| A repórter americana Lara Logan, enviada especial da CBS ao Egito, principal repórter internacional da emissora, foi agredida e molestada sexualmente por um grupo de manifestantes na praça Tahrir, durante as comemorações pela queda do presidente Hosni Mubarak. Lara Logan é loira, tem 39 anos, nasceu na África do Sul e fez carreira nos Estados Unidos. Cansou de ganhar prêmios por suas reportagens de TV. E qual foi a reação de parte de seus colegas à agressão?
Depende: do centro para a esquerda liberal, a agressão foi condenada. Da direita à extrema direita, houve alegria com o ataque, que confirmou suas ideias de que muçulmanos e árabes são ferozes pela própria natureza. "Não me incomoda nem um pouco que repórteres que dizem que muçulmanos e o Islã são pacíficos provem um pouco da paz deles", diz uma mulher, radialista e blogueira. "Isso nunca aconteceu quando Mubarak tratava seu país de selvagens da única forma que eles entendem".
E os árabes não-muçulmanos? E os muçulmanos não-árabes? Bobagem: para este grupo fanatizado, que se alegra com a agressão a uma mulher, é tudo a mesma coisa. Para outros grupos, que também se expressam pelos meios de comunicação, a culpa deve ser dividida entre Lara Logan, por ser bonita, e a CBS, que ousou mandar uma mulher, bonita, "e ainda por cima loira", para fazer a cobertura de uma manifestação que poderia degenerar em conflito. Traduzindo, lugar de mulher é em casa. E, se sair, que esconda a beleza - que tal uma burca?
A reação é fundamentalmente ideológica - em termos políticos ou de costumes. Mas há, nos meios de comunicação de todos os países, escorregadelas que estimulam esse tipo de comportamento. Chamar um bando de duzentos tarados de representantes de "um país de selvagens" é desconhecer totalmente o Egito.
Quando dez vândalos invadiram o Centro de Treinamento do Corinthians para danificar automóveis de jogadores, a imprensa citou protestos "da torcida" - como se dez, vinte ou cem pessoas representassem os 30 milhões de torcedores corinthianos. Quando parte de uma torcida uniformizada do São Paulo se recusava a citar o nome de um jogador do time, por considerá-lo homossexual, os meios de comunicação diziam que "a torcida" o hostilizava.
Nos Estados Unidos, organizações terroristas como a al-Qaeda levaram muita gente dos meios de comunicação a responsabilizar povos inteiros pela insânia de alguns grupos. Dedicam-se à islamofobia, ao sentimento antiárabe, trocam a discussão civilizada pela troca de insultos - e quantos saberão que boa parte dos motoristas de táxi de Nova York é paquistanesa e muçulmana?
O viés ideológico está tão pesado que aqui no Brasil, num blog conhecido, foi divulgado um ataque de Israel à faixa de Gaza que deve ser furo internacional: não saiu em nenhuma agência, não foi noticiado pela al-Jazeera, não foi divulgado pela al-Arabiya, não mereceu protestos do Hamás, que governa a região. A notícia, tão exclusiva que nem parece verdadeira, serviu como base para que muita gente externasse seus preconceitos contra Israel, israelenses e judeus em geral. E até há alguns dias o blog não a havia desmentido.
O comentário correto
Quem melhor tem tratado as questões do Oriente Médio, na imprensa brasileira, é Gustavo Chacra, de O Estado de S.Paulo (a quem este colunista não conhece pessoalmente, só de leitura). É estudioso do tema, entende o relacionamento entre os diversos países da região, evita o radicalismo sempre emburrecedor. Seu blog está neste endereço eletrônico . Vale a pena lê-lo: o texto é muito bom e sempre esclarecedor.
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