Para Casa Branca, esquerda brasileira se decepcionou com Fidel Castro
Documentos do arquivo diplomático suíço revelam que o governo americano apostava suas fichas em uma perda de influência da revolução cubana na América Latina já em meados dos anos 60.
Em encontro entre Lincoln Gordon no dia 6 de julho de 1966 e o enviado suíço Felix Schnyder, embaixador em Washington, o americano insistia que “esquerda brasileira” havia se decepcionado com Fidel e reconhecido que ele não passava de um « fantoche » da então União Soviética na disputa travada entre as duas superpotências no quadro da Guerra Fria.
As revelações fazem parte dos arquivos diplomáticos suíços, num telegrama enviado pelo próprio Schnyder no dia 7 de julho de 1966 a seus superiores em Berna.
Naquele momento, Gordon era o sub-secretário de Estado norte-americano, posto que ganhou depois de ter sido o embaixador americano no Brasil justamente no ano do Golpe.
Para o americano, o que minou o prestígio dos cubanos na América Latina e no Brasil foi o episódio da crise dos mísseis, em 1962, um dos momentos de maior tensão na Guerra Fria. “Eu estava no Brasil nesse momento”, disse o americano ao enviado suíço. “Eu pude constatar como a esquerda brasileira ficou consternada (dismayed) de ver que Castro era apenas um fantoche nas mãos de Nikita Khrushchev e que ele (o russo) havia retirado os mísseis de Cuba sem consultar a Castro », disse.
Segundo Gordon, outro « golpe no prestígio de Castro foi o desaparecimento de Che Guevara ». Naquele momento, o sub-secretário de Estado norte-americano mantinha a percepção de que seu desaparecimento era ainda um mistério. Mas sua avaliação pessoal era de que o argentino estava morto « ou preso em um instituto psiquiátrico ».
ORIGINAL DO DOCUMENTO:
Archives: | Schweizerisches Bundesarchiv, Bern (CH-BAR) | |
Cote: | E 2300-01(-)1973/156/10 | |
Nouvelle cote: | E2300-01#1973/156#71* | |
Titre dossier: | Washington (Berichte, Briefe) | |
Période: | 1966–1966 | |
Numéro de référence des archives: | A.21.31 |
Casa Branca explica seu apoio ao golpe: ‘Goulart e seu governo estavam prestes a instalar regime ditatorial’
O governo dos Estados Unidos justificou seu apoio aos militares brasileiros em 1964 alegando que João Goulart e seus aliados estavam « prestes a instalar um regime ditatorial » no Brasil. Essa foi a explicação que Lincoln Gordon deu em uma reunião em Washington no dia 6 de julho de 1966 com enviado suíço Felix Schnyder, embaixador em Washington. Mas admitiu que o governo americano se sentiu frustrado pelos militares quando os Atos Institucionais ganharam força.
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Militares teriam planejado golpe já em 1961
As revelações fazem parte dos arquivos diplomáticos suíços, num telegrama enviado pelo próprio Schnyder no dia 7 de julho de 1966 a seus superiores em Berna.
Naquele momento, Gordon já era o vice-secretário de Estado norte-americano, posto que ganhou depois de ter sido o embaixador americano no Brasil justamente no ano do Golpe.
Na conversa, o suíço questiona Gordon sobre o motivo pelo qual Washington apoiou os militares brasileiros e foi muito mais hesitante em apoiar o golpe na Argentina. O americano insistiu que, na visão da Casa Branca, os militares brasileiros deram sinais no começo do regime que rapidamente iriam reinstalar a democracia em pouco tempo.
“No Brasil, o sr. Goulart e seu governo estavam prestes a instalar, apesar da constituição, um regime ditatorial. Já os militares se mostraram, pelo menos no começo, relativamente respeituoso em relação à constituição, já que o presidente provisório Marzili (sic) foi eleito, no dia 2 de abril de 1965, pelo Congresso, o que fez o presidente Johnson enviar a ele um telegrama de felicitação », diz o texto, citando a explicação de Gordon. O vice-secretário de Estado chega a alertar na conversa que Goulart « não respeitava os procedimentos constitucionais ».
Ranieri Mazzilli era presidente da Câmara dos deputados e teve a função de presidente brasileiro entre os dias 2 e 15 de abril de 1964. No dia 15, Mazzilli entregou o cargo ao marechal Humberto de Alencar Castelo Branco e ao Comando Supremo da Revolução.
O americano, porém, admitiu abertamente que se o Ato Institucional tivesse sido anunciado nos primeiros dias do Golpe, a Casa Branca não teria dado o mesmo respaldo aos militares brasileiros. « É verdade que o Ato Institucional de 9 de abril (de 1964) concede um número de limitações e é possivel que, se os militares tivessem promulgado isso desde o começo (do regime), os Estados Unidos seriam obrigados a se mostrar mais reticentes », declarou.
Gordon lamenta. «Mas, depois de sido acordado, o reconhecimento (a um regime), não pode ser mais retirado », disse ao suíço.
O Ato Institucional de 1964 desmontou o cenário político brasileiro. O AI 1 permitiu o governo cassar mandatos legislativos, afastar funcionários que fossem vistos como ameaças e suspender direitos politicos. Outros Atos Institucionais acabariam sendo decretados no Brasil nos anos seguintes.