Uma mudança radical no sistema de recursos judiciais está na cabeça do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Cezar Peluso. Uma proposta que, se levada adiante e der certo, visa diminuir radicalmente a impunidade, acabar com a proliferação de recursos para os tribunais superiores e encurtar drasticamente o andamento dos processos.
Peluso já adiantou ao ministro da Justiça do governo Dilma Rousseff, José Eduardo Cardozo, que vai trabalhar para mudar a Constituição e estabelecer que todos os processos terminariam depois de julgados pelos tribunais de Justiça ou pelos tribunais regionais federais. Os recursos ao Superior Tribunal de Justiça e ao STF serviriam apenas para tentar anular a decisão, mas enquanto não fossem julgados, a pena seria cumprida.
"O Brasil é o único País do mundo que tem na verdade quatro instâncias recursais", afirmou Peluso em entrevista ao Estado. Boa parte da polêmica em torno da Lei da Ficha, disse o ministro, estaria resolvida. Os críticos da lei afirmam que viola o princípio da inocência a previsão de que estão inelegíveis os políticos condenados por órgãos colegiados, como tribunais de justiça, mesmo que ainda haja recursos pendentes no STJ e no STF. Se os processos terminarem na segunda instância, essa discussão acabaria. Mas o presidente adianta que espera forte resistência: "Pode escrever que isso terá a resistência dos advogados. Pode ter certeza."
Se o senhor tivesse que tomar duas decisões para melhorar a Justiça, quais seriam?
Não existe uma coisa só que se resolvida solucionaria todo o problema do Judiciário. Há vários pontos de estrangulamento. A celeridade é importante, mas não a levo às últimas consequências como a coisa mais importante.
Por quê?
Primeiro porque o problema do retardamento dos processos não é uma coisa tipicamente brasileira. Nós temos estatísticas da Europa, particularmente Portugal, Espanha, Itália, e também nos países anglo-saxões. A Justiça tem certa ritualidade que implica tempo. O que não pode haver são esses casos absurdos de processos que passam de gerações. Mas isso envolve outro problema que é objeto de grande preocupação nossa e queremos celebrar um novo pacto republicano para resolver isso.
Que problema?
É o problema dos graus de instâncias recursais. O Brasil é o único País do mundo que tem na verdade quatro instâncias recursais. O Supremo funciona como quarta instância. Acho que precisamos acabar com isso.
Como?
Uma proposta que já fiz, inclusive para o próximo ministro da Justiça, é transformar os recursos especiais (recursos para o STJ) e extraordinários (recursos para o STF) em medidas rescisórias. A decisão transita em julgado e o sujeito entra com recurso que será examinado como ação rescisória (serviria para posteriormente anular a decisão). Se tirássemos o caráter recursal, que suspende a eficácia da decisão e leva toda a matéria para ser discutida nos tribunais superiores, os tribunais decidiriam e o processo estaria transitado em julgado. A admissibilidade do recurso especial e extraordinário não impediria o trânsito em julgado.
Qual é a consequência disso?
Isso acabaria, se você pensar, com o problema da ficha limpa. Não precisaria ficar discutindo se a lei ofende ou não ofende o princípio da inocência (de que ninguém é considerado culpado até o trânsito em julgado do processo). Isso acaba com o uso dos tribunais superiores (STJ e STF) como fator de dilação (de demora) do processo. Enquanto o processo não transita em julgado, ninguém faz nada e o tempo vai passando. O Supremo não consegue julgar isso rapidamente. E mais: isso valoriza os tribunais locais. O que eles decidirem, está decidido. Acaba com o assunto. Quem tiver razão, tenta rescindir a decisão.
Precisaria de um filtro para essas ações rescisórias?
Pode manter a repercussão geral. Alguns recursos não seriam admitidos. Mas não precisaria de um filtro adicional. O filtro estaria no próprio mecanismo de julgamento. Teremos causas que serão liquidadas pelos tribunais locais. Isso seria sensível para a população.
O sr. vai encampar essa proposta?
Eu vou propor isso. Ainda vou deixar isso amadurecer na cabeça dos outros. Na minha, isso já está muito assentado.
