Caro Roberto
Ótima entrevista ao Jornal Terra. Concordo com suas ponderações iniciais e, principalmente, com a questão referida ao segredo e à democracia que surgiu mais ao final da entrevista.
No entanto, vou divergir em um aspecto dela. Dado o histórico dos governos petistas, não me parece verossímil que a presidente Dilma não estivesse a par do que fazia Palocci com sua empresa de consultoria. Talvez não soubesse os detalhes, mas certamente não reprova o método. Se reprovasse, não o nomearia Ministro. Eu desconfio e me pergunto se a candidata eleita escolheu fazer, como se diz, a conveniente "vista grossa" aos negócios do aloprado Palocci.
Quem patrocinou o vazamento do fato para a imprensa? E o principal, qual o alvo estratégico desse vazamento? Que prejudicou Palocci e, por tabela, Dilma é também um fato. O que não está claro é quem no governo e/ou fora dele espera obter vantagens com o vazamento, e quais vantagens.
Erenice Guerra, que era a figura de proa no círculo íntimo político de Dilma, não é "um simples caseiro". A quantas anda, e em qual velocidade, a investigação posta a cargo dos operadores do Estado e seus subordinados a respeito das denúncias que culminaram com a demissão de Erenice?
Francenildo fez a pergunta correta: “Por que ele não explicou de onde veio o dinheiro? Na minha época eu tive que explicar”. Dilma não respondeu à pergunta de Francenildo. Por quê? Assimetria absolutista. O governo não deve accountability a um "simples caseiro".
O jornal Valor de hoje trouxe um artigo do professor Renato Janine Ribeiro que, no meu entender, está na contra-mão do que na entrevista ao Jornal Terra foi o essencial: accountability. Cito passagens do artigo. Os grifos são meus:
"Podemos resumir assim a questão do ministro Antonio Palocci: se, nos últimos anos, ele usou o conhecimento intelectual que obteve como ministro para aconselhar empresas, não cometeu falha legal nem, provavelmente, ética. Nossa lei não impõe quarentena após o exercício de cargos públicos. Mas, se ele empregou conhecimentos (ou relações) no governo para favorecer tais empresas, está errado moralmente e talvez também do ponto de vista legal. Como está errado se o que recebeu estes anos foi em recompensa por benefícios eventualmente concedidos a empresas.
O problema é descobrir em qual hipótese está Palocci."
Da verdade faz parte toda a verdade. Se é verdade que a lei não impõe a quarentena é também verdadeiro que o sucesso empresarial de Palocci ocorreu durante o exercício de cargos públicos.
Mas Palocci, assim como Erenice, não é um "simples caseiro". Portanto, para o caso Palocci a seguinte proposta, a meu ver completamente contraditória com o pressuposto republicano da accountability:
"Tenho uma proposta. Por que não confiar essas informações, hoje sigilosas, a uma comissão de pessoas que conheçam bem o mundo dos negócios e mereçam nosso pleno respeito ético? Não é impossível encontrar três notáveis, em cuja palavra possamos confiar, e que prometam guardar total segredo sobre o assunto - a não ser, claro, que concluam pela culpa do ministro. Porque, hoje, a situação é ruim. O ministro e o governo, não fornecendo detalhes sobre o caso, expõem-se à suspeita. O interesse do ministro, e sobretudo do governo, deveria estar em eliminar as desconfianças. Até agora, não conseguiram. Dizer que foi a empresa que enriqueceu, e não o dono de 99% dela, ou lembrar que seus antecessores no ministério também lucraram depois de sair do governo, não convence os desconfiados de que Palocci tenha agido corretamente. Por isso, sugiro: busquem-se três pessoas dignas, sem compromisso com a oposição nem o governo, que possam examinar o caso."
O PT vai encarar a corrupção?
Autor(es): Renato Janine Ribeiro
Valor Econômico - 23/05/2011
Uma comissão de três cidadãos notáveis acima de qualquer suspeita para decidir o segredo e, por consequência, o direito?
“Por que ele não explicou de onde veio o dinheiro? Na minha época eu tive que explicar”