sábado, 31 de março de 2012

Jornal O Povo, Ceará.

Análise 31/03/2012 - 15h00

O que explica a crise, segundo os cientistas políticos

Na raiz do problema, estariam o continuísmo entre aos governos, mesmo de forças políticas adversárias, e o instinto de sobrevivência dos políticos.

A fragilidade da oposição não reside apenas no fato de ser minoria. A identidade dos partidos caminha na corda bamba. Uma oposição, quando é aguerrida, pode ser minoria e ser vigilante e eficiente. Mesmo com propostas ideológicas diferentes, partidos de oposição se identificam de algum modo com a política econômica adotada pelo PT. Ao assumir o Governo, Lula deu prosseguimento e aprofundou uma série de políticas de proteção social, como fazia o PSDB de Fernando Henrique Cardoso.

De acordo com o professor de Filosofia Política e Ética da Unicamp, Roberto Romano, DEM e PSDB, principais partidos de oposição ao Governo Federal, têm diferenças programáticas, ideológicas em relação aos partidos governistas, sobretudo se comparados ao PT, mas têm semelhanças quanto a macroeconomia adotada durante todo o Governo Lula.

“Isso tirou um pouco a capacidade de fazer oposição. Como fazer oposição ferrenha a um governo do qual você apoia a política econômica?”, questiona. Segundo ele, DEM e PSDB foram aprendendo a sua personalidade pública de oposição e ficaram num papel “muito desagradável” de acentuar os aspectos morais, das falhas da base governista ou do próprio Governo. “Eles não têm nada de substancial para oferecer ao Governo que está no poder”, afirma Romano.

O que comprova esta tese, pontua ele, é que nas eleições de 2008, o candidato tucano à Presidência da República, José Serra chegou a elogiar a política econômica de Lula. “Isso mostrou um desarmamento tremendo por parte da oposição. Para a população, se ele diz que o que Lula fez é maravilhoso, é melhor votar na Dilma”, argumenta.


Adesismo

Para o professor de Ciências Políticas da Universidade de Fortaleza (Unifor), Francisco Moreira Ribeiro, uma das explicações para a crise da oposição é o adesismo. Aderir à base aliada do Governo é um caminho adotado por vários partidos políticos que buscam a sobrevivência eleitoral, principalmente quando o governo é bem avaliado pela população. “Em função dessa busca pela sobrevivência, os partidos terminam adotando posicionamentos ideológicos que não têm consistência. Eles não têm propostas. Não têm um programa político partidário que dê sustentabilidade às suas ideias”, critica Ribeiro.

Para ele, a oposição não tem um discurso no sentido de construir um projeto para o país, o que torna o discurso superficial. Conforme explica, os partidos perdem a consistência, quando adotam discursos oportunistas, abordando questões de momento e apresentando soluções frágeis. “A crise não é de agora. Isso se verifica em vários momentos da história político partidária. Eu prefiro vê-la como resultado de um processo histórico”, disse. (Lucinthya Gomes - lucinthya@opovo.com.br)


FORA DO PODER 31/03/2012 - 15h00

Bancada encolheu; ideal seria ao menos 30%

Para o professor de Ciência Política da Unicamp, Valeriano Costa, o processo de “encolhimento” da oposição vem ocorrendo desde a primeira gestão do Governo Lula. Após o escândalo do Mensalão, em 2005, o Governo se sentiu na necessidade de ampliar a base de apoio para resistir aos ataques da oposição, afirma Costa.

“No segundo mandado, Lula definiu como estratégia a aproximação com o PMDB. Ele terminou o mandato com uma base bastante grande e o único ponto frágil era o Senado”, explicou o professor.Segundo ele, na campanha de 2010, foi quando PSDB e DEM, principais partidos de oposição, se sentiram mais ameaçados, com o aumento da base governista também no Senado.

“Hoje você tem uma situação de extrema redução da oposição”, lamenta Costa. Na opinião dele, a oposição precisaria representar pelo menos 30% da Casa Legislativa, para o caso de convocar uma CPI, se necessário. (LG)

Com aliados que tem, governo dispensa oposição

No Congresso, os dissabores de Dilma são fruto da rebeldia de setores da base aliada, que têm feito mais barulho do que a própria oposição
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VALTER CAMPANATO/ABr
Senador Requião

No Governo Dilma, a base aliada, com seus setores rebeldes, dá mais trabalho do que a própria oposição. Mesmo que lideranças do Governo Federal neguem a existência de uma crise, a presidente vem enfrentando a morosidade na tramitação de projetos considerados prioritários e já tem sofrido algumas derrotas nas Casas Legislativas Federais. O Partido da República (PR), que compunha a base nas gestões de Lula e ajudou a eleger Dilma, já se desligou do Governo e, pelo menos no Senado, já se colocou como partido de oposição.

No último mês de março, o Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB), admitindo preocupação com as eleições de 2012, chegou a divulgar nota demonstrando insatisfação quanto à hegemonia do Partido dos Trabalhadores (PT). Parlamentares peemedebistas consideram o tratamento recebido pelo Governo de “injusto” e “desigual” e afirmam que o PT estaria empenhado em assumir o lugar do PMDB como maior partido com base municipal do país.

