O trecho abaixo foi escrito a propósito do terrorismo. Mas nele pensei, hoje, ao me saturar de vez com as hienas da família Jackson, da imprensa, do ratio e TV, que transformaram a morte de um ser humano em ocasião de comilança de carnes e de almas. A massa dos canibais que amanhã estarão no "funeral", ou grande espetáculo da insignificância de todos e de cada um, não apenas traz repulsa e asco. Ela fede no pior grau de putrefação cultural. Ah! se na hora do show pervertido a terra se abrisse numa cratera imensa: ninguém alí faria falta. A midia preparou aquela massa de merda que, num só berro idiota, grita e ri, com um bilhete de entrada para o show nas mãos, e com uma pulseira de plástico dourado, o que lhe dará acesso ao banquete onde o prato será o idolo. Massa ignorante do que significa viver, morrer, sofrer, beleza ou face hedionda. É o que penso hoje. Talvez mude, talvez não. Peço aos amigos que leiam o trecho abaixo e me digam se não sentem nojo com o espetáculo diante do qual as arenas romanas eram decorosas, cheias de imensa dignidade. RR
"No quinto exercício espiritual, previsto para a primeira semana de retiro, Santo Inácio de Loyola (1492-1556) diz o seguinte: "com os olhos da imaginação, veja-se o comprimento, a largura e a profundeza do inferno... (ouça-se) os choros, os urros, os gritos, as blasfêmias....(cheire-se) a fumaça, o enxofre, e as coisas em estado de putrefação....(experimente-se com o paladar) as lágrimas, a tristeza, o verme da consciência....(toque-se) as lavas de fogo que envolvem as almas e que as queimam". Tais frases, citadas por G. Hocke, fazem-nos refletir. Quem leu o romance de Joyce, o Retrato do Artista Quando Jovem, recorda o pavor do estudante com os cálculos para saber quantas almas cabem no fogo eterno. Aquelas visões foram realizadas, em tempo próximo ao do romance, nos campos nazistas,onde o inferno abriu a garganta e devorou milhões de seres humanos. Na porta daqueles espaços, a ordem moralista : "O trabalho liberta". Elias Canetti, conhecedor do submundo totalitário, disse certa feita que a invenção mais tremenda dos homens é a do inferno. Depois que ele foi produzido na imaginação, todos os tormentos seriam previsíveis. Santo Inácio manda que os cinco sentidos sejam exercitados, possibilitando o pandemônio na consciência. Não bastam os olhos, são requisitados o gosto, o tato, o olfato. Todo o corpo transforma-se em fábrica diabólica. Estamos longe, em termos de tecnologia, de alcançar a perfeição de um aparelho que sintetize os cinco sentidos. Mas a midia se esforça para trazer, apenas com a vista e as orelhas, o inferno à nossa casa, ao nosso corpo, aos nossos corações e mentes. Ainda não inventaram uma TV com sabores, gosto, cheiro. Mas Santo Inácio poderia propor esta forma de imprensa como auxiliar na tarefa de produzir o inferno. O cheiro e o gosto, se eles chegassem ao público, seriam o da podridão, essencial nos excrementos da alma. A produção do lucro e o controle das consciências faz do poderoso instrumento de comunicação social um fim em si mesmo, cena dantesca permanente.poderia propor esta forma de imprensa como auxiliar na tarefa de produzir o inferno. " (Roberto Romano "A Razão Terrorista", in O Desafio do Islã e outros Desafios, São Paulo, Ed. Perspectiva).
"No quinto exercício espiritual, previsto para a primeira semana de retiro, Santo Inácio de Loyola (1492-1556) diz o seguinte: "com os olhos da imaginação, veja-se o comprimento, a largura e a profundeza do inferno... (ouça-se) os choros, os urros, os gritos, as blasfêmias....(cheire-se) a fumaça, o enxofre, e as coisas em estado de putrefação....(experimente-se com o paladar) as lágrimas, a tristeza, o verme da consciência....(toque-se) as lavas de fogo que envolvem as almas e que as queimam". Tais frases, citadas por G. Hocke, fazem-nos refletir. Quem leu o romance de Joyce, o Retrato do Artista Quando Jovem, recorda o pavor do estudante com os cálculos para saber quantas almas cabem no fogo eterno. Aquelas visões foram realizadas, em tempo próximo ao do romance, nos campos nazistas,onde o inferno abriu a garganta e devorou milhões de seres humanos. Na porta daqueles espaços, a ordem moralista : "O trabalho liberta". Elias Canetti, conhecedor do submundo totalitário, disse certa feita que a invenção mais tremenda dos homens é a do inferno. Depois que ele foi produzido na imaginação, todos os tormentos seriam previsíveis. Santo Inácio manda que os cinco sentidos sejam exercitados, possibilitando o pandemônio na consciência. Não bastam os olhos, são requisitados o gosto, o tato, o olfato. Todo o corpo transforma-se em fábrica diabólica. Estamos longe, em termos de tecnologia, de alcançar a perfeição de um aparelho que sintetize os cinco sentidos. Mas a midia se esforça para trazer, apenas com a vista e as orelhas, o inferno à nossa casa, ao nosso corpo, aos nossos corações e mentes. Ainda não inventaram uma TV com sabores, gosto, cheiro. Mas Santo Inácio poderia propor esta forma de imprensa como auxiliar na tarefa de produzir o inferno. O cheiro e o gosto, se eles chegassem ao público, seriam o da podridão, essencial nos excrementos da alma. A produção do lucro e o controle das consciências faz do poderoso instrumento de comunicação social um fim em si mesmo, cena dantesca permanente.poderia propor esta forma de imprensa como auxiliar na tarefa de produzir o inferno. " (Roberto Romano "A Razão Terrorista", in O Desafio do Islã e outros Desafios, São Paulo, Ed. Perspectiva).