quarta-feira, 29 de abril de 2015

TERRAÇO ECONÔMICO.

O governo Dilma é responsável único pela corrupção?

Será que a corrupção no governo Dilma de fato foi maior do que nos governos anteriores ou foi a percepção da corrupção que aumentou significativamente? 
 
Por Terraço Econômico  
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Na última grande manifestação contra o governo Dilma em São Paulo, ocorrida em 12/04, a grande motivação mencionada pelos participantes foi a irritação com corrupção, segundo o Datafolha [1]. Considerando os números apresentados pelo instituto de pesquisa, 33% dos entrevistados pensavam dessa forma, sendo esta preocupação mais relevante que o próprio impeachment da presidente (27%), contra o PT (20%) ou contra os políticos em geral (14%).

Mas cabe aqui uma pergunta: será que a corrupção no governo Dilma de fato foi maior do que nos governos anteriores ou foi a percepção da corrupção que aumentou significamente?

Um livro bastante interessante é “Corrupção: Entrave ao Desenvolvimento do Brasil”, organizado por Oscar Pilagallo, no qual especialistas em corrupção fornecem informações valiosas em um seminário organizado pelo Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial (ETCO). Roberto Romano, professor de filosofia e ética da UNICAMP, dá sua contribuição na diferenciação dos conceitos mencionados na questão levantada no parágrafo anterior:
Dilma pensativa - 29/11/12
“O problema que me parece mais grave tem relação com os dois eixos temporais: o da percepção e o da geração da corrupção. O eixo diacrônico – o da imprensa, das autoridades, da promotoria, da polícia etc – vem depois de outro. Mas, como se trata de um sistema, temos que levar em conta o sincronismo. Ou seja, no mesmo momento em que um escândalo está sendo denunciado, todos os outros estão operando, o que muitas vezes não é levado em conta.” (Página 54)
Levando a teoria para prática, nota-se que a história contada pelo Professor Romano faz bastante sentido. No momento que os holofotes estavam direcionados para o julgamento do Mensalão, em 2012, a corrupção rolava solta nos contratos com as grandes empreiteiras com a Petrobras, processo que, quando descoberto, foi nomeado carinhosamente de “Petrolão”. No instante em que foram recebidas as denúncias do Mensalão Mineiro em dezembro de 2009 pelo STF, as fraudes nos contratos com a CPTM e Metrô ainda estavam debaixo do tapete.

Logo, o que fica claro é que apenas uma parcela da corrupção é descoberta, enquanto que, possivelmente, a maioria dos casos de desvios intencionais de recursos públicos podem nunca ser revelados.

O fato é que boa parte dos brasileiros cita a indignação com a corrupção como um dos principais motivos para os protestos observados nos últimos meses. Mas será que a culpa pode ser totalmente atribuída a Dilma Rousseff? A história parece sugerir o contrário.

Embora o julgamento do Mensalão tenha ocorrido em 2012, o fato em si, deflagrado pelas delações de Roberto Jefferson ocorreram em 2005, no governo Lula. O escândalo da Petrobras, descoberto recentemente através dos desdobramentos da Operação Lava-Jato, ocorria a pelo menos 15 anos, conforme depoimentos coletados com ex-diretores da estatal realizadas por meio de Delação Premiada [2]. A própria “faxina” nos ministérios ocorrida no início do governo Dilma em 2012, com a demissão de ministros como Carlos Lupi (Trabalho) e Pedro Novais (Turismo), por exemplo, estava pautada em denúncias ocorridas em governos anteriores.

Antes de continuar, cabe aqui uma ressalva: não estou eximindo a nossa presidente de culpa; afinal, como líder da nação, ela tem “responsabilidade solidária” no que ocorre a sua volta. Estou argumentando apenas que Dilma Rousseff pode estar carregando um fardo deixado por governos anteriores, uma sujeira colocada debaixo do tapete que ninguém teve coragem e vontade de investigar. E se esses casos nunca fossem descobertos? E se o poder de investigação fosse menor? A corrupção seria lembrada pela sociedade?
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“Não sei mais o que é sujeira e o que é tapete”. Foto: O Globo

O Índice de Percepção de Corrupção

Dessa forma, nos últimos anos notou-se uma elevação na percepção de corrupção em terras tupiniquins. Felizmente, existe uma extensa literatura que trata das motivações, incentivos e ocorrência de atividades corruptas em diversos países. A Transparência Internacional [3] divulga anualmente um índice que compara a percepção de corrupção ao redor do mundo, conforme mostra o gráfico abaixo, válido para 2013:
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Quanto mais escura a cor, maior o índice de percepção de corrupção. Mapa: Transparência Internacional

Considerando os 175 países pesquisados, o Brasil ocupa a 69ª posição, dividindo o “meio da tabela” com Bulgária, Grécia, Itália, Romênia, Senegal e Suazilândia, com 43 pontos na escala de pontuação vai de 0 a 100, na qual 0 representa um país altamente corrupto e 100 um país altamente livre da corrupção, avaliada no setor público. Em 2012, a pontuação havia sido parecida - 42 pontos – o que está dentro da margem de erro.

Os países com maior pontuação (5 primeiros na ordem: Dinamarca, Nova Zelândia, Finlândia, Suécia e Noruega possuem alto IDH e são considerados democracias perfeitas, conforme metodologia apresentada pelo índice de democracia [4] da Economist Intelligence Unit, uma empresa privada com sede no Reino Unido, que mede o estado da democracia em 167 países. Por outro lado, os piores classificados (5 últimos: Quirguistão, Ucrânia, Nigéria, Bolívia e Camarões) são caracterizados pelo médio/baixo IDH e por regimes políticos híbridos ou autoritários.

Mas e agora, Rousseff?

A verdade é que o Brasil avançou consideravelmente no combate a corrupção, inclusive no que se refere a punição dos envolvidos: quem imaginaria presidentes e diretores de empreiteiras presos por tanto tempo? O famoso “Você sabe com quem está falando?” pode finalmente passar para os livros de história brasileira e deixar de ser ouvido no nosso cotidiano.

O país aprovou nos últimos anos, através de apoio popular, a Lei da Compra de Votos e a Lei da Ficha Limpa. Também podem ser mencionadas a Lei de Acesso à Informação e a participação, na figura de signatário, da Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção.

Todos esses mecanismos de monitoramento podem ter aumentado o acesso dos brasileiros às atividades dos agentes políticos, principalmente a Lei de Acesso a Informação. Dessa forma, Dilma Rousseff pode estar, como dito anteriormente, isolada no que diz respeito a responsabilização da corrupção, embora os governos anteriores tenham corresponsabilidade no cenário atual.

Mas uma coisa é certa: que ainda há muita sujeira embaixo do tapete e o certo é tirá-la de lá, para o bem dos brasileiros.

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Notas
[1] http://www1.folha.uol.com.br/poder/2015/04/1615756-irritacao-com-corrupcao-foi-motivacao-para-maioria.shtml[2] http://politica.estadao.com.br/blogs/fausto-macedo/esquema-criminoso-atuava-ha-pelo-menos-15-anos-na-petrobras-afirma-procuradoria/[3] Para mais detalhes sobre o Índice de Percepção de Corrupção ver o link:
http://www.transparency.org/cpi2014/results[4] Para mais detalhes sobre o Índice de Democracia ver o link:
http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2015/01/150119_democracia_ranking_economist_lgb