Sexta, 11 de outubro de 2013
"Eles estão anunciando que vão tirar a gente à bala", dizem indígenas Terena
Cerca de 300 indígenas Terena foram atacados por homens armados
em caminhonetes, no município de Miranda (MS), na noite de quarta-feira
(9), depois de terem ocupado 3,2 mil hectares de fazendas que incidem
sobre a Terra Indígena Pillad Rebuá, em processo de demarcação. Ninguém
ficou ferido.
A reportagem é de Ruy Sposati e publicada pelo portal do Cimi, 10-10-2013.
Cápsulas de 9mm foram encontradas no local e entregues à Polícia
Federal. Indígenas temem outro ataque na noite desta quinta-feira (10).
Os Terena exigem que seja instituído o Grupo de Trabalho (GT) para finalizar o processo de identificação e demarcação de Pillad Rebuá.
Segundo os indígenas, depois de terem passado o dia inteiro sendo
intimidados pelo vai-e-vem de caminhonetes e carros na porteira da
fazenda - com homens armados nas caçambas -, a comunidade sofreu três
ataques a tiros durante a noite.
"Nós estamos acampados no entorno da sede da fazenda. As caminhonetes
circulam toda hora pela entrada, na porteira", explica um guerreiro
Terena. "Entre às 8 e 10 da noite, eles atacaram o acampamento três
vezes. Tava tudo escuro, não dava para ver. Os tiros vinham da
porteira".
"No primeiro ataque, nós estávamos cantando e dançando, para
fortalecer a nossa retomada", conta. Foi quando eles ouviram cerca de
quatro disparos, e começaram a correr. "A gente gritava 'abaixa!
abaixa!', ficou todo mundo assustado. Aí as mulheres, crianças e idosos
se esconderam e nós organizamos um grupo de homens pra ficar acordado a
madrugada toda". Durante a madrugada, os carros continuaram rondando a
entrada da propriedade.
"Atiraram para acertar"
Para os indígenas, não resta dúvida de que os tiros não eram apenas
intimidatórios. "Eles atiraram apra acertar a gente sim. Teve uma
senhora que sentiu a quentura da bala. Atiraram contra a gente,
acertaram a casa e o telhado, perfuraram um bebedouro", relata.
Os indígenas fotografaram as marcas de bala e recolheram nove
cápsulas de calibre 9mm, munição de pistola de uso restrito das forças
armadas.
Dois agentes da Polícia Federal estiveram no local, segundo relataram
os indígenas. "Eles explicaram que não vieram ontem porque não tinham
combustível. E hoje [quinta], só vieram para fazer um relato, eles ainda
não tem como dar segurança".
Desde quarta, os Terena aguardam a chegada de uma equipe da Força
Nacional de Segurança Pública, que estaria a caminho da fazenda ocupada.
No entanto, a informação, segundo os indígenas, foi negada pelos
agentes da PF que estiveram na área.
"Falaram que por enquanto nós temos que usar nossa estratégia,
tirando foto. E se eu morrer, para que vai servir essa foto?", questiona
o guerreiro.
"Nosso maior medo é um ataque deles [fazendeiros]. Na cidade, estão
comentando a mesma coisa. Eles estão anunciando que vão tirar a gente à
bala hoje à noite. Precisa vir segurança [Força Nacional e Polícia
Federal] para cá". Os Terena afirmam que pistoleiros ligados aos
proprietários e arrendatários da área ocupada estariam reunidos na
fazenda Jambeira, na outra margem da rodovia BR-262, que corta a terra
indígena.
Em declarações para a imprensa, os ruralistas dizem que se as autoridades não resolverem a questão, eles mesmos vão resolver.
"Nós realmente precisamos de apoio. Nós temos medo também da Polícia
Militar de Miranda. Depois do tiro, pedimos que eles passassem aqui.
Eles passaram com o giroflex desligado. Quem vem com luz desligada, nós
sabemos que é fazendeiro. E os policiais vieram da mesma forma.
Encontraram com a caminhonete que atirou em nós e não fizeram nada. A
gente acha que a polícia está do lado dos produtores rurais. Nós estamos
abandonados. Não temos nenhum amparo, nenhuma segurança. Até agora
ficou tudo bem, mas e hoje à noite? E depois?", conclui.
Contexto
Até as retomadas de ontem, eram 2,2 mil indígenas em 94 hectares,
divididos em duas aldeias, Moreira e Passarinho. A terra indígena teve o
primeiro registro de reconhecimento pelo Estado em 1904. Um processo de
demarcação teve início em 1950, mas não seguiu.
Na semana passada, como parte da Mobilização Nacional Indígena, convocada pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), os Terena realizaram outra retomada na região de Miranda.
A fazenda, com 600 hectares, tem como proprietário Pedro Paulo Pedrossian, filho do ex-governador biônico da ditadura militar, Pedro Pedrossian. A área é parte da Terra Indígena Cachoeirinha, que faz divisa com a Pillad Rebuá.