O soneto do cardeal
O SONETO DO CARDEAL RIO – Candidato a presidente da Republica em 1960, Janio Quadros passou pela Bahia. Foi visitar Juracy Magalhães, governador, ex-presidente da UDN, que tinha disputado com ele, na convenção, a indicação do partido. Estava todo preocupado em agradar a Juracy. Quem meu filho beija, minha boca adoça. Elogiou o deputado Juracy Magalhães Júnior: - Governador, que belo mancebo o seu filho. Era com um rapaz assim que eu gostaria de casar a Tutu.
Janio saiu do Palácio da Aclamação, onde Juracy morava, para visitar, ali ao lado, no Campo Grande, o cardeal dom Augusto Álvaro da Silva, um pernambucano alto, elegante e severo, cuja opinião política, e sempre dava, influía muito na Bahia. JANIO Antes de sair, chamou o oficial de gabinete do governador, Manoelito Teixeira, meu querido contemporâneo no curso de Filosofia do Seminário de Santa Tereza: - O senhor, que foi seminarista, poderia acompanhar-me até o senhor cardeal? O senhor cardeal dom Augusto é um homem velho ou jovem? - Velho. - Inteligente ou obtuso? - Inteligente. Muito inteligente. Um grande orador sacro e um bom poeta, com livro publicado sob o pseudônimo de “Carlos Neto”. - Poeta? Por acaso o senhor saberia de cor algo dele? - Sei uns dois ou três sonetos que aprendíamos no Seminário. - Recite-me, por favor, o mais belo, o mais cristão.
DOM AUGUSTO
Manoelito recitou. Jânio pegou-lhe o braço: - Vamos a pé mesmo. Segundo sei, o palácio do senhor cardeal é aqui perto. E vá me recitando, devagar, pausadamente, o soneto. Manoelito dizia o verso, ele mandava dizer de novo. No fim dos quartetos, outra vez. Dos tercetos, também. Chegaram. Dom Augusto o esperava de pé, no gabinete, magro, nariz afilado, vaidoso. Jânio lançou-se a seus pés, o joelho direito no chão, beijou-lhe o anel, os olhos retorcidos: - Senhor cardeal, Vossa Excelencia pode imaginar a emoção deste filho da Igreja ao encontrar-se, pela primeira vez, com o pastor primaz do Brasil. Creia que esta é uma das maiores alegrias da minha vida. Eu e a Eloá nos comovemos, sempre, às lágrimas, quando relemos seus poemas, como este soneto, que tomei como lema de minha vida.
MANOELITO
E recitou, do princípio ao fim, a voz ungida, trêmula, arfante. Não errou um verso, uma rima. Dom Augusto o ouviu comovido, feliz. Depois, sentaram-se e longamente conversaram sobre a Bahia, o Brasil e o mundo. Na saída, já lá fora, Manoelito imaginou que ia, quem sabe, dar o salto. De oficial de gabinete de governador, passar, depois das eleições, a oficial de gabinete do presidente. Começou com cuidado: - Que tal, presidente? Gostou do cardeal? Jânio deu de ombros, virou o rosto, nada respondeu e foi andando rápido, passadas fortes, para o Palácio da Aclamação. Nem se despediu de Manoelito. No dia seguinte, Dom Augusto deu calorosa declaração a favor de Jânio, acusando Lott de estar “envolvido com os comunistas”.
LULA
Sem o talento de Janio, sem a inteligencia de Janio, sem o brilho de Janio, sem o charme de Janio, Lula parece que herdou o carater de Janio. A palavra dele nunca vale um tostão de mel coado. A cada um ele fala o que imagina que vai servir naquela hora e ser recebido como exclusividade. Está levando o PT e o PMDB a um beco sem saída.. Sarney tem que ser “defendido” a qualquer preço porque, pela biografia, “não é uma pessoa comum”, e a aliança com o PMDB mantida nos Estados de qualquer jeito. A bancada do PT no Senado, obrigada a falar à tarde o contrario do que disse de manhã, vai sendo cada dia mais desmoralizada. O Mercadante, coitado, parece uma minhoca se retorcendo de entrevista em entrevista. MINAS Nos Estados, o PT vai sendo obrigado a reagir e se rebelar. O preço da salvação de Sarney e da aliança com o PMDB está ficando caro demais. O primeiro a sacudir a cangalha foi o PT do Rio Grande do Sul, que lançou o ministro Tarso Genso para governador sem nem conversar com o PMDB. No fim de semana, foi a vez de Minas. O ex-prefeito Fernando Pimentel comunicou oficialmente à direção nacional do partido que é candidato a governador e não haverá aliança de apoio a Helio Costa. É a mesma situação da Bahia com Gedel Vieira Lima para o governo e de Pernambuco com o ex-prefeito João Paulo já candidato a senador. SÃO PAULO São Paulo é tragédia grega pura. O PT nasceu ali, amamentou-se ali, foi para a creche ali, cresceu ali. De repente a mãe Lula o joga fora da bacia e diz que não pode ter candidato a governador porque ele quer Ciro Gomes, que nem do PMDB é e não é um candidato mas um palavrão ambulante. Está sendo assim Estado por Estado. Para apoiar Dilma a presidente, o PMDB exige reciprocidade do PT nos Estados para seus candidatos a governador. Lula promete. Mas palavra de Lula não vale nada. Ao PMDB ele garante uma coisa, ao PT diz outra. E o lobisomem Serra sorrindo. www.sebastiaonery.com.br