quarta-feira, 11 de maio de 2011

O verde chic e caro, e excludente.

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‘Marketing verde’ gera segregação em
2 distritos de Campinas, aponta estudo
Dissertação do IG aponta “privatização” de espaços de lazer e de convivência

Marketing verde” foi o termo cunhado na literatura pela turismóloga Ana Maria Vieira Fernandes que melhor descreve o surgimento de um novo cenário urbano e de lazer nos distritos campineiros de Sousas e Joaquim Egídio. Segundo Ana Maria, as formas de apropriação do espaço pelos usos e consumos têm se caracterizado pela desigualdade e segregação de classes sociais. Ela analisa a maneira como os empreendimentos imobiliários utilizam as paisagens naturais, cuja relevância ambiental é inquestionável, para atrair novos moradores, turistas e visitantes. “Atualmente é possível perceber a crescente implantação de condomínios horizontais, loteamentos fechados, além do lazer, só que tudo isso ocorre de maneira privada e crescente”, argumenta.

Para chegar a essas considerações, Ana Maria buscou na Geografia os subsídios para embasar sua dissertação de mestrado, apresentada no Instituto de Geociências (IG) e orientada pela professora Regina Célia Bega Santos. Durante os anos de 2008 e 2009, a pesquisadora percorreu as ruas dos dois distritos e colheu depoimentos de moradores, empreendedores e visitantes. Em sua pesquisa, Ana Maria detectou que 83% do turismo local refere-se à forma privada. As visitas a fazendas e cachoeiras, por exemplo, são pagas ou estão localizadas dentro das áreas de estabelecimentos comerciais. Apenas 17% são praças públicas e áreas destinadas ao lazer para a população em geral.

Ana Maria explica que o fenômeno sempre chamou sua atenção, principalmente a partir dos anos de 1990, quando a questão da natureza começou a ser explorada mais intensamente. “Nasci em Campinas e lembro perfeitamente quando os distritos eram áreas rurais com muitas fazendas e terras. A partir da década de 70, a especulação imobiliária teve início, acirrando-se no começo de 90 com os apelos ambientais e a associação da natureza à qualidade de vida”, avalia.

Com a transformação de boa parte da região em Área de Proteção Ambiental (APA), em 2001, a necessidade criada pelo mercado de aproximar o cidadão das áreas verdes continuou em processo de crescimento, enquanto o esperado era que se mantivessem e estabelecessem limites para a preservação do meio ambiente, permitindo somente o uso sustentável da região. Ao contrário, as áreas verdes passaram a ter status de mercadorias caras, que, na opinião da pesquisadora, não mais permitem que os cidadãos simplesmente as habitem e nelas se divirtam livremente. “O reordenamento deste território pelo turismo e lazer e pela especulação imobiliária nos faz pensar que o local onde os distritos localizam-se está sendo encarado como Área de Proteção do Capital”, ironiza.

Em 2009, segundo apontou a pesquisa conduzida no IG, o número de habitantes passava dos 20 mil e o número de estabelecimentos comerciais chegava a 250. Além disso, até 2008, ainda existiam 16 loteamentos fechados aprovados em Sousas e seis, em Joaquim Egídio. Em todos os casos, as paisagens naturais se mostram moldadas para o consumo, considerando que a APA possui 223 quilômetros quadrados, constituindo 27,39% da área total de Campinas. “Nos últimos 20 anos, os distritos tornaram-se alvo de uma especulação imobiliária que só tende a crescer”, acredita.

Na opinião da pesquisadora, no caso do lazer a história não é diferente. Caracterizado pelo turismo gastronômico, rural e ecoturismo, que tem como público alvo classes mais abastadas, a privatização e segregação social também ocorrem na região. “Há uma desigualdade social e de acessos marcados por poucos espaços públicos e ainda assim vazios e degradados, além de poucas opções de lazer para a população remanescente que se ressente por não terem acesso. Um almoço para o casal custa, em média, R$ 120. Um lazer que só a classe média alta pode pagar”, analisa Ana Maria. Na pesquisa consta ainda que 60% dos frequentadores dos dois distritos são de Campinas e outros 30% são oriundos da cidade de São Paulo.

A principal queixa da população diz respeito ao trânsito intenso aos finais de semana, principalmente. Mas há, também, o incômodo com o lixo deixado nas trilhas, os carros estacionados nas portas das casas e a degradação das áreas verdes. Em tudo isso, Ana Maria, observou falta de investimento em políticas públicas na região. “A participação nos distritos, geralmente, se dá através de denúncias e reclamações feitas por alguns moradores. Outros se organizam e cobram medidas do poder público. Por sua vez, os donos dos estabelecimentos comerciais cobram maior envolvimento da Prefeitura com relação às atividades do distrito. Mas muito ainda tem que ser feito”, avalia.

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Publicação
Fernandes, A.M.V.; Santos, R. C. B. Revista Matogrossense de
Geografia da Universidade Federal de Mato Grosso. 2011
Dissertação: “A mercantilização da natureza e as novas territorialidades nos distritos de Sousas e Joaquim Egídio”
Autor: Ana Maria Vieira Fernandes
Orientadora: Regina Célia Bega Santos
Unidade: Instituto de Geociências (IG)
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