Blog do Villa
Sociedade tem direito de cobrar ministro
Postado por Villa em 22/05/2011
Sociedade tem direito de cobrar ministro, dizem especialistas
Para eles, governante não representa só a si mesmo: ele deve se explicar a quem o paga para servir ao País
O ministro da Casa Civil, Antonio Palocci, "precisa, sim, vir a público e dar explicações sobre o espantoso aumento de seu patrimônio". A frase, da cientista política Celina Vargas do Amaral Peixoto, da FGV-Rio, resume a impressão dominante entre historiadores e cientistas políticos - ainda que, como ponderam alguns deles, o ministro não tenha nenhuma obrigação legal de revelar sua vida financeira.
Essa dispensa legal, adverte o historiador Marco Antonio Villa, da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), não representa grande coisa: "Legalidade e justiça, no Brasil, são coisas dissociadas". "Entre nós, a ética não está consolidada na política e a lei não é garantia de justiça", afirma. "Se o ministro ganhou em um ano o que não havia ganho a vida inteira, isso causa grande estranheza. Por isso mesmo, ele deve dizer à opinião pública que tipo de consultoria prestou, a quem, e por quanto dinheiro."
Celina Vargas, que entre 1998 e 2002 ajudou o governo a criar o Código de Conduta da Alta Administração - um texto de 19 artigos que impõe normas e limites ao comportamento de ministros e funcionários diretos da Presidência - lembra que a população "paga e dá sustentação ao governo". Portanto, "tem direito de "cobrar e saber o que se faz com o dinheiro dos impostos."
É a mesma cobrança que faz o filósofo Roberto Romano, professor da Unicamp, antigo estudioso de questões éticas da sociedade. "Um deputado não representa só o seu eleitorado, representa todos os cidadãos. Ouvir suas explicações nesses episódios é um direito da sociedade."
Razões de Estado. Romano vê uma explicação histórica para o atual modo de relacionamento entre Estado e povo no Brasil: "É a reiteração de um modelo absolutista que surgiu com o Estado moderno". Nesse modelo, o indivíduo vale mais no mercado se está ou esteve próximo do poder. Com ele veio o conceito da chamada razão de Estado, "e a razão de Estado é mentirosa e interesseira, e se dedica a esconder as coisas do País", diz Romano. "É um instrumento para separar o cidadão comum do operador do Estado."
Foi por perceber esse perigo - pois ele dá poder ao governante e enfraquece a sociedade - que as revoluções francesa, americana e inglesa "consagraram um grande princípio, o da accountability". "Ele exige que o político sempre preste contas ao cidadão", conclui o professor.
E por que esse tipo de episódio é tão frequente no País? Romano e Celina Vargas dão a mesma resposta, que se aplica a todo o mundo político: o lobby nunca foi devidamente regulamentado no Brasil e isso deixa um campo aberto entre o público e o privado, entre a política e os negócios. Assim, enquanto nos EUA e na Europa o lobista é uma profissão normal, com regras e punições, no Brasil o assunto jamais é definido em lei. "E o que se vê é a prática de um lobby selvagem, não profissionalizado", acrescenta Romano.