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Sabe aquele motorista mal educado, que não dá seta antes de mudar de faixa e vai colocando o carro dele à frente do seu, sem o menor respeito? Até mesmo ele, por um costume pra lá de estranho, emparelha ao seu lado e avisa que sua porta está semi-aberta (mesmo que não haja registro de porta que se tenha aberto sozinha, com o automóvel em movimento).
Trata-se de gentileza quase sem fundamento. Ao menos, pouco importante diante da barbárie que é o trânsito das grandes cidades. Coisa parecida com o que significa o ato de jogar a bola para fora, quando o adversário no futebol precisa de tratamento médico. Afinal, o mesmo atleta que protagoniza atitude tão nobre aplica carrinhos maldosos durante a partida, simula pênaltis e pede cartões ao jogador da outra equipe, mesmo que ele não mereça.
Nem sempre o olhar viciado de quem trabalha com futebol diariamente consegue traduzir algumas coisas que acontecem no campo. Por isso, achei interessante a visão do professor de ética e filosofia Roberto Romano, da Universidade de Campinas. Fiz a ele três perguntas:
O desrespeito ao Fair Play nos campos de futebol mostra que a ética no esporte é frágil?
O que é Fair Play? É jogo justo, jogo bonito. Significa aquilo que é honesto e aquilo que é belo. Se os jogadores pecam por um lado, pecam por outro também. O que estamos assistindo nos últimos tempos, nos campos brasileiros, é uma deselegância cada vez maior. Portanto, uma perda da beleza do jogo e até do incentivo para a torcida ir ao estádio. Porque a competição a qualquer custo vira pancadaria e diminui a atratividade do espetáculo futebol.
Jogar a bola para fora, com o adversário caído, é fundamental para um jogo limpo?
Considero uma elegância desnecessária. Porque o elegante é você não dar carrinho. Não torcer o tornozelo do outro. Não ficar na banheira para ter vantagem num lance. Não simular um pênalti. Se você faz tudo isso, mas joga a bola para fora, supostamente promovendo justiça, você simplesmente não fez nada. A trapaça transforma o jogo em feio, por mais que pareça algo pouco nocivo. Isso desagrada o desejo mais íntimo do espectador. Trata-se de falta de ética e estética.
O árbitro deve tomar atitudes mais veementes contra a falta de Fair Play? Ou a existência de ética em campo é algo que depende exclusivamente dos atletas?
Juiz e árbitro têm encargos diferentes. O juiz tem uma lei que deve aplicar. O árbitro tem liberdade de interpretar as regras e, por isso, sua responsabilidade é maior. Os dois times confiam no seu juízo. Se ele não exerce sua autoridade no momento exato, evidentemente que estraga toda a partida e cria uma animosidade que não deveria existir no esporte. Efetivamente, é preciso que os árbitros assumam com maior força sua autoridade e, por isso, sejam respeitados pelos jogadores em campo.