Quinta-feira, 9 de Dezembro de 2010
Iliteracia Matemática exponencial?
Li com alguma atenção o artigo mencionado pelo Carlos Fiolhais no post "Polémica à volta das bactérias com arsénio". Nesse texto, Rosie Redfield, que dirige um laboratório de microbiologia da Universidade de British Columbia, faz uma leitura muito crítica do mediático artigo "A Bacterium That Can Grow by Using Arsenic Instead of Phosphorus", publicado na Science por uma equipa de cientistas da NASA.
É difícil de compreender como se pode apresentar este nível de iliteracia matemática (qualquer aluno do 12º ano deveria saber fazer o cálculo) sem sequer se dar conta da gravidade da ignorância, sobretudo vindo de uma microbióloga responsável por todo um laboratório de investigação e que tenta desmontar um artigo desta importância. Há de facto ainda um longo caminho a percorrer...
6 comments:
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Com uma taxa específica de crescimento de 0.1 dia^{-1}, o tempo de duplicação é de 6.93 dias.
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Não, não é.
Se tivermos 1 unidade no instante 0, temos 1,1 unidades ao fim de um dia, (1,1)^2 unidades ao fim do segundo dia,...(1,1)^7=1,94 unidades ao fim de 7 dias, pelo que 7 dias não chegam. O resultado deve ser um pouco mais de 7 dias.
João Basto -
A concentração de biomassa para o instante t é dada por X=X0*exp(ut)
Onde X0 é a biomassa no instante 0, u a taxa específica de crescimento e t o tempo.
O tempo de duplicação é o tempo para o qual X/X0=2.
Ln(2)/u = tempo de duplicação.
Ln(2)/0.1=6.93 -
Caros João e anónimo,
penso que estão na clássica discussão da diferença entre taxa específica de crescimento e taxa de crescimento percentual discreta.
Se usarmos a primeira, temos X'=uX, pelo que a fórmula do anónimo estaria de facto correcta.
Eu, tal como o João, interpretei que havia um aumento de 0,1=10% por dia, porque é o que se consegue medir de um ponto de vista experimental mais facilmente e porque o erro da investigadora foi o de ter feito 10*10%=100%.
Notem que os dois conceitos são diferentes, o anónimo, se usar a sua fórmula, encontra que ao fim do dia o número de bactérias é de X0e^(0,1)=X0.1,105, o que é um aumento ligeiramente acima de 10% e o que explica a ligeira discrepância dos valores obtidos para o tempo de duplicação.
Cumprimentos,
Filipe Oliveira -
Caro Professor,
muito obrigado pela explicação. Existe alguma relação matemática entre estas duas leis exponenciais?
Obrigado,
João Basto -
Claro que sim, a fórmula do anónimo é o limite contínuo da sua. A sua é: U(t)=U0(1+u)^t.
Imagine agora que a taxa u é ditribuída n vezes ao longo do dia de forma regular. Obter-se-ia
U(t)=U0(1+u/n)^(nt).
Se fizermos n tender para +infinito, o que equivale a dizer que a população cresce a uma taxa de u de forma contínua - é o que o anónimo chama "taxa específica" - obtemos
U(t)=lim U0(1+u/n)^(nt).
É um limite dito notável(!) :
sabemos que lim(1+u/n)^n=e^u,
pelo que se obtém
U(t)= U0e^(ut),
que é a fórmula do anónimo.
Como vê, não é por acaso que 6.93 é um número próximo de 7.27.
Mas note que o foco do post não é sobre este assunto: é sobre a confusão entre crescimento linear e exponencial...