Comentário:
Admirável a fidelidade ao amigo poderoso na hora triste. O autor do texto abaixo, no entanto, vai além em sua defesa do senador. Se acreditássemos nos enunciados postos diante de nossos olhos, Frei Galvão tem companheiro na santidade. Mas hagiografias pertencem a um genero simbólico, não histórico.
É necessário lembrar ao jurista que Sarney não fez isto ou aquilo sozinho. Ele integrou um processo onde muitos e muitos assumiram responsabilidades. Acaba de falecer, por exemplo, em São Paulo, o autor da Carta aos Brasileiros, o eminente Gofredo Telles Junior. A carta foi publicada num instante em que Sarney era da ARENA, o partido da ditadura ("o maior partido do Ocidente", segundo Francelino Pereira). Pessoas como Ulisses Guimarães, Maior Covas, Teotonio Vilela, e tantos mais, entraram na batalha pela democratização do país, quando Sarney ainda se aboletava nos Palácios, servindo ao regime autoritário. Sem falar nos que foram banidos, torturados, etc. pela simples vontade e projeto de um país livre das baionetas e das censuras. No artigo abaixo, ocorre o que se passa no mito do pequeno deus indiano, o qual pede "apenas" um pequeno lugar para si. Pouco a pouco ele se agiganta e invade os espaços todos. Também recorda a lenda romântica do Pequeno Zacarias, chamado Cinabre, que parasita todos os méritos alheios.
Não, prezado jurista, não levo a admiração pelo seu zelo ao amigo até o ponto de aceitar, sem crítica, o retrato hagiográfico que V.Sa. faz do personagem. Claro: Sarney é um dentre muitos (alguns diriam, todos) senadores que imaginam estar em terra conquistada, na qual tudo lhes é devido, nada lhes pode ser cobrado. Agora, leiamos a defesa de Sarney pelo douto causídico.
RR
Admirável a fidelidade ao amigo poderoso na hora triste. O autor do texto abaixo, no entanto, vai além em sua defesa do senador. Se acreditássemos nos enunciados postos diante de nossos olhos, Frei Galvão tem companheiro na santidade. Mas hagiografias pertencem a um genero simbólico, não histórico.
É necessário lembrar ao jurista que Sarney não fez isto ou aquilo sozinho. Ele integrou um processo onde muitos e muitos assumiram responsabilidades. Acaba de falecer, por exemplo, em São Paulo, o autor da Carta aos Brasileiros, o eminente Gofredo Telles Junior. A carta foi publicada num instante em que Sarney era da ARENA, o partido da ditadura ("o maior partido do Ocidente", segundo Francelino Pereira). Pessoas como Ulisses Guimarães, Maior Covas, Teotonio Vilela, e tantos mais, entraram na batalha pela democratização do país, quando Sarney ainda se aboletava nos Palácios, servindo ao regime autoritário. Sem falar nos que foram banidos, torturados, etc. pela simples vontade e projeto de um país livre das baionetas e das censuras. No artigo abaixo, ocorre o que se passa no mito do pequeno deus indiano, o qual pede "apenas" um pequeno lugar para si. Pouco a pouco ele se agiganta e invade os espaços todos. Também recorda a lenda romântica do Pequeno Zacarias, chamado Cinabre, que parasita todos os méritos alheios.
Não, prezado jurista, não levo a admiração pelo seu zelo ao amigo até o ponto de aceitar, sem crítica, o retrato hagiográfico que V.Sa. faz do personagem. Claro: Sarney é um dentre muitos (alguns diriam, todos) senadores que imaginam estar em terra conquistada, na qual tudo lhes é devido, nada lhes pode ser cobrado. Agora, leiamos a defesa de Sarney pelo douto causídico.
