Mudança no Fies derruba ações de universidades
O Estado de S.Paulo
03 Janeiro 2015 | 02h 03
Papéis das empresas de educação caíram no primeiro pregão do ano por causa dos novos critérios para obtenção de crédito estudantil
As empresas de educação iniciaram o ano sob
pressão, por causa das mudanças divulgadas no início da semana para o
Fies, programa do governo para financiar a graduação superior, apesar de
a presidente Dilma Rousseff ter sinalizado prioridade para a educação
na cerimônia de posse.
No primeiro pregão da Bovespa de 2015, as ações da Estácio Participações
e da Kroton figuravam entre as principais perdas do Ibovespa, com queda
de 7,22% e 4,84%, respectivamente, enquanto o Ibovespa, principal
índice da bolsa paulista, recuou 2,99%. Já os papéis da Anima Educação
caíam 5,09%, ao passo que as ações da Ser Educacional perderam 7,4%.
Na segunda-feira, o Ministério da Educação mudou as regras para o Fies,
importante fonte de receita para as companhias. Segundo o analista Tales
Freire, do Bradesco, o programa responde por 49% das receitas totais da
Ser, 44% da Kroton, 40% da Estácio e 38% da Anima.
A partir de agora, os estudantes precisarão tirar no mínimo 450 pontos
no Enem para terem acesso ao benefício, e não poderão zerar a prova de
redação. Além disso, os candidatos não poderão mais receber o benefício
simultâneo do financiamento com recursos do Fies e de bolsa do Prouni. A
exceção vale para bolsa parcial, mas apenas quando ambos os benefícios
se destinarem ao mesmo curso e na mesma instituição de educação
superior.
Segundo os analistas Felipe Silveira e Daniel Liberato, da Coinvalores,
ainda é cedo para mensurar os efeitos das mudanças, embora elas tenham
possível impacto sobre a captação de novos alunos. "Esse setor vem sendo
bem estimulado desde 2011, mas há algumas indicações de que esses
benefícios podem sofrer alterações em um quadro de aperto de despesas do
governo podem sofrer alterações", afirmaram os analistas.
Como a decisão só começa a valer a partir de abril, a preocupação do
mercado é de que o maior nível de exigência para acesso ao Fies possa
dificultar a captação de novos estudantes a partir do segundo semestre
de 2015. A nota mínima de 450 pontos exigida pelo MEC, no entanto, é
considerada baixa. Em 2013, a média nacional dos alunos no Enem ficou
acima dos 500 pontos em todas as áreas do conhecimento.
Na terça-feira, o MEC também instituiu mais controles sobre o Fies,
estabelecendo, entre outras regras, que as empresas com mais de 20 mil
alunos usando empréstimos do Fies poderão vender seus créditos do
programa em um intervalo mínimo de 45 dias. O prazo anterior era de 30
dias.
Em relatório, Freire, do Bradesco, avaliou que as exigências mínimas em
relação ao Enem parecem estar mais relacionadas à padronização de
critérios de financiamento que a um eventual aperto fiscal. "No entanto,
a mudança no calendário para a recompra de crédito do Fies sugere que
poderemos ver o MEC com um orçamento mais apertado e com uma abordagem
mais restritiva financeiramente em 2015", disse.
Estácio, Anima e Ser não comentaram os possíveis impactos das mudanças
em seus negócios. A Kroton disse que ainda está analisando as novas
regras.
Prioridade. As alterações foram anunciadas antes do
discurso da presidente Dilma Rousseff na cerimônia de posse de seu
segundo mandato, quando lançou o novo lema de seu governo, "Brasil,
pátria educadora", sinalizando que a educação será "a prioridade das
prioridades".
"Ao longo deste novo mandato, a educação começará a receber volumes mais
expressivos de recursos oriundos dos royalties do petróleo e do fundo
social do pré-sal. Assim, à nossa determinação política se somarão mais
recursos e mais investimentos", disse Dilma.
Para Liberato, da Coinvalores, o governo deverá dar um foco maior à
educação básica e a creches. "A educação superior não deve ser tão
estimulada quanto nos últimos anos, por mais que os benefícios e os
programas continuem", afirmou. Marco Aurélio Barbosa, analista chefe de
ações da CM Capital Markets, disse que o discurso não trouxe nada de
concreto e teve um tom populista. "O que há, na prática, é a medida
publicada nesta semana".
Estimativa da Federação Nacional das Escolas Particulares aponta que a medida deve reduzir em 20% o número de jovens beneficiados com as políticas educacionais no setor privado. / KARIN SATO, COM REUTERS