Suíça ameaça devolver US$ 28 mi a grupo condenado
Autoridades do país europeu alertam governo brasileiro: se caso do 'propinoduto' não for julgado logo no STJ, verba será desbloqueada
06 de outubro de 2013 | 2h 06
JOSETTE GOULARTJAMIL CHADE, CORRESPONDENTE / GENEBRA - O Estado de S.Paulo
A lentidão da Justiça brasileira pode fazer com que
cerca US$ 28 milhões que estão bloqueados na Suíça acabem retornando aos
bolsos de condenados por corrupção, lavagem de dinheiro e quadrilha no
caso que ficou conhecido como "propinoduto", que envolvia fiscais das
receitas federal e estadual do Rio de Janeiro, entre eles Rodrigo
Silveirinha - ligado aos ex-governadores Anthony e Rosinha Garotinho.
As autoridades suíças enviaram um ofício ao governo brasileiro,
datado de 17 de maio deste ano, cobrando uma definição do caso, que já
dura uma década. Alertaram que, pela lei suíça, esse é o prazo limite
para reter o dinheiro no país e que sem uma decisão final da Justiça
terão de liberar os recursos para saque dos donos originais das contas
bancárias.
O Ministério da Justiça repassou o alerta ao Ministério Público
Federal que, na semana passada, ingressou com um pedido de "prioridade
de julgamento" do recurso. Há quatro anos, o processo vai de um gabinete
a outro no Superior Tribunal de Justiça (STJ), sem que seja apreciado.
Já passou pela mão de cinco diferentes relatores, sendo que o último, a
ministra Assusete Magalhães, está com o caso há apenas dois meses. Mesmo
que seja julgado imediatamente pela turma da qual faz parte a ministra
relatora, os quase 70 volumes terão ainda de passar pela análise dos
ministros do Supremo Tribunal Federal.
Em Berna, fontes no governo suíço admitem que não entendem a demora
da Justiça brasileira. Em Brasília, os procuradores se sentem
frustrados, mas não falam oficialmente do caso. O Ministério da Justiça
não deu qualquer posicionamento à reportagem. Já o STJ, questionado
institucionalmente sobre a demora dos processos que chegam à casa, não
fez qualquer comentário.
Condenações. O caso é emblemático pois todos os acusados foram
condenados em apenas seis meses pela Justiça Federal do Rio, ainda em
2003, quando a denúncia foi apresentada à Justiça. Quatro anos depois,
mesmo com todo o questionamento em torno da legalidade do julgamento da
primeira instância (por ter sido tão rápido), todos os acusados foram
novamente condenados no Tribunal Regional Federal da 2.ª Região. Boa
parte deles com penas ainda maiores do que as originais.
Os recursos aos tribunais levaram quase dois anos para serem
admitidos, mas em 2009 chegaram ao STJ. Foi nesta época que o então
ministro da Justiça, Tarso Genro, chegou a comemorar o sinal verde dos
suíços e emitiu um comunicado de imprensa para anunciar que os recursos
seriam devolvidos.
Contudo, meses depois, nenhum centavo entrou nas contas brasileiras
porque a sinalização da Suíça era na expectativa de que o caso fosse
julgado rapidamente no Superior Tribunal de Justiça. Em 2010, mais uma
ação do governo foi conduzida. Mas sem resultado.
Prisão. A ironia, segundo o Departamento da Justiça suíço, é que o
caso ganhou contornos impensáveis e levou a prisões também naquele país.
Cinco banqueiros foram condenados por lavagem de dinheiro, numa ação
contra os bancos que há décadas não se via na Suíça.
O processo ainda confirmou o envolvimento de um banco suíço
diretamente com esquemas de corrupção no Brasil, uma alegação que os
tradicionais estabelecimentos suíços sempre se negaram a confirmar. Os
banqueiros pegaram entre 405 e 486 dias de prisão, além de multas que
variam entre US$ 12 mil e US$ 59 mil.
Todos, porém, já cumpriram suas penas e, nem assim, o processo acabou
no Brasil. Essa não é a primeira vez que a demora da Justiça brasileira
ameaça derrubar todo um processo de investigação e bloqueio de
recursos.
A família do deputado Paulo Maluf também teve contas bloqueadas, em
2001. Dez anos depois, por falta de julgamento, a Suíça ameaçou liberar
os recursos. O Brasil conseguiu manter o dinheiro congelado,
demonstrando que as investigações ainda estavam em curso.