Por que precisa pensar mais?
Pode escrever que isso terá a resistência dos advogados. Pode ter certeza. Eu estava conversando com o ministro (José Eduardo Cardozo) e ele disse que nós podemos criar uma estratégia de discussão para convencer a opinião pública. É preciso mostrar para a opinião pública que esse é um avanço substancial.
O que seria necessário?
Precisaria de uma PEC (proposta de emenda à Constituição), porque vai mexer na disciplina constitucional. Mas se nós colocarmos no Pacto Republicano, com o apoio do governo e do Legislativo, nós vamos deixar esse pessoal gritando à vontade e sem nenhum argumento, porque em quase todos os países é assim mesmo.
Isso acabaria com a história de que quem tem dinheiro contrata um bom advogado para tentar mudar a decisão no STF ou adiar o julgamento até que o processo prescreva?
Esse é um dos subprodutos desse negócio. Para chegar aos tribunais de Justiça não precisa gastar muito.
Mas o CNJ, em outras gestões, apontou problemas envolvendo decisões dos juízes na primeira instância e dos tribunais de justiça. Isso atrapalha?
Isso é um exagero. Qual a taxa de provimento de recursos nos tribunais superiores (contra decisões das dos juízes e dos tribunais de justiça)? É baixíssima. E mais: onde há taxa um pouco mais elevada de provimento é em questão de habeas corpus.
Por que isso acontece?
Isso não é tanto porque os juízes queiram alterar as decisões do STF. É porque os juízes não recebem as decisões do Supremo. Eles tomam conhecimento da jurisprudência do STF quando recebem a nossa revista (de jurisprudência) três anos depois da decisão.
O sr. defende que as decisões do STF tenham maior influência sobre os demais juízes?
Eu acho que deveríamos caminhar para uma certa vinculatividade das decisões do Supremo e dos tribunais superiores em relação ao juízo. Os juízes dizem que isso tira a liberdade deles. Tira nada! Porque são eles que constroem as questões que chegam ao STF. Quando a causa chega aqui, os juízes já decidiram, os advogados já discutiram, o Ministério Público já se manifestou. Precisamos abdicar um pouco da falsa ideia de que precisa de liberdade exagerada. Quando o os tribunais superiores fixarem a tese, não tem mais motivo para ficar discutindo.
Que avaliação o senhor faz deste primeiro ano na presidência?
Foi um ano muito bom tanto para o Supremo quanto para o Conselho Nacional de Justiça. O mais importante: acho que nós conseguimos, no Rio de Janeiro, uma coisa inédita, um momento importantíssimo do ponto de vista da história do Judiciário brasileiro e do sistema de segurança, que foi o acordo que nos permitiu colocar órgãos jurisdicionais (como juízes, defensoria pública e Ministério Público) e extrajudiciais (como cartórios) nas Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs).
Mas isso vai para todas as UPPs?
Todas. A UPP vai passar a ser um centro que reunirá a polícia militar, a polícia civil, o apoio das Forças Armadas, e terá mais a presença do Judiciário. Pela primeira vez a gente está com a esperança que as UPPs, com essa nova configuração mais heterogênea, exercerão papel importante, não apenas na pacificação, no sentido de acabar com a violência, mas também de promover aquelas comunidades. Se der certo, considero a coisa mais importante que o Judiciário fez no Brasil nos últimos 20 a 30 anos. Isso para mim já seria suficiente.
Isso pode ser difundido para o Brasil?
Sim. É um tipo de mecanismo para grandes centros. Nas pequenas cidades, funciona bem. Nos grandes centros há áreas não ocupadas pelo estado onde floresce o crime, a violência, conflitos sociais.
O STF não decidiu o destino da Ficha Limpa? Não foi ruim para o tribunal?
Não acho que fique mal. Foi uma coisa inevitável. Foi um processo de uma lei aprovada praticamente às vésperas da eleição, que provocou processos que demoram um tempo também às vésperas da eleição e esses processos ainda não chegaram ao STF. O Supremo não pode fazer nada. Nós discutimos só uma alínea de um artigo. Existem várias alíneas de vários artigos questionados. No ano que vem, esses processos vão subir (do TSE para o STF) e o Supremo vai decidir.
