espinha é a mais flexível e o seu oportunismo é por demais evidente, sendo seu namoro com poderosos arbitrários a fonte de sua essência: ela é descartável.
CORREIO — Dentro dessa linha: quem criticava o PT, hoje o elogia; quem o defendia, hoje o ataca. O que mudou: o PT? Ou mudaram os brasileiros, os eleitores?
ROBERTO ROMANO — O PT não mudou, pelo menos não mudou o PT de origem stalinista. Ele continua rígido como sempre, dogmático como sempre, virulento como sempre. Mas como disse acima, a rigidez em relação aos dirigidos combina perfeitamente com a flexibilidade nas negociações e alianças que possibilitam a presença direta ou indireta nas bases de poder para os dirigentes. Uma boa notícia é que os brasileiros mudaram e amadureceram. As derrotas do PT em São Paulo e Porto Alegre mostram que eleitores nacionais não aceitam propagandas enganosas (como as produzidas por Duda Mendonça e seus colegas), chantagens (feitas na campanha de Marta Suplicy) ou promessas mirabolantes. O eleitorado patrício amadureceu. Pena que os políticos (de todos os partidos) não sigam esta tendência. O foro privilegiado por eles perpetrado é prova de que não merecem os eleitores que hoje surgem. Mas logo eles sentirão as conseqüências, nas urnas.
CORREIO — E em relação à política econômica...
ROBERTO ROMANO — O debate sobre a política econômica tem sido mal conduzido. Não se trata, no meu entender, de seguir célere para a ruptura com o FMI ou de abaixar os juros de uma noite para outra. Temas como o Alca precisam ser analisados em profundidade. Em geral, a política externa do governo tem sido competente. A escolha de José de Alencar para a Defesa foi uma saída correta no caso dos choques entre civis e Forças Armadas. Claro que relações exteriores e defesa nacional têm tudo a ver com a economia. Um país sem economia forte e própria é indefeso, em todos os sentidos. O criticável no governo é a radicalização do modelo FHC, sem a competência no campo social. Do desastre causado por Benedita da Silva aos trancos do Fome Zero, passando pela morosidade no campo, o autoritarismo incompetente é o lado que se contrapõe à política macroeconômica. Tem razão quem anuncia a ingovernabilidade se o governo optar pela ruptura absoluta com o modelo econômico anterior. A memória histórica (lembre-se do Chile de Allende) traz casos de fracasso quando as políticas ortodoxas foram desafiadas. Mas seria preciso um balanceamento certa entre a ortodoxia e mudanças sociais. Tudo mostra que o governo se mantém apenas pelo apoio ao capital financeiro, sem uma política adequada para os segmentos negativamente privilegiados da população. Neste sentido, a política de ciência e tecnologia, sobretudo no CNPq e demais órgãos a ele conectados, é uma brilhante tentativa de modificar o marasmo governamental.
CORREIO — O PT, na oposição, sempre julgou-se mais puro e ético que os demais partidos. Mas agora, no poder, como eticamente os integrantes deste governo têm se comportado?
ROBERTO ROMANO — Da pior forma. A entrevista do líder do governo na Câmara dos Deputados (Professor Luizinho) sobre as investigações da Polícia Federal e a sua retratação posterior, mostram que a flexibilidade ética tem sido o padrão do governo. O comportamento realista dos dirigentes do PT (no caso da eleição em Salvador, e em Fortaleza sobretudo) causa no mínimo estranheza. O flerte com Paulo Maluf na eleição paulistana foi uma dose excessiva para os militantes e simpáticos ao PT. Na verdade, vale para aquela agremiação o dito de Elias Canetti: ‘‘Nunca vi um homem deblaterando contra o poder, sem o desejo secreto de possuí-lo’’. As máscaras da ética caíram. Aparece a face nua do realismo que joga, hoje, o PT nos braços de ACM, do PMDB e de outras vertentes nacionais. Lamentável, mas é assim. Torna-se melhor não chorar nem zombar, mas compreender.
As máscaras da ética caíram. Aparece a face nua do realismo que joga, hoje, o PT nos braços de ACM e do PMDB
Roberto Romano, professor da Unicamp
Fonte: Correio Braziliense
Professor da Unicamp critica comportamento ético do governo e denuncia tentativas de controle da sociedade
O filósofo Roberto Romano , professor titular de ética e de filosofia política da Universidade de Campinas (Unicamp), 58 anos, foi mais um daqueles seminaristas que, nas décadas de 60 e 70, militavam ativamente nos movimentos de esquerda. Por conta disso, foi preso e passou por constrangimentos — mas não se abalou. Afastou-se da batina e foi continuar a luta no meio acadêmico. Lá, reciclou conceitos e hoje é um dos maiores críticos do governo Luiz Inácio Lula da Silva. Acha que alguns petistas do governo — ‘‘os de origem stalinista’’ — tentam controlar o Estado. ‘‘Eles fizeram internamente no PT, com a expulsão dos radicais. E agora seguem para a sociedade e outros setores do Estado’’, avalia. Cita como exemplo o controle externo do Judiciário e as tentativas de diminuir as prerrogativas do Ministério Público.Romano também se confessa decepcionado com o comportamento ético de alguns integrantes do governo.