RR
São Paulo, domingo, 12 de julho de 2009
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice TENDÊNCIAS/DEBATES Pode repetir-se o castigo SAULO RAMOS
SOUBE QUE José Sarney foi avisado para não se candidatar a presidente do Senado porque o mundo desabaria sobre ele como um vulcão de coisas impossíveis. Já às vésperas das eleições para a Presidência da República e para o Congresso, com renovação de dois terços do Senado, a empreitada seria temerária. Ele seria o primeiro alvo. Aceitou a candidatura já provocando o primeiro impossível: PSDB e PT juntos do lado contrário. E cometeu a segunda impossibilidade: ganhou as eleições. A despeito de sua história de serviços prestados ao Brasil, a despeito de uma vida parlamentar de mais de 30 anos sem nenhuma acusação, tornou-se, de uma hora para a outra, o alvo de todas as raivas, a Geni de todos os ansiosos para virar notícia de jornal, com acusações de todos os naipes alinhavadas, umas atrás das outras, para alimentar um noticiário continuado contra sua permanência no cargo. Houve uma época em que todo o mundo acusava Sarney de haver distribuído rádios e televisões aos constituintes para obter um mandato de cinco anos. Depois ficou demonstrado que seu mandato era de seis anos e que a acusação era ridícula, pois ele renunciou a um ano. Ninguém mais falou no assunto. Mas, agora, o que acontece agora? Seria simples revanchismo dos derrotados na eleição da Mesa Diretora, dentre os quais há um especializado em vinganças miúdas? Ou, tendo o início nessa motivação, vislumbrou-se atribuir os escândalos do Senado concentrados a um único senador para atingir a estabilidade da instituição e evitar a apuração das responsabilidades por atos acusados de ilícitos e que ele próprio mandou apurar? Ou, como ocorre quando aguçadas ambições políticas, sem respaldo popular, desesperaram-se e pretendem tumultuar a governabilidade do país para colher frutos eleitorais no próximo ano, que os ameaça com estiagem de votos? Ou é tudo isso conexo, misturado, conjugado e orquestrado? A vida pública de Sarney foi sempre pautada pelos valores da democracia. Daí seu apego ao diálogo, ao entendimento, às formas consensuais para a solução dos problemas. Com esse comportamento, fez com que o país, em momentos relevantes de sua história, se reconciliasse e reencontrasse o seu destino de grande nação democrática. No momento em que o Brasil esteve na iminência de sofrer um retrocesso para o totalitarismo, apaziguou as partes em conflito e administrou com humildade os ânimos extremistas que desejavam impedir a volta do Brasil ao Estado de Direito. Convocou a Constituinte, ajudou, com serenidade, os trabalhos da institucionalização do país submetida a enormes embates e tensões. Foi acusado de não dar murros na mesa. Soube conduzir o Brasil para a legalidade estabilizada, da qual desfrutam as novas gerações com plenas liberdades públicas e políticas. Para que serviu tudo isso? Para os jornais aceitarem futricas plantadas sobre atos secretos do Senado ocorridos durante os últimos 15 anos como se todos tivessem sido por ele praticados nos últimos 15 dias? Não se pode admitir que uma obra dessa grandeza e de mais de meio século seja, em minutos, esfarelada por intrigas de interesses subalternos, provocadas por ambições eleitorais a serem tentadas no próximo ano, quando, passadas as eleições, ninguém mais falará em nada nem o acusará de coisa alguma, como não o fizeram durante 30 anos de Congresso e não o haviam feito enquanto não se tornou presidente do Senado em véspera de ano eleitoral. Culpado é o Sarney. Fora, Sarney! Mas como chegar a essa conclusão doidivanas se por ele foram acionados todos os mecanismos de controle e investigação disponíveis, o Ministério Público, o Tribunal de Contas da União e a Policia Federal, para investigar tudo naquele templo de mistérios que é o Senado Federal? Sarney tem algo que não agrada ao imediatismo da crítica popular. Quer fazer tudo dentro da lei porque a lei é a razão isenta de paixão. Contra isso levanta-se o ódio de algumas pessoas, sob a hipócrita justificativa de que a isenção seria assegurada pelo seu afastamento, e não pela aplicação do direito. Na Roma antiga, Sêneca já advertia: a razão quer decidir o que é justo, a cólera quer que se ache justo o que ela já decidiu. Nosso país precisa aprender com as lições do passado. Sarney já foi submetido a um linchamento igual, pelos mesmos políticos, os mesmos veículos de comunicação, com pequenas variações, o mesmo estilo de acusações destituídas de seriedade até pelo volume crescente e diário da campanha sistemática sem verdade alguma que se comprovasse. Tudo igual. O resultado daquela primeira vez levou o Brasil a ser governado por um Fernando Collor. O castigo pode repetir-se. JOSÉ SAULO PEREIRA RAMOS, 80, é advogado. Foi consultor-geral da República e ministro da Justiça (governo Sarney). É autor do livro "Código da Vida".
|