E por que o sr. não quis desempatar o julgamento?
Não quis usar o voto de qualidade (de desempate) porque os mesmos ministros que aprovaram a emenda regimental me dando esse poder, como estavam muito apaixonados, não queriam que eu usasse. Eu ia ter que impor uma decisão e isso realmente parecia um ato de despotismo. Não vou afirmar minha autoridade pelo mero prazer de afirmar a autoridade.
O Brasil foi condenado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos por não ter punidos os responsáveis por mortes na Guerrilha do Araguaia. O STF disse que esses crimes estão anistiados. Que decisão o Estado deve cumprir?
Se o país deve cumprir ou não (a decisão da CIDH), responde o chefe do Estado brasileiro. Mas há algumas coisas que são indiscutíveis. Primeiro: a Corte Interamericana não é instância revisora do STF. Eles não têm competência nem função de rever as decisões do Supremo. A nossa decisão não fica sujeita ao reexame deles. Nossa decisão no plano interno continua tão válida quanto antes. Morreu o assunto.
Mas e no plano internacional?
O que se passa no plano internacional, e acho que o editorial do Estadão foi preciso, é que o Estado brasileiro assinou um tratado internacional e concorda com que a Corte decida, mas é uma decisão que tem mais caráter político do que jurisdicional. Em nenhuma cláusula do tratado há menção de que as decisões da Corte Interamericana se sobrepõem ou modificam as nossas decisões internas.
Como compatibilizar as duas decisões?
Se o presidente da República resolver indenizar as famílias (de mortos durante a Guerrilha do Araguaia), não há problema. Mas se abrirem um processo jurisdicional contra qualquer um que o Supremo considerou anistiado, o tribunal mata na hora. A população brasileira pode dormir tranquila quanto a isso.
O que está por trás da decisão?
Há interesses ideológicos. Não tenho nada contra. Mas cada país tem sua cultura e sua maneira de acertar as contas com o passado. Na África do Sul fizeram de um jeito, na Argentina fizeram de outro. Cada um sabe o que faz. Há muita pressão ideológica e de grupos pequenos. Nenhum de nós concorda com as atrocidades que foram cometidas. Agora, o que podemos fazer hoje? Todas as ações, penais e civis, estão prescritas.
Alega-se que foram crimes de lesa humanidade e, por isso, imprescritíveis.
A nossa Constituição, a partir de 88, disse que não prescreve. O que ficou para trás está prescrito. Se fosse hoje, não prescreveria. Não posso usar a Constituição para retroagir. Está tudo prescrito. Não temos o que fazer.
Como o sr. avalia a decisão do STF?
Eu acho pessoalmente que o STF deu uma decisão importante para pacificação da sociedade. É muito justo que se procure apurar autoria, responsabilidades, para prevenir futuras coisas. Mas do ponto de vista dos interesses superiores da sociedade, o STF deu uma contribuição importante. As Forças Armadas ainda poderiam se ressentir de certas coisas...
Se ressentir como?
Assim como há pessoas favoráveis a isso (punir torturadores da ditadura), há outras que acham que isso deve estar definitivamente enterrado. Na medida em que um sobe a voz, o outro também sobe. Aí, vamos numa escalada que não é boa para ninguém.
Poderia haver uma reação militar?
Não sei o que poderia acontecer. Sei que o que o STF fez foi muito bom.
A falta de um ministro desde agosto não atrapalhou o tribunal?
Acho que isso é uma eventualidade. Podia acontecer se o quorum estivesse completo e um ministro se desse por impedido. Deu-se muita atenção ao fato do 11º não ter sido indicado. Mas não há nada de preocupante.
Alguns processos teriam outra solução se o tribunal estivesse completo. Isso não traz insegurança?
Isso podia acontecer independente de faltar um ministro. São coisas pontuais. Não é regra. Não há nada preocupante.
O ministro Cesar Asfor Rocha foi cotado para a vaga, mas houve críticas por parte do STF. Que conceito o senhor tem dele?
