segunda-feira, 22 de junho de 2009

José Celso de Macedo Soares , escritor.

Artigos: www.imil.org.br

19/06/2009

Coronelismo, enxada e voto

José Celso de Macedo Soares, escritor.

Roubo este título de Victor Nunes Leal em seu memorável “Coronelismo, enxada e voto”, escrito há muitos anos, mas, ainda atual no governo Lula. O “coronel” era o dono da fazenda, do engenho ou o chefe político municipal. A “enxada” era o trabalhador. Este recebia seu pagamento em vales e os descontava na venda - de propriedade do coronel - para garantir sua subsistência. Sempre devedor. O coronel garantia isto… A paga por esta benemerência - o emprego - o coronel cobrava na hora da eleição. Pensa que isto acabou? É só percorrer sertões nordestinos e grotões deste país. Interessante causo narrado pelo jornalista baiano Sebastião Nery - segundo ele, verídico - foi protagonizado pelo “coronel” Chico Heráclio do Rego, de Limoeiro, interior de Pernambuco. À época do episódio, votava-se em cédulas impressas, colocadas pelo eleitor num envelope, que era depositado na urna. O coronel reuniu seus empregados e lhes entregou, um a um, os envelopes fechados com as cédulas de seus candidatos. Aí, era só ir à seção eleitoral e depositar o voto na urna. Um cabra mais ousado resolveu perguntar: “O senhor pode me dizer, pelo menos, em quem vou votar coronel?”. A resposta foi ríspida: “Então, cabra ignorante, tu não sabes que o voto é secreto?”. Com o voto eletrônico, pode parecer que o coronel morreu. Engano. Os “coronéis” continuam vivos. E, sabem quem é o grande “coronel” do Brasil atual? O Senhor Lula da Silva. Só que o engenho ou a fazenda é hoje muito maior: o Brasil inteiro. Para isto, o Senhor Lula está, quase diariamente, em todos os rincões do país, dirigindo-se aos seus “cabras”. E sabem qual é a “enxada”? O Bolsa Família, que hoje já alcança um terço da população brasileira. Já foi estendido aos sem terra do MST, moradores de rua, índios, quilombolas, e não se sabe se vai parar por aí. O que tem isto a ver com eleições?

Vou comentar um episódio do qual participei. Visitando o Maranhão, onde colaboro em programa assistencial, conversando com morador de área pobre, inscrito no Bolsa Família, perguntei sobre as futuras eleições. “Vou votar no Lula ou em quem ele indicar, porque senão vou ficar sem meu Bolsa Família. O candidato da oposição vai me tirar este beneficio”. Aí está. Alguma semelhança com as práticas do coronel Heráclio? Deixo a reposta aos leitores. Aliás, esta tática de atribuir aos adversários intenções falsas, não é privativa do Brasil. Em 1928, candidatou-se à Presidência dos Estados Unidos o governador democrata do Estado de Nova York, Al Smith. A novidade era que, pela primeira vez nos Estados Unidos, se apresentava como candidato um católico. Os seus adversários fizeram campanha dizendo que Al Smith, se eleito, iria proibir a leitura da Bíblia nas escolas, o que era corrente no país de maioria protestante. Resultado: Al Smith foi fragorosamente derrotado. A mentira pegou.

Mas, isso era no tempo em que se propagava que só podia vencer eleições nos Estados Unidos aquele que fosse WASP - White, Anglo-Saxon and Protestant (branco, anglo-saxão e protestante). Em 1961, 33 anos depois, o católico Kennedy se elegeu Presidente, derrubando o “P”, e agora Obama, um negro, liquidou com o “W”, o “A” e o “S”.

Não receio que artimanhas do Senhor Lula garantirão a eleição de seu candidato. O Bolsa Família pesará mais nas regiões pobres do Norte e Nordeste e terá menos influência no Sul-Sudeste. Alem do mais, o Norte-Nordeste tem menos eleitores que o Sul-Sudeste. Basta que as oposições tenham melhor candidato que o governo.

Sou crítico do Bolsa Família, programa assistencialista que não indica saída para os beneficiários. E, os desvios para quem não precisa dele são frequentes, como mostra o noticiário. A pobreza, no Brasil, é um problema sério, e só será diminuída com investimentos maciços em educação. Povo educado não passa fome. E, não adianta o “coronel” Lula usar o Bolsa Família como “enxada”. Não estamos mais no tempo do “coronel” Heráclio. Além do mais, em política, fico com Magalhães Pinto: “Política é como nuvem: hoje está de um jeito; amanhã, de outro”.

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