O professor de Ciências Políticas da Universidade de Fortaleza (Unifor), Francisco Moreira Ribeiro, afirma que a larga base de apoio ao Governo petista é fruto do adesismo. “Aquela adesão não tem vínculos programáticos. As adesões assim como as rupturas que estão ocorrendo, com essa crise que se instalou no governo com a base, têm finalidade eleietoral”, defende. Para Ribeiro, os partidos vêm fazendo oposição ou situação de acordo com o momento, e com a necessidade de tirar maior proveito eleitoral.

Já o professor Valeriano Costa, professor de Ciência Política da Unicamp, explica que a base está insatisfeita com a atitude do Governo, com relação à retenção e contingenciamento de verbas e emendas parlamentares. “Isso criou desconforto e a Dilma está demorando muito na negociando para substituição e nomeação dos ministros que hoje são provisórios”, argumenta.

A crise com a base já vem resultando em derrotas ou atrasos no Senado e na Câmara Federal. Um exemplo foi a tramitação do projeto que cria o Regime de Previdência Complementar do Servidor Público da União (Funpresp) e fundos de pensão, não tramitou com a pressa desejada pelo Governo, embora tenha sido aprovado na última quarta-feira, no Senado.

Desencanto

Diante da aprovação da Funpresp, senador Roberto Requião (PMDB-PR) confessou seu desencanto com a política brasileira. Em protesto, ele denominou o Senado de “geleia geral em que se transformou o Senado”. Para o senador, os políticos de esquerda cortaram os laços com a ideia de transformação da sociedade brasileira, “que em um dia tão distante cultivamos”’. Segundo ele, a “grande política” foi escorraçada do Parlamento e dos sindicatos e hoje está confinada aos livros.

Na avaliação do parlamentar, PT, PCdoB, PSB e PDT, que ajudaram a aprovar a Funpresp, “não perceberam ainda” que, nos últimos 30 anos, o país está se desindustrializando com as políticas liberais. Ele criticou a ausência de uma “política séria” que contenha o ingresso do “capital vadio” na Bolsa de Valores e evite “a política de terra arrasada” causada pelo dólar barato. (Lucinthya Gomes - lucinthya@opovo.com.br)

Saiba mais

Mesmo que a oposição venha se empenhando em atacar o Governo Federal, sob o ponto de vista da ética e da moralidade, a presidente Dilma Rousseff, mesmo com a substituição de vários ministros por suspeita de corrupção, tem conseguido se preservar diante da opinião pública. Para a população, ela é quem está fazendo uma verdadeira “faxina” no Governo.

A propósito, o primeiro ano do Governo Dilma foi melhor avaliado do que o primeiro ano das duas gestões do ex-presidente Lula. Pesquisa Datafolha divulgada pelo jornal Folha de S.Paulo em janeiro indica que 59% da população considera a administração de Dilma boa ou ótima.

Nos dois primeiros anos
de gestão, Lula conseguiu a aprovação positiva de 42% e 50%, respectivamente. O índice de confiabilidade da presidente empata com o de Lula em seu primeiro mandato no Palácio do Planalto. Segundo pesquisa do Ibope divulgada no último mês de dezembro, ela conta com a confiança de 68% dos entrevistados.
SITUAÇÃO E OPOSIÇÃO 31/03/2012 - 15h00

Pouca renovação partidária também é forte gargalo

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FABIO RODRIGUES POZZEBOM/ABr
Na última campanha, Serra chegou a elogiar governo do PT

A crise não é apenas da oposição. Na avaliação do professor de Filosofia Política e Ética da Unicamp, Roberto Romano, o Brasil está assistindo à desidratação e à oligarquização dos partidos políticos brasileiros, o que afeta não apenas oposição, como também partidos que compõem a base governista.

Ele explica que o PSDB, um dos principais partidos de oposição, passou oito anos na Presidência da República e não se preocupou em estender suas bases e diretórios pelo Brasil inteiro. “O PSDB ficou atrelado aos cargos federais e estaduais e não abriu nenhuma fonte de diálogo com a militância e os diretores de base”, pontua, acrescentando que o PT está fazendo a mesma coisa, mesmo que em menor escala.

O PMDB seria hoje o único partido com amplas bases municipais e com lideranças regionais, que amplia sua presença nos municípios em cada eleição. “Essa crise abala a oposição, porque o DEM (que junto com o PSDB atua como oposição no cenário nacional) está desaparecendo a olhos vistos, sobretudo depois dessa manobra bastante oportunista do (prefeito de São Paulo, Gilberto) Kassab, criando um partido, o PSD. O DEM perdeu muita gente, da base até a cúpula”, destaca.

Ainda sobre o PSDB, Romano analisa que a sigla não investiu em renovação e tem se limitado a determinados focos pelo Brasil, como São Paulo, Minas Gerais, Rio Grande do Sul e algumas cidades do Nordeste.

Para ele, a única maneira de reverter o problema seria democratizando os partidos políticos, incentivando a renovação. Para tanto, ele propõe uma lei que exija a mudança de dirigentes dos partidos em no máximo dois anos.

“Isso obrigaria os partidos a realizarem prévias, à semelhança do que ocorre na Europa e aí haveria uma safra de novas mulheres e homens que não estão viciados nesse jogo que existe desde o início do Brasil, mas inspirado pelas duas ditaduras do século XX”, argumenta.

Romano vai além e diz ainda que a crise é generalizada, afetando os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. Para ele, a crise entre o Governo e a própria base aliada, pressiona “de forma aguda” a estrutura da Presidência. “Não é por acaso que se trocam tantos ministros em tão pouco tempo.

O próprio Executivo está em crise”, argumenta. (LG)