quarta-feira, 25 de fevereiro de 2009

Resposta a José Dirceu (2)


Resposta a José Dirceu (2)

Roberto Romano

Discutamos o Congresso Nacional em alto nível. Nele, temos amostra fiel dos políticos brasileiros. Ninguém mais indicado para dizer do que o presidente do TSE, o ministro Ayres Brito, o qual decidirá, com seus pares, o processo do “mensalão”: “Há políticos que fazem de sua caneta um pé de cabra”. O juiz não indica o número dos que usam tal engenhoca: 300, como falou alguém, ou mais? Brito explicita: “Há muitos políticos que fazem de tudo para chegar às maiores alturas para fazer as maiores baixezas”. (Ag. Estado, 4/10/2008). Com a impunidade garantida pelo privilégio de foro, o par altura-baixeza flui sem peias.

Adianta o ministro: a corrupção “abate de uma só cajadada” as bases constitucionais da ética e da eficiência exigidos na república. E afirma que o caixa dois é o câncer das campanhas políticas. Se tivesse dito que “alguns”, ou “certos”, políticos usam canetas como pé de cabra, seria árduo invocar tais juízos. Mas o qualificativo “muitos” nos lábios do juiz prudente não permite hesitar. O ex-Chefe da Casa Civil diria que o ministro alardeia mentiras, deita “falação”? Jamais. Mesmo porque ele será julgado pelo autor da fórmula.

Dirceu quer, de maneira grotesca, inverter os papéis. Explicações são devidas por ele e outros cassados por falta de decoro. Retorno ao Congresso. Na ciência e tecnologia basta lembrar o corte de 1,1 bilhão de reais, valor 10% maior do que a receita da Fapesp, agência líder no financiamento de pesquisa. A medida recebeu ataques da SBPC e da Academia Brasileira de Ciências (ABC). Mas não apenas cientistas se ergueram contra o ato. Sérgio Rezende, ministro da Ciência e Tecnologia, taxou de irresponsável o sumiço de 18% em sua pasta. O relator (do PT), segundo o ministro, mostrou “falta de responsabilidade com o futuro do Brasil”. Leia, Dirceu, o Jornal da Ciência (22/1/2009) e o boletim da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior. Feita a proeza, surge a busca de remédios para os danos causados à pesquisa. O Congresso, nessa matéria, não merece elogios.

Ao contrário de me atribuir a pecha de mentiroso - ataque imprudente à honra de um professor titular, cargo obtido por concurso público, com mais de 30 anos de serviço, provas rigorosas de ilibada reputação profissional - fosse Dirceu aos laboratórios, a testemunhos e dados. Dei a resposta no diapasão usado por ele: à sua grosseria de ex-onipotente, acirrada pelo nervosismo pré-julgamento, apenas insanos responderiam com puras análises lógicas. O primeiro vitupério do seu blog, sem ter ele sido mencionado por mim ao Globo, evidencia o nível próprio aos desabridos.

Sobre segurança Dirceu também me acusou, sem provas, de mentiroso. O Estado deve proteger a vida. No Brasil, para cada agente público de segurança há três privados. Temos 1,7 milhão de vigilantes contra 602 mil policiais civis, militares, federais e bombeiros (fonte: Polícia Federal). Entre 2003 e 2006 a segurança pública aumentou 5%, a particular 40%. O Congresso corrige a falha? Vejamos. Em 2008 T. Genro previa corte de 140 milhões para 2009, no maior programa público de segurança. O corte “no Congresso foi bem maior, chegou a cerca de R$ 250 milhões” (UOL,19/01/09). O estímulo a policiais será de 472 milhões, após o corte no Congresso “de aproximadamente R$ 148 milhões” (Contas Abertas, 16/2/2009). Alguns parlamentares querem mudar o quadro, debalde. Sobre o tema, leia Dirceu, Controle Judicial da Segurança Pública, livro de Valter Foleto Santin.

Dirceu confunde Parlamento e facções corruptas que arruinam a instituição. Mentira grossa é aceitar verbas indenizatórias escondidas, receber auxílio paletó e sinuosas verbas de gabinete, fruir do privilégio de foro sem o qual políticos improbos estariam presos, louvar um Congresso que se identifica aos Sarney, Renan e Collor, aos castelos escondidos do fisco. Faça Dirceu o que quiser da ética, hoje bandeira rota de seu partido, suplique votos dos deputados para sua anistia no Congresso, mas não brinque, para tal fim, com a honra profissional alheia. A resposta será pronta.