A IMPORTÂNCIA DE SABER
Roberto Romano
Para aplicar ou prevenir golpes de Estado, desde o início da instituição política, saberes são exigidos. É por um motivo assim que líderes incultos representam permanente perigo para qualquer regime. No Brasil de hoje, alguns demagogos falam em golpe. E, com as tramóias descobertas no Estado e nos partidos políticos, os amigos do Planalto e dos "cargos de confiança" (e também das verbas milionárias) espalham fantasias sobre um golpe para desestabilizar o príncipe, abreviando o seu mando. As tolices ganharam foros de ciência política e quejandos.
Enquanto esperam as CPIs e seus resultados, seria interessante que os partidários do poder lessem Maquiavel, Espinosa, Montesquieu e Gabriel Naudé. Tenho certeza de que gastariam menos fôlego com um golpe imaginário e se interessariam pela análise dos golpes cometidos no dia-a-dia da nossa cambaleante República. Tais providências trariam o selo da ética real, silenciando os slogans nas mentes que não sabem discriminar entre tentativas de golpe e funcionamento cotidiano do Estado.
Golpe e razão de Estado são permutáveis. Os petistas que saíram da esquerda, ou insistem em se apresentar com aquele rótulo, têm plena consciência de que os regimes instaurados sob a sua égide brotaram de golpes. E a inspiração maquiavélica encontra-se nas teorias do golpe proletário para instaurar ditaduras. Como partilham o realismo da razão de Estado, os stalinistas no PT ou fora dele aceitam todas as conseqüências golpistas, desde que o golpe seja imposto por eles. Daí, a perene desconfiança contra os adversários: eles supostamente maquinam golpes sem cessar.
Para saber quando é preciso redefinir a lei fundamental para deter a morte do Estado ou para decidir sobre um golpe, é preciso muita prudência e conhecimento. Como não tiveram nem possuem tempo para leituras, dadas as suas perenes tarefas, líderes e boa parte dos militantes petistas não conseguirão dar um golpe de Estado porque "ditadura" vem da ars dictaminis (arte de ditar uma carta a um secretário), técnica retórica exigida dos governantes e hierarcas religiosos.
A raiva contra o pensamento, nas hostes petistas, recorda o dito medieval: "Rex illiteratus est quasi asinus coronatus" ("Um rei iletrado é um jumento coroado").
Eles desejam, mas não possuem, os saberes para instalar uma ditadura. Apedeutas não ditam, como disse Júlio César contra os misólogos (os que têm aversão à lógica) de seu tempo: "Sylla nescivit literas, non potuit dictare" ("Sylla ignorava as letras, não podia ditar").
Com sua truculência, os amigos do rei solapam a confiança dos cidadãos honestos no Estado de Direito. Mas o mal nem sempre dura. Pelo voto, os que identificam as suas pessoas ao Estado e repetem no Brasil de modo hilário a tolice de Luís 14 deixarão os palácios. Rumo à insignificância.