quinta-feira, 14 de julho de 2011

A ciência, quando levada com ética, sempre traz boas notícias, como a que segue, abaixo!


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Hidrogel associado a nanopartículas de
carbono pode substituir cartilagem
Bióloga testa na FCM biomateriais
compostos em ratos com lesões

Devido à sua condição avascular, a cartilagem articular apresenta baixa capacidade de auto-reparação e, quando lesada, dificilmente se regenera. Atualmente, há grande interesse no desenvolvimento de materiais e de suas aplicações, sustentadas por técnicas de engenharia tecidual, que possam substituir e até estimular a regeneração da cartilagem articular. Com o objetivo de contribuir para o desenvolvimento desses materiais, pesquisas são desenvolvidas no Laboratório de Biomateriais em Ortopedia, do Núcleo de Medicina Experimental da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp. A bióloga Ana Amélia Rodrigues testou biomateriais compostos de hidrogel de polivinil álcool em ratos com lesões na cartilagem articular.

Os resultados do estudo, que fundamentaram tese de doutorado defendida na Faculdade de Engenharia Elétrica e de Computação (Feec), indicam que o hidrogel de polivinil álcool puro, quando recebe a adição de nanopartículas de carbono, pode ser um excelente substituto da cartilagem articular, também chamada hialina. O trabalho avalia o uso do hidrogel de polivinil álcool associado a duas diferentes nanopartículas de carbono quando implantado em defeitos osteocondrais de ratos Wistar. Com caráter interdisciplinar, o estudo foi orientado pelo engenheiro elétrico Vitor Baranauskas e coorientado pelo médico ortopedista William Dias Belangero, professores da Unicamp. Recebeu financiamento do CNPq, Fapesp e da Capes e contou com a colaboração do Laboratório Nacional de Luz Síncrontron.

Belangero explica que a cartilagem é formada por um emaranhado de fibras de colágeno do tipo II, proteína abundante no corpo. Entre essas fibras, há um gel ou substância fundamental amorfa formada por macromoléculas de proteoglicanas, cuja parte central é protéica e de onde se originam moléculas de glicosaminoglicanas com cargas elétricas. Esta estrutura se mantém armada, a exemplo de uma esponja, mas com orientação espacial precisa. A cartilagem absorve e mantém, em sua malha, água e outros fluidos que mantêm a cartilagem ainda mais resistente à deformação. Por sua vez, o hidrogel é um polímero reticulado, que tem a capacidade de absorver água e que a expele quando pressionado. De certa forma, diz ele, o hidrogel mimetiza a cartilagem, embora de forma muito menos sofisticada.

O hidrogel assemelha-se a um plástico que se torna flexível ao absorver água, conferindo-lhe propriedades que permitem utilizá-lo na substituição da cartilagem e que, além disso, permite a circulação dos fluidos corpóreos. Ao receber nanopartículas de carbono, diz o professor, suas propriedades mecânicas aproximam-se do desejável: grande resistencia à abrasão e coeficiente de atrito na superfície muito próxima da cartilagem. Embora esse coeficiente seja ainda dez vezes maior que o da cartilagem, o pesquisador lembra que o melhor material utilizado hoje tem coeficiente cem vezes maior que a mesma. O material apresenta também uma complacência muito boa que é a propriedade de se deformar e voltar à forma primitiva, ou seja, a cartilagem da superfície oposta passa sobre ele como em uma cartilagem natural. Para o médico essas propriedades é que levaram os pesquisadores a distinguir o material. “O que nos interessava era saber a sua resistência ao atrito, à abrasão, porque sua função é a de substituir a cartilagem”, diz.

O processo

O material, produzido pelo método de deposição química a partir da fase de vapor, é obtido em um reator com atmosfera inerte que possui um filamento mantido a mais de mil graus em que é introduzida na forma de vapor uma substância que contém átomos de carbono na molécula. Nessa temperatura, as moléculas que constituem o vapor se quebram ao atingir o filamento e os átomos de carbono liberados se introduzem no substrato dando origem preferencialmente ou a nanotubos de paredes múltiplas que são aqueles formados por vários tubos concêntricos ou a fibras de carbono, dependendo da substância do vapor introduzido. Os nanotubros têm comprimento de cerca de um microm e diâmetro entre 60 a 80 nanômetros.

Os hidrogeis constituídos ou por nanotubos ou fibras de carbono foram então utilizados para substituir parte da cartilagem da articulação do joelho do rato em que foi feito um furo de dois milímetros de diâmetro por um milímetro de profundidade, dimensões proporcionalmente grandes quando se considera o tamanho do animal.

As verificações do comportamento dos implantes nos animais foram feitas, depois de sacrificados os animais, em três e doze semanas. As superfícies analisadas não revelaram desgaste, o material implantado não havia sido deslocado do local e os resultados dos ensaios mecânicos até comprovaram surpreendentemente que melhoraram suas características, o que leva os pesquisadores a considerar todos os resultados muito favoráveis.