Eu tenho por ele o mesmo conceito que tenho pelos outros juízes. Um bom juiz. Não tenho nada contra.
O presidente Lula deve decidir o destino de Cesare Battisti nos próximos dias. Há chances de o STF ser acionado novamente?
Possibilidade há. O STF disse que o presidente da República tinha que cumprir a decisão a menos que o tratado de extradição com a Itália lhe dessa alternativa. Suponhamos que ele tome uma atitude e alguém diga que o tratado não autoriza essa solução, a Itália poderá entrar com processo. Possibilidade há, mas depende da decisão do presidente.
O sr. enfrentou problemas com os conselheiros quando assumiu o CNJ. Como está agora?
Estamos bem. Evoluímos bem.
O sr. recebeu críticas de ser corporativista.
Circulou uma informação de que o presidente do CNJ é contrário à punição de juízes. Não diria que a informação é ridícula, mas é próxima disso. Não tem ninguém no CNJ e duvido que na magistratura exista outro que teve mais trabalho para a magistratura em termos de disciplina do que eu. Fui juiz auxiliar da Corregedoria do TJ de São Paulo por dois anos. Na corregedoria, eu era encarregado de fazer todos os processos disciplinares contra juízes. Eu fiz tantos processos disciplinares que dois juízes foram para a cadeia. Um deles cumpriu mais de 9 anos de cadeia por crimes cometidos no exercício da função e apurados por mim. O outro tomou uma pena de quatro anos. E mais oito juízes foram mandados embora sem processo crime. Ninguém fez isso no país. E mais: o CNJ aposentou um ministro do STJ e desembargadores do Rio de Janeiro e não foi com base no que o Conselho apurou. Do que eles se valeram? Do inquérito (da Operação Furacão) que preparei por mais de um ano no maior sigilo. Vão dizer que sou contra a punição de juízes? Não dá para desmentir a história. O CNJ na minha gestão puniu tantos juízes como nas outras gestões.
Mas o CNJ, na opinião do sr, está extrapolando?
O que estamos tentando mudar? E acho que já mudou é aquele clima de hostilidade que havia entre os juízes e o CNJ. Os juízes criaram uma hostilidade contra o Conselho. O clima era péssimo. Hoje estamos pacificados. Os juízes aceitam o CNJ e percebem que ele não é uma comissão geral de investigação do tempo da ditadura. A função do Conselho não é essa. Temos que punir os juízes com pudor, com respeito à instituição. Ninguém ganha nada explorando o que há de errado. O que interessa é que quando for o caso, manda o juiz pra rua.
Qual a opinião do sr. sobre as férias dos magistrados?
Eu, particularmente, penso que 60 dias não seria absurdo. Mas a sociedade não aceita isso. Mas existe um segundo problema que atingiu também os advogados. Sem as férias coletivas dos magistrados, os advogados não conseguem tirar férias. Uma solução que seria justa: preserva os 30 dias de férias e estabelece um período de recesso de um 20 dias em que tudo pararia. Aí, os advogados poderiam sair de férias.
Isso acabaria com a possibilidade de vender as férias?
Sim.
O STF condenou neste ano os primeiros parlamentares após a Constituição de 88.
Não digo que isso é uma conquista, porque condenar pessoas não é uma conquista.
Mas ainda não é pouco diante dos escândalos na política?
Não é pouco. Acontece que os processos que chegam ao STF provêm de inquéritos que demoram muito. É uma coisa que queremos corrigir e vai depender também do novo Código de Processo Penal. E depois, há uma série de expedientes na legislação que permitem que advogados mais experientes espichem os processos. Alguns chegam à prescrição. Alguns realmente não são crimes, e o tribunal é obrigado a absolver. E o tribunal julga com o que está nos autos.
O sr. é favor do fim do foro privilegiado?
Eu sou a favor da redução do foro. Não sou a favor do fim do foro. Acho que tem muita gente com foro privilegiado. Podia reduzir um pouco.
Onde está o exagero?
