Domingo, 28 de Junho de 2009 | Versão Impressa
Tratado com Vaticano gera críticas e faz Câmara convocar audiência
Acordo provoca receio de ingerência em temas como casamento, ensino e privilégios para a Igreja Católica
Fabiane Leite e Simone Iwasso
Um acordo entre o Executivo brasileiro e a Igreja Católica pode criar novos obstáculos para divórcios, interferir no ensino fundamental e na arrecadação de tributos. A medida vem levantando críticas entre entidades da sociedade civil, que alertam ainda para a possibilidade de haver privilégios na política de proteção de bens culturais ligados ao catolicismo.
O texto, assinado em novembro do ano passado, após visita do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao papa Bento XVI, não foi discutido com a sociedade pelo Executivo. Enviado ao Congresso Nacional neste ano, na Câmara obteve parecer favorável na Comissão de Relações Exteriores e está pronto para ser colocado em pauta. Mas contestações de grupos levaram a Casa a convocar, para a próxima quarta-feira, a primeira audiência pública sobre o tema.
Entidades dizem, por exemplo, que, ao reforçar que o casamento no religioso tem efeito civil e dispor que sentenças da Santa Sé sobre matrimônios devem ser homologadas segundo a legislação nacional, o acordo poderia dificultar um divórcio. Em tese, um casal poderia solicitar também à Igreja o fim do casamento.
Outro ponto bastante questionado é o que prevê que as escolas públicas ofereçam ensino religioso, católico ou de outras confissões. Para especialistas, o acordo, dessa maneira, passaria por cima do intenso debate na sociedade sobre como deve ser implantado esse ensino (mais informações nesta página).
"Por que o acordo teve uma tramitação sigilosa no Executivo já que estamos em uma democracia, onde a visibilidade dos atos públicos é tão importante?", questiona Roseli Fischmann, professora do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade de São Paulo (USP). "A ambiguidade que tem a Igreja, de ser religião e Estado ao mesmo tempo, acaba dando facilidades para ela se aproximar da ordem jurídica nacional, engolfando-a em aspectos de interesse do Vaticano", destaca.
O presidente da Confederação Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e arcebispo de Mariana (MG), d. Geraldo Lyrio Rocha, reconhece que não houve debate com a sociedade, mas destaca que isso é justificado pela falta de novidade no texto. "O acordo não traz privilégios para a Igreja Católica nem fere a laicidade do Estado, que a Igreja vê com agrado, como conquista do Estado moderno."
TRIBUTOS
Outro ponto contestado do texto é a previsão de isenções fiscais para a Igreja que poderia levar a perdas tributárias para União, Estados e municípios, sem que haja um estudo específico. "Não se tem de forma aberta qual seria a situação da Igreja como proprietária de terras, imóveis e talvez haja perdas importantes para o conjunto da população", afirma Margareth Arilha, diretora executiva da Comissão de Cidadania e Reprodução do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento.
Ainda segundo Margareth, o acordo, se aprovado, trará um ambiente menos propício para a discussão de temas que contrariam dogmas da Igreja, como a interrupção de gestações de anencéfalos, em debate no Supremo Tribunal Federal (STF).
O texto afirma que, uma vez aprovado o acordo, ele poderá ser modificado sem nova votação, apenas com consentimento do Estado brasileiro e da CNBB - o que também causa temores, pois poderão ocorrer acréscimos à concordata.
O arcebispo enfatiza que a proposta foi feita apenas para combater a fragilidade dos documentos que reconhecem o ordenamento jurídico da Igreja no Brasil. "O ordenamento é da época da Proclamação da República."
Para d. Geraldo, outras religiões também podem assinar acertos parecidos - mas não têm prerrogativas, porém, de assinar um acordo bilateral igual, já que apenas a Igreja Católica é também um Estado
O texto, assinado em novembro do ano passado, após visita do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao papa Bento XVI, não foi discutido com a sociedade pelo Executivo. Enviado ao Congresso Nacional neste ano, na Câmara obteve parecer favorável na Comissão de Relações Exteriores e está pronto para ser colocado em pauta. Mas contestações de grupos levaram a Casa a convocar, para a próxima quarta-feira, a primeira audiência pública sobre o tema.
Entidades dizem, por exemplo, que, ao reforçar que o casamento no religioso tem efeito civil e dispor que sentenças da Santa Sé sobre matrimônios devem ser homologadas segundo a legislação nacional, o acordo poderia dificultar um divórcio. Em tese, um casal poderia solicitar também à Igreja o fim do casamento.
Outro ponto bastante questionado é o que prevê que as escolas públicas ofereçam ensino religioso, católico ou de outras confissões. Para especialistas, o acordo, dessa maneira, passaria por cima do intenso debate na sociedade sobre como deve ser implantado esse ensino (mais informações nesta página).
"Por que o acordo teve uma tramitação sigilosa no Executivo já que estamos em uma democracia, onde a visibilidade dos atos públicos é tão importante?", questiona Roseli Fischmann, professora do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade de São Paulo (USP). "A ambiguidade que tem a Igreja, de ser religião e Estado ao mesmo tempo, acaba dando facilidades para ela se aproximar da ordem jurídica nacional, engolfando-a em aspectos de interesse do Vaticano", destaca.
O presidente da Confederação Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e arcebispo de Mariana (MG), d. Geraldo Lyrio Rocha, reconhece que não houve debate com a sociedade, mas destaca que isso é justificado pela falta de novidade no texto. "O acordo não traz privilégios para a Igreja Católica nem fere a laicidade do Estado, que a Igreja vê com agrado, como conquista do Estado moderno."
TRIBUTOS
Outro ponto contestado do texto é a previsão de isenções fiscais para a Igreja que poderia levar a perdas tributárias para União, Estados e municípios, sem que haja um estudo específico. "Não se tem de forma aberta qual seria a situação da Igreja como proprietária de terras, imóveis e talvez haja perdas importantes para o conjunto da população", afirma Margareth Arilha, diretora executiva da Comissão de Cidadania e Reprodução do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento.
Ainda segundo Margareth, o acordo, se aprovado, trará um ambiente menos propício para a discussão de temas que contrariam dogmas da Igreja, como a interrupção de gestações de anencéfalos, em debate no Supremo Tribunal Federal (STF).
O texto afirma que, uma vez aprovado o acordo, ele poderá ser modificado sem nova votação, apenas com consentimento do Estado brasileiro e da CNBB - o que também causa temores, pois poderão ocorrer acréscimos à concordata.
O arcebispo enfatiza que a proposta foi feita apenas para combater a fragilidade dos documentos que reconhecem o ordenamento jurídico da Igreja no Brasil. "O ordenamento é da época da Proclamação da República."
Para d. Geraldo, outras religiões também podem assinar acertos parecidos - mas não têm prerrogativas, porém, de assinar um acordo bilateral igual, já que apenas a Igreja Católica é também um Estado