Falta coragem ética aos deputados, afirma filósofo sobre caso Donadon
Fabiana Maranhão
Do UOL, em São Paulo
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Sergio Lima/FolhapressDeputado federal Natan Donadon agradece após votação na Câmara dos Deputados decidir pela não cassação do seu mandato, apesar de estar preso após ser condenado pelo STF.
A decisão do plenário da Câmara Federal de não cassar o mandato do deputado federal Natan Donadon (sem
partido-RO) revela a "falta de coragem ética" dos parlamentares, afirma
Roberto Romano, professor de ética e política da Unicamp (Universidade
Estadual de Campinas). Para ele, o STF (Supremo Tribunal Federal) também
é culpado pela manutenção do cargo de Donadon. "É evidente que é contra
a Constituição que ele continue como deputado."
"Isso passa a imagem do desleixo, da falta de cumprimento do dever e,
sobretudo, da falta de coragem ética dos deputados de assumir suas
atitudes", diz o professor.
Roberto Romano classificou a votação como um "desastre". "O resultado
veio confirmar o desprestígio, a falta de seriedade e de respeito dos
deputados por seus mandatos", afirma.
Condenado pelo STF a 13 anos e quatro meses de prisão por peculato e
formação de quadrilha, Natan Donadon está preso há dois meses no
Complexo Penitenciário da Papuda, em Brasília, após ter se entregado à
Polícia Federal.
Sobre o seu mandato de prisão ter sido expedido à época dos protestos
que tomavam o país, no mês de junho, ele disse que "as vozes das ruas
crucificaram Jesus" e que o Supremo se submeteu à pressão da mídia.
Donadon chegou a mostrar aos deputados as marcas das algemas em seus
braços. "A imagem dele expressa o atual momento da Câmara, a imagem de
um comediante ruim, de uma pessoa que faz um jogo de cena ridículo como
foi ridícula a decisão", atesta o filósofo.
Após a decisão, o presidente da Casa, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN),
determinou o afastamento de Donadon de suas funções e a convocação do
suplente, Amir Lando (PMDB-RO).
"A culpa é do STF"
Na opinião de Roberto Romano, a "culpa" pelo que aconteceu é do STF. "O
Supremo tem votado quase fortemente em favor dos réus do mensalão. Para
resolver o problema deles, decidiu que cabe à Câmara julgar a perda do
mandato. Isso é um absurdo!", classificou o professor.
Ainda segundo ele, se Donadon foi condenado pelo STF, é "evidente que é
contra a Constituição que ele continue como deputado ou qualquer cargo
do tipo", declara.
No julgamento do mensalão, no ano passado, o STF decidiu que
parlamentares condenados perderiam o mandato assim que o processo
transitasse em julgado.
Em agosto deste ano, com dois novos ministros - Teori Zavascki e Luís
Roberto Barroso -, a Corte mudou a interpretação da Constituição no
julgamento na análise de ação penal contra o senador Ivo Cassol (PP-RO),
condenado a quatro anos e oito meses de prisão.
Por isso a cassação do mandato de Donadon teve de ser apreciada na Câmara.
"O escândalo de ontem na Câmara dos Deputados se deve à conivência dos
três Poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário). Os três têm de ser
responsabilizados. Desse episódio, ninguém sai absolvido", concluiu.
Entenda o caso
O deputado foi acusado de participação em desvio de cerca de R$ 8
milhões da Assembleia Legislativa de Rondônia em simulação de contratos
de publicidade. O julgamento dele só ocorreu no STF por ele ser deputado
e ter foro privilegiado.
Após a prisão, a CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) da Câmara
recomendou a cassação por entender que as ações de Donadon, enquanto
diretor da Assembleia Legislativa, configuravam quebra de decoro
parlamentar.
No último dia 14 de agosto, o advogado Gilson Stefanes tentou convencer
os deputados da CCJ da inocência de seu cliente. Durante sua exposição,
Stefanes argumentou que o deputado não cometeu nenhum equívoco durante
seu mandato na Casa Legislativa e, por isso, não deveria ser condenado à
perda de mandato.
Na avaliação do defensor, houve falhas em várias etapas das
investigações que culminaram na condenação do parlamentar no Supremo e
na prisão de Donadon. "Ele foi condenado com uma prova frágil. É uma
pessoa ética, uma pessoa íntegra, uma pessoa que realmente tem
compromisso com o mandato", afirmou o advogado na ocasião.