CORREIO BRAZILIENSE — Alguns estudiosos, o senhor entre eles, costumam dizer que o governo Lula tem estratégias para dominar o Estado e a opinião pública... Essa avaliação não é exagerada? Se não for, como se dá esse domínio? E com qual objetivo?
ROBERTO ROMANO — As tentativas de controlar o Estado e a opinião pública não se localizam em todo o governo. Mas em determinados setores formados pelo stalinismo, como o chefe da Casa Civil (José Dirceu). Outros integrantes se formaram na tradição centralista, a exemplo de ex-trotskistas como o Palocci (Antonio Palocci, ministro da Fazenda). Para os dois setores, são ilógicos o debate, a consulta, o contraditório antes de se tomar um rumo político. A direção é a única encarregada de pensar, agir, voltar atrás, etc. É a antiga estratégia de tudo dirigir do alto, da cúpula. José Genoino (presidente nacional do PT) possui a mesma formação. Ninguém muda subitamente uma forma de agir e de pensar nem arranca hábitos como se fossem paletós fora de moda. Essas alas do PT tentam enfeitar o próprio discurso com piruetas à democracia. Mas a forma de sua atividade traz a marca do centralismo. A rigidez no comando não é contraditória com a flexibilidade nas decisões, sobretudo se estas últimas favorecerem a expansão do poder dos líderes. Lembre-se que o Partido Comunista oscilava num pêndulo permanente de apoio ou recusa aos governos. A recusa a Getúlio Vargas e o apoio depois ao mesmo governante é um exemplo.
CORREIO — E em relação à população...
ROBERTO ROMANO — Bem, o controle da opiniões começa no interior do partido, com a expulsão dos ‘radicais’, e segue para a sociedade e outros setores do Estado. O controle externo do Judiciário, as tentativas de diminuir as prerrogativas do Ministério Público, o Conselho de Jornalismo, a censura aos filmes com base num conceito de ética e de valores familiares dignos da Era Vargas, tudo configura um controle gradativo das instituições pelo poder Executivo. Some-se o abuso das medidas provisórias que aposenta o Congresso Nacional (com a conivência dos parlamentares, diga-se) de sua função precípua, a de legislar, e temos a figura que está muito longe do Estado democrático de direito. Cada um dos ítens arrolados não elimina a democracia, mas a sua soma traz uma clara mensagem: o autoritarismo aumenta, sobretudo se forem adicionados o carisma do presidente e o seu vezo de se considerar pai do povo. Demagogia e centralismo dão-se as mãos, como em episódios anteriores da história mundial e brasileira. Os resultados são previsíveis, mas boa parte dos intelectuais, da mídia, do clero, prefere fazer vistas grossas. A crítica sempre é louvada depois que o furacão do poder causou danos irreparáveis. Mas ela é sempre acolhida com suspeitas pelos bajuladores da hora.
CORREIO — Então, o governo Lula tem tendências monocratas?
ROBERTO ROMANO — Os principais dirigentes do governo desejam a monocracia. Se existem teses não abandonadas pelo atual ocupante do Planalto como bravatas, uma delas é a que ele declarou em antiga entrevista: ‘‘Acho que a liberdade individual está subordinada à liberdade coletiva. Na medida em que você cria parâmetros aceitos pela coletividade, o individualismo desaparece’’. E a pérola que ainda norteia os gestos do presidente e de seus auxiliares é retratada numa entrevista dada por ele no final de 1985: ‘‘Não achamos que Parlamento é (sic) um fim, ele é um meio. E vamos tentar utilizá-lo até onde for possível. Na medida em que a gente perceber que pela via parlamentar, pela via puramente eleitoral, você não conseguirá o poder, eu assumo a responsabilidade de dizer à classe trabalhadora que ela tem que procurar outra via’’.
CORREIO — O presidente Lula foi cooptado pelas elites? Aliás, o que isso quer dizer: fazer o jogo da direita? Esquecer temas caros à esquerda, como a redução das desigualdades sociais?
