Inca se posiciona pela 1ª vez pela redução do uso de agrotóxicos
Clarissa Thomé - O Estado de S. Paulo
08 Abril 2015 | 12h 13
Instituto Nacional do Câncer afirma que não se trata de 'achismo ou por questões ideológicas', mas sim de evidências científicas
Atualizada às 18h55
RIO - O Instituto Nacional do Câncer (Inca) recomendou nesta
quarta-feira, 8, a “redução progressiva e sustentada” do emprego de
agrotóxicos nas plantações, diante das evidências de que a exposição aos
pesticidas está ligada a casos de câncer. É a primeira vez que a
instituição se pronuncia oficialmente contra o uso de agrotóxicos (clique aqui para ler a íntegra do documento). O Brasil é o maior consumidor desses produtos químicos no mundo.
“O Inca se posiciona claramente não por achismo ou por questões
ideológicas. O instituto segue evidências científicas, fruto do trabalho
da sua equipe e de cientistas do mundo inteiro que tiveram seu
trabalhos reavaliados pela Agência Internacional de Pesquisa em Câncer
(Iarc, na sigla em inglês), ligada à Organização Mundial de Saúde”,
afirmou Luiz Felipe Ribeiro Pinto, coordenador de Ensino do Inca e único
representante da América Latina na Iarc.
O documento do Inca chama a atenção para o fato de o Brasil ser o
maior consumidor mundial de agrotóxicos, com consumo médio mensal de 5,2
quilos de veneno agrícola por habitante. A venda de agrotóxicos no país
passou de US $ 2 bilhões para US $ 8,5 bilhões entre 2001 e 2011.
“É importante destacar que a liberação do uso de sementes
transgênicas no Brasil foi uma das responsáveis por colocar o país no
primeiro lugar do ranking de consumo de agrotóxicos, uma vez que o
cultivo dessas sementes modificadas exigem o uso de grandes quantidades
desses produtos”, diz o texto.
As intoxicações agudas por agrotóxicos atingem os trabalhadores
rurais, que sofrem cólicas, diarreias, dificuldades respiratórias,
convulsões e morte. A exposição prolongada pode causar infertilidade,impotência, abortos, malformações e câncer, informa o documento.
“Há subnotificação da intoxicação aguda porque nos serviços de
saúde muitas vezes os sintomas são confundidos com uma virose. Em 2013,
houve 5,5 mil casos registrados. A OMS estima que para cada caso
notificado, outros 50 não foram comunicados”, afirmou Márcia Sarpa de
Campos Mello, pesquisadora do Inca.
Ribeiro Pinto informa que as pesquisas mostram “associações
bastante contundentes” entre a exposição a alguns pesticidas e o
surgimento do linfoma não Hodgkin (sistema linfático) e cânceres de
pulmão e próstata. “Temos que lembrar que houve explosão do uso de
pesticidas em dez anos. Se pensarmos que o câncer ocorre 20 a 30 anos
depois da exposição, a gente ainda verá o efeito desse aumento grande do
uso de pesticida daqui a uns 15 ou 20 anos”, afirmou.
Em defesa. Em nota, a Associação Nacional de
Defesa Vegetal, que reúne empresas produtoras de agrotóxicos, cita que
“todos os defensivos agrícolas autorizados para o uso em nosso País
passam pelo crivo e aprovação de três ministérios”.
“Levada ao extremo, a volta da lavoura arcaica - que alguns
defensores tanto admiram no conforto dos seus escritórios bem
refrigerados - aniquilaria a competitividade dos campos, sobretudo dos
pequenos lavradores - cerca de 70%, dos cinco milhões de agricultores do país”, diz o texto.