Prisão de Vaccari amplia ‘fraturas’ do PT e dá combustível à oposição
Senador fala em perda de registro do PT por "ser reincidente", citando Delúbio Soares
Ala progressista do partido se afasta da coordenação nacional, diz especialista
Gil Alessi
São Paulo
15 ABR 2015 - 14:08 BRT
A prisão do tesoureiro do PT, João Vaccari Neto, na manhã desta quarta-feira durante a 12ª etapa da Operação Lava Jato, que investiga o esquema de corrupção e desvio de dinheiro da Petrobras, coloca o PT novamente no olho do furacão. Ele é o primeiro dirigente petista detido por envolvimento no caso. O ex-deputado André Vargas, preso na semana anterior,
já não estava atrelado à legenda pois foi expulso do partido. O
delegado da Polícia Federal Igor Romário de Paula afirmou que além de
"ser mencionado por ao menos cinco delatores como operador do PT no
esquema", existem "provas materiais" do envolvimento de Vaccari nos
crimes apurados. De acordo com o procurador do Ministério Público
Federal Carlos Fernandes Santos Lima, o atual tesoureiro petista
orientava os empreiteiros a pagar as propinas ligadas a contratos com a
Petrobras para empresas com relações com o partido.
Em nova divulgada em seu site, o PT afirmou
que “o partido e Vaccari reafirmaram, em sucessivas ocasiões, que as
doações recebidas pela legenda são legais e foram devidamente declaradas
à Justiça Eleitoral”, e que os advogados do tesoureiro irão recorrer da
decisão da Justiça.
A notícia chega em um momento delicado para o Governo, no qual os
grandes partidos da oposição ainda não apoiam abertamente o discurso do
impeachment que ganhou as ruas nos protestos de domingo, mas já procuram
brechas para embasar a medida, aproximando-se, inclusive, dos movimentos que pedem a saída da presidenta. Segundo a Folha de S.Paulo,
um advogado ligado ao ex-presidente Fernando Henrique Cardoso teria
encomendado ao jurista Ives Gandra um parecer sobre o assunto. Nesta
quarta, o senador Ronaldo Caiado (DEM-GO) divulgou nota dizendo que “o
partido é reincidente ao ter o tesoureiro Vaccari, sucessor de Delúbio
Soares [condenado no mensalão], flagrado e preso por arrecadar dinheiro
desviado de empresas públicas para alimentar campanhas”. De acordo com o
parlamentar, diante deste cenário, "tudo caminha para que o PT perca
seu registro”.
Mas a oposição não é o único problema que o PT terá que enfrentar.
“Há uma crise dentro da legenda que já vem crescendo desde o mensalão. O
partido não é hegemônico, existem várias correntes e tendências, e
muitas delas estão insatisfeitas com a ala pragmática - que inclui a
direção nacional”, diz o professor de Ética e Política da Unicamp
Roberto Romano. Para ele, o maior prejudicado pela prisão do tesoureiro do PT
será o próprio partido, que sofrerá um aprofundamento de suas fraturas
internas. “A Dilma Rousseff tem pouca coisa a perder, já que
praticamente seu trabalho de governante está 'terceirizado' e sua popularidade é baixíssima”, afirma.
Para Romano, os setores católicos e progressistas já têm - desde o
mensalão - se mantido afastados da coordenação da legenda, personificada
atualmente na figura do presidente nacional, Rui Falcão. “Os militantes
de base, que fazem trabalhos nas periferias e no campo, por exemplo,
percebem essa separação entre a cúpula do partido e suas ideias. E isso
torna cada vez mais difícil para eles justificar essas decisões direção
nacional”, afirma. Soma-se a isso a prisão do tesoureiro do partido e a
iminente crise das correntes petistas ligadas ao sindicalismo, abaladas
pela aprovação na Câmara do projeto de lei da Terceirização, e o
resultado é “um aprofundamento das fraturas já existentes no PT”.
O professor acredita que apenas a figura do ex-presidente Luiz Inácio
Lula da Silva pode manter a unidade do partido. “Historicamente, ele tem sido o cimento que une as diferentes tendências”,
afirma. Padrinho político da presidenta Dilma, Lula tem bom trânsito
entre a ala sindicalista, pragmática e também conta com a simpatia dos
movimentos sociais e da corrente católica do PT.
Romano acredita que, por já enfrentar grave crise de popularidade, a
imagem de Rousseff não sofrerá novos abalos após a prisão de Vaccari.
“Ela tem pouco a perder, tem pouca ‘gordura para queimar’”, afirma,
lembrando que ela ‘terceirizou’ parte do Governo ao entregar a articulação política para seu vice, Michel Temer
(PMDB), e que o Planalto continua ‘refém’ do presidente da Câmara,
Eduardo Cunha, e do Senado, Renan Calheiros, ambos também peemedebista.
“O ônus da prisão recai, principalmente, sobre a direção do partido,
que não soube adotar medidas profiláticas a tempo”, diz Romano. Desde
que Vaccari foi citado pelos delatores da Lava Jato, uma ala do PT
defendeu seu afastamento do cargo para minimizar danos à imagem da
legenda. Para o professor, a demissão do tesoureiro poderia ter um custo
político muito alto. “A direção nacional precisa pesar cada gesto, e
analisar como ele será lido por aliados e adversários. No caso em
questão, existe o principio básico da inocência até que seja julgado”,
diz. De acordo com ele, no Brasil existe uma tendência a que se levante
suspeição sempre que essa garantia constitucional é evocada: “Qualquer
sociedade onde a acusação equivale a culpa é uma sociedade em que a
ordem democrática está sendo ameaçada”.