ROBERTO ROMANO — O presidente, como seus auxiliares, pertence à elite sindical cujo projeto inclui a própria ascensão social no jogo das negociações com os setores da elite verdadeira, a econômica e política. Ele acostumou-se aos tratos com empresários e oligarcas, o que lhe concede a desenvoltura para as tratativas com (o senador) Antonio Carlos Magalhães (PFL-BA) e outros representantes das oligarquias que sempre estiveram no poder, desde a Colônia. Ao mesmo tempo em que se preparou para o diálogo com os segmentos superiores, o presidente e seus partidários espalharam profusamente mitos sobre a sua origem humilde, seu período de prisão, etc. Hoje, o seu governo não faz o jogo da direita, mas o da sua própria segurança no mando. Depois de chegar ao Planalto é preciso guardá-lo por longo tempo (a receita encontra-se em Maquiavel, seguido no grupo que responde pelo governo), a partir de 2006. Daí, seguem-se todas as reformas favoráveis ao controle e negação de direitos dos que residem nos setores dominados ou na classe média. A esquerda brasileira sempre padeceu de oficialismo. Ela odeia estar na oposição, adora os gabinetes. A sua espinha é a mais flexível e o seu oportunismo é por demais evidente, sendo seu namoro com poderosos arbitrários a fonte de sua essência: ela é descartável.
CORREIO — Dentro dessa linha: quem criticava o PT, hoje o elogia; quem o defendia, hoje o ataca. O que mudou: o PT? Ou mudaram os brasileiros, os eleitores?
ROBERTO ROMANO — O PT não mudou, pelo menos não mudou o PT de origem stalinista. Ele continua rígido como sempre, dogmático como sempre, virulento como sempre. Mas como disse acima, a rigidez em relação aos dirigidos combina perfeitamente com a flexibilidade nas negociações e alianças que possibilitam a presença direta ou indireta nas bases de poder para os dirigentes. Uma boa notícia é que os brasileiros mudaram e amadureceram. As derrotas do PT em São Paulo e Porto Alegre mostram que eleitores nacionais não aceitam propagandas enganosas (como as produzidas por Duda Mendonça e seus colegas), chantagens (feitas na campanha de Marta Suplicy) ou promessas mirabolantes. O eleitorado patrício amadureceu. Pena que os políticos (de todos os partidos) não sigam esta tendência. O foro privilegiado por eles perpetrado é prova de que não merecem os eleitores que hoje surgem. Mas logo eles sentirão as conseqüências, nas urnas.
CORREIO — E em relação à política econômica...
ROBERTO ROMANO — O debate sobre a política econômica tem sido mal conduzido. Não se trata, no meu entender, de seguir célere para a ruptura com o FMI ou de abaixar os juros de uma noite para outra. Temas como o Alca precisam ser analisados em profundidade. Em geral, a política externa do governo tem sido competente. A escolha de José de Alencar para a Defesa foi uma saída correta no caso dos choques entre civis e Forças Armadas. Claro que relações exteriores e defesa nacional têm tudo a ver com a economia. Um país sem economia forte e própria é indefeso, em todos os sentidos. O criticável no governo é a radicalização do modelo FHC, sem a competência no campo social. Do desastre causado por Benedita da Silva aos trancos do Fome Zero, passando pela morosidade no campo, o autoritarismo incompetente é o lado que se contrapõe à política macroeconômica. Tem razão quem anuncia a ingovernabilidade se o governo optar pela ruptura absoluta com o modelo econômico anterior. A memória histórica (lembre-se do Chile de Allende) traz casos de fracasso quando as políticas ortodoxas foram desafiadas. Mas seria preciso um balanceamento certa entre a ortodoxia e mudanças sociais. Tudo mostra que o governo se mantém apenas pelo apoio ao capital financeiro, sem uma política adequada para os segmentos negativamente privilegiados da população. Neste sentido, a política de ciência e tecnologia, sobretudo no CNPq e demais órgãos a ele conectados, é uma brilhante tentativa de modificar o marasmo governamental.
CORREIO — O PT, na oposição, sempre julgou-se mais puro e ético que os demais partidos. Mas agora, no poder, como eticamente os integrantes deste governo têm se comportado?
ROBERTO ROMANO — Da pior forma. A entrevista do líder do governo na Câmara dos Deputados (Professor Luizinho) sobre as investigações da Polícia Federal e a sua retratação posterior, mostram que a flexibilidade ética tem sido o padrão do governo. O comportamento realista dos dirigentes do PT (no caso da eleição em Salvador, e em Fortaleza sobretudo) causa no mínimo estranheza. O flerte com Paulo Maluf na eleição paulistana foi uma dose excessiva para os militantes e simpáticos ao PT. Na verdade, vale para aquela agremiação o dito de Elias Canetti: ‘‘Nunca vi um homem deblaterando contra o poder, sem o desejo secreto de possuí-lo’’. As máscaras da ética caíram. Aparece a face nua do realismo que joga, hoje, o PT nos braços de ACM, do PMDB e de outras vertentes nacionais. Lamentável, mas é assim. Torna-se melhor não chorar nem zombar, mas compreender.
As máscaras da ética caíram. Aparece a face nua do realismo que joga, hoje, o PT nos braços de ACM e do PMDB
Roberto Romano, professor da Unicamp
Fonte: Correio Braziliense