sexta-feira, 20 de maio de 2011

Marta Bellini...



Negros Tempos

Um belíssimo texto de Aldina Duarte no «Passa Palavra». No Blog de Joana Lopes, Portugal, Entre as brumas da memória AQUI


«As notícias da morte de Bin Laden, do filho e dos netos de Kadhafi, os festejos duns e a apatia doutros, tornaram este dia negro, tão negro como os negros anos da minha infância no fascismo".


O fascismo roubou-me a primeira infância. Um dano irrecuperável que dificilmente se perdoa. A tristeza e a pobreza, vizinhas da miséria, inveteradas nos olhos pretos ou castanhos, sempre cansados e tristes, das mães, dos pais, das crianças, dos jovens e dos velhos, tudo era escuro, baço e ressequido, fosse qual fosse o mês do ano. Só nos olhos dos velhos havia o falso fulgor de quem alcançou um pouco de paz, sabendo que a morte se tornava mais próxima do que a vida. A maior parte acreditava que aos olhos de Deus eramos todos iguais, por isso, estar mais próximo da morte significava estar mais perto da dignidade que a vida lhes recusara. Olhos azuis ou verdes nunca os vi no meu bairro.


Refeições da família à mesa não me lembro, porque não havia comida para compor um prato quanto mais uma mesa; não me lembro de fazer anos [festejar o aniversário], nem ninguém da minha família, vizinhos ou colegas da escola primária, durante os meus primeiros sete anos; não havia banheira na casa dos pobres (bairros sociais), para não falar das barracas, onde nem uma sanita ou um lavatório havia; fruteira e mar, por exemplo, eram palavras abstractas; aos seis anos, eu tinha a chave de casa, tinha aulas e não tinha com quem ficar durante as tardes livres até à hora do jantar, quando a minha mãe voltava do trabalho.»

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