Etapas

Antes dos testes in vivo, Ana Amélia Rodrigues realizou exames de toxicidade para verificar se o material interferia na viabilidade e morfologia das células provocando eventuais diferenças de comportamento por ter recebido a adição de partículas de carbono. Foram realizados testes in vitro utilizando culturas de células Vero do tipo fibroblasto e células-tronco mesenquimais derivadas da medula óssea do ratos Wistar-kyoto. O fibroblasto é a célula de referência em estudos por ser a mais simples para cultura. A escolha das células da medula óssea ocorreu pelo fato de serem responsáveis pela produção de tecidos ósseos com que o hidrogel estaria em contato. Descobrimos que as células sobreviviam e continuavam a desempenhar suas funções apesar da introdução de partículas de carbono no material”, afirma. Ao submeter esse grupo de células separadamente ao hidrogel puro, hidrogel com nanotubos e hidrogel com fibras de carbono, ela percebeu, respectivamente, um progressivo estímulo celular. Em seguida, a pesquisadora dedicou-se a estudar as características físico-químicas do material.

Como o material é permeável aos fluidos do organismo e se encontrava dentro do tecido ósseo, houve também a preocupação em saber se havia migração de cálcio ou de outras substâncias que poderiam se depositar dentro do polímero e alterar suas características. Constatou que, em um dos polímeros, havia uma concentração de fosfato de cálcio maior o que atribui à presença dos nanotubos de carbono, mas considera essa uma questão a verificar. Nesta fase da pesquisa, a conclusão foi de que o material convive bem com o tecido ósseo.

O professor Belangero acrescenta: estávamos buscando um material sintético que substituísse a cartilagem. Com base no caminho percorrido e com o animal estudado, podemos afirmar que alcançamos o objetivo. Parece que esse material substitui muito bem a cartilagem. Precisamos agora confirmar os resultados com animais de maior porte e com defeitos maiores. Paralelamente, estamos estudando concentrações diferentes de nanotubos. Por ora, podemos dizer que esse material substitui a cartilagem”.

Premiação

O trabalho desenvolvido por Ana Amélia Rodrigues recebeu a maior premiação no 42º. Congresso Brasileiro de Ortopedia e Traumatologia, realizado em novembro do ano passado em Brasília. Realizado anualmente, é o maior evento da área no Brasil e chega a receber de cinco a seis mil ortopedistas. A pesquisadora conquistou o primeiro lugar na categoria Podium, a mais importante do Congresso, em que entre dezenas de trabalhos são selecionados previamente vinte deles para apresentação na sessão plenária.

Resultados surpreendem pesquisador

O professor William Dias Bolangero conta que há anos começou a trabalhar com o hidrogel de polieno que foi utilizado para substituir defeitos de cartilagem articular. Depois de orientar diversos trabalhos, concluiu que esse tipo de gel não oferecia os resultados que pretendia. Em contato com outros pesquisadores da Universidade, surgiu a proposta de que utilizasse o hidrogel de polivinil álcool. Depois de alguns ensaios, decidiu-se pela substância. Posteriormente, em contato com o professor Baranauskas, que realizava pesquisas com a utilização de nanoparticulas de carbono, surgiu a ideia de reunir os dois materiais com o objetivo de melhorar o desempenho mecânico do hidrogel, um problema que se colocara quando utilizava o hidrogel de polieno.

O docente lembra que essa cooperação continuou quando Ana Amélia Rodrigues, que fora sua aluna de iniciação científica, começou a usar esses materiais por ocasião do mestradoque realizou com o professor Baranauskas.

Lembra ainda que “muito antes disso, o professor Vitor fez contato comigo porque na época uma aluna da Faculdade de Ciências Médicas tinha iniciado com ele um estudo sobre materiais carbônicos e que estava meio paralisado. Participei então da finalização desse estudo e fiquei muito entusiasmado com os resultados. Observamos na época que esses materiais estimulavam o crescimento dos tecidos.

Ao adicionar os materiais de carbono, os pesquisadores a priori não sabiam a que resultados chegariam, embora visassem reforçar a estrutura do hidrogel de forma a aumentar-lhe a resistência mecânica, o que conseguiram.

■ Publicação

Tese: Avaliação do hidrogel de polivinil alcool associado a duas diferentes nanoparticulas de carbono implantadas em defeitos osteocondrais de ratos Wistar”
Autora: Ana Amélia Rodrigues
Orientador: Vitor Baranauskas
Coorientador: William Dias Belangero
Unidades: Faculdade de Engenharia Elétrica e de Computação (Feec) e Faculdade de Ciências Médicas (FCM)
Financiamento: CNPq, Fapesp e Capes
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