sexta-feira, 23 de julho de 2010

O Globo.

Suborno

Comandante da PM se diz envergonhado com policiais que teriam pedido dinheiro para liberar atropelador de Rafael Mascarenhas

Publicada em 23/07/2010 às 23h51m

Gustavo Goulart


RIO - "Estou estarrecido e envergonhado", disse o comandante-geral da Polícia Militar, coronel Mário Sérgio Duarte, logo após ler o depoimento de Roberto Bussanra , pai do atropelador de Rafael Mascarenhas. na noite desta sexta-feira. O militar confirmou que vai pedir ainda esta noite à Justiça Militar a prisão preventiva dos dois policiais que abordaram e liberaram em troca de dinheiro Rafael Bussanra, que atropelou Rafael Mascarenhas, filho da atriz Cissa Guimarães, no Túnel Acústico, na Zona Sul.

Mário Sérgio revelou que o depoimento é bastante detalhado e que é de estarrecer qualquer um que o leia. Ele afirmou que embora esteja envergonhado com a atitude de seus comandados não está estático: "Estou agindo para que esta atitude deplorável não fique impune. Eles serão presos", garantiu o comandante da PM.

A denúncia de que policiais militares achacaram o atropelador do jovem Rafael Mascarenhas, para liberar seu carro, provocou indignação entre representantes de diversos setores da sociedade. Para Milton Corrêa da Costa, tenente-coronel da reserva da PM, esse crime envergonha a corporação.

- A gravidade do crime praticado pelos dois policiais militares envergonha e demonstra a existência de $ícios de uma banda podre, que precisa ser expurgada da instituição. Mais dois traidores da sociedade imaginaram acobertar um homicídio no trânsito, em troco da vantagem pecuniária. Inaceitável, triste e chocante para toda a sociedade, que precisa confiar na sua polícia. Como bem disse o comandante-geral da Polícia Militar (coronel Mário Sérgio Duarte): "É necessário cortar na própria carne" - comentou.

" É um padrão de barbárie, de selvageria, um atentado ao estado de direito e à segurança do cidadão "

Já para Roberto Romano, professor de ética pública e filosofia política da Unicamp, o caso demonstra um "padrão de barbárie, de selvageria".

- Se confirmada a acusação, teremos dois pontos gravíssimos que marcam a vida brasileira. O trânsito no Brasil tem a ética mais violenta do planeta, é indisciplinado. E, se a polícia se torna conivente em troca de dinheiro, aí temos a constatação de que estamos perdendo todos os valores morais. É um fato muito ruim em termos de vida pública. É um padrão de barbárie, de selvageria, um atentado ao estado de direito e à segurança do cidadão - afirmou Romano.

Para o acadêmico, os impostos públicos estão sendo mal empregados.

- Você paga impostos para que quem desrespeita as leis seja punido e que isso represente uma ordem social. Então, com a confirmação dessa denúncia, ficará constatado que estamos muito mal.

O professor de sociologia da UFRJ Michel Misse disse que o problema é antigo na polícia.

- Não há novidade nenhuma nisso. Acusação de corrupção na polícia é coisa antiga. Parecia que o problema estava sendo contido, mas, pelo visto, continua - disse.

Para sociólogo, sai um (PM expulso), entra outro

Michel Misse lembrou que a quantidade de policiais militares que são expulsos da corporação por desvios de conduta, como achaque, é enorme, e que a carteira do policial está sendo usada para fins mercadológicos.

- Existem filmes desde a década de 1950 que tratam disso. Primeiro foi o envolvimento de policiais com o jogo do bicho. Depois, com o tráfico de drogas. Isso não tem a ver com ética. Tem a ver com crime. A acusação é apenas o iníico de um processo. A quantidade de PMs expulsos é enorme. O problema é que sai um e entra outro. A carteira do policial passa a ser usada como mercadoria política. Ela impõe uma transação com base na troca, na extorsão.