No número. Precisamos dar um tratamento menos generoso para o foro, reduzi-lo para cargos que realmente não podem ficar sem essa proteção. Acabar com o foro privilegiado é algo muito arriscado. Teríamos mais confusão do que benefícios.
Se o STF continuar nesse ritmo de condenações, parlamentares que respondem a processo podem aprovar o fim do foro?
Pode mesmo. Se vai acontecer, não sei.
Que expectativa o sr. tem para o governo Dilma Rousseff?
Estamos esperançosos para que faça um bom governo.
E como vê essa alternância de poder e agora a eleição de uma mulher?
Por enquanto, estamos indo muito bem. O país está crescendo, está aproveitando as oportunidades e condições objetivas externas, estamos com taxa de crescimento entre as maiores do mundo. Estamos indo bem. A área política está mais ou menos pacificada. Estamos no mais longo período de vigência de uma constituição sem incidentes. Os investidores externos confiam no país, acham que há segurança jurídica. Temos todas as condições de melhorar.
Como avalia o governo Lula?
Foi um governo bom. Não se pode dizer que foi um governo ruim. Terá tido algumas coisas que algumas pessoas não gostam, mas na soma geral das realizações foi um governo que avançou. O grande problema nosso, não sei como a presidente vai se comportar com relação a isso, é que precisamos investir em educação. Enquanto a Índia forma por ano 300 mil engenheiros, nós formamos 30 mil.
O sr. é defende o fim das transmissões ao vivo das sessões do STF?
Eu sou adepto. Se dependesse única e exclusivamente de mim, eu tiraria. Mas não é um problema da televisão. Para mim, o sistema é que não é bom. Não é porque transmitir é ruim. É porque o sistema dessa discussão pública é ruim, com ou sem televisão. Qualquer pessoa que propusesse extinguir a transmissão pela televisão seria acusada de crime de lesa pátria e que está pretendendo esconder as coisas da sociedade. É um fato irreversível.
Não está faltando alguém que pacifique esse plenário? Até para evitar os bate-bocas?
Não. Está faltando um sistema que modifique o atual. Isso é um produto do sistema. Em lugar nenhum do mundo, exceto no Brasil, no México e em alguns cantões da Suíça, nenhuma corte constitucional delibera em público.
Por quê?
Por diversos motivos. Vamos começar pelos motivos mais formais. Primeiro: a deliberação em público, como se processa no STF, não permite que a sociedade capte o pensamento da Corte como órgão unitário. Há pensamentos isolados. Isso é ruim. Segundo: o fato de estar exposto ao público e, mais do que isso, a câmeras de televisão altera natural e inapelavelmente o modo de ser das pessoas. Não digo nenhuma novidade. Ninguém canta em público como canta quando está sozinho no chuveiro em casa.
Como é isso?
Eu sei que estou em público, meu comportamento se altera. Se estou sendo julgado pelo público, se estou sendo exposto, eu me altero e não é por que eu queira, mas é por que é da condição humana. O homem tem receio de se expor e usa de mecanismos internos psicológicos de autodefesa que se manifestam de várias formas, inclusive pelas trocas mais ásperas de opiniões. Se estivéssemos numa sala fechada, como as Cortes fazem, discutindo um assunto, eu poderia expor minha opinião em voz baixa.
O debate público não acrescentaria nada. É isso?
Não acrescenta nada. Isso distorce. Nenhum ser humano é capaz de ser pura racionalidade e frieza. Exigir isso do Supremo é uma aberração. É impossível nesse sistema imaginar que alguém consiga pacificar. Não consegue.
Essa forma de decidir não privilegia a transparência e a publicidade?
Transparência é bom? É ótimo. Publicidade é bom? É ótimo. Ao contrário, em termos absolutos, não. Nosso problema não é a publicidade, mas o excesso de publicidade. O que estou tentando fazer. Eu me considero um Dom Quixote. Eu gostaria de reunir no ano que vem aqui uns cinco ou seis presidentes das Cortes mais importantes do mundo num evento que quero dar uma dimensão nacional para eles exporem os sistemas de decisão das cortes para sensibilizar a opinião pública. Se a opinião pública resistir qualquer tentativa de mudar está fadada ao fracasso.