segunda-feira, 18 de maio de 2009

De Recife, uma análise do comportamento presidencial diante da CPI Petrobrás

O medo do palco eletrônico

Em plena depressão cívica sobre os representantes do povo no Congresso Nacional, o presidente Lula demonstra estar morrendo de medo de uma CPI. E por que um presidente nas nuvens da popularidade temeria a instalação de outra comissão de inquérito parlamentar, formada por integrantes de um Legislativo que, a cada ano que passa, não se dando ao respeito, não é respeitado pela população?

A resposta é simples, se lembrarmos o efeito devastador que outra CPI, a dos Correios, teve sobre o partido governista: depois de Roberto Jefferson e Marcos Valério, o PT de Lula nunca mais foi o mesmo. Perdeu nomes históricos e viu ceifada a inocência que movia boa parte de seus militantes.

Agora, a ameaça de holofotes em cima da caixa-preta da Petrobras traz motivo de sobra para assustar o presidente. Lula sabe que a barreira partidária foi destruída, e os danos porventura causados por um movimento erosivo semelhante ao da CPI dos Correios irão bater no governo, e não no PT.

Naquela época, Lula também quis jogar o povo contra o Congresso, gabando-se de honesto e desqualificando os parlamentares. Hoje, teoricamente, isto seria mais fácil, uma vez que se imagina que os congressistas agonizam no fundo do poço (da falta de ética e do excesso de impopularidade). Mas o Senado, onde a oposição ainda respira, sonha com uma CPI para virar o jogo, melhorar a imagem e, de quebra, fazer estragos no governo de palanque que ocupa o Palácio do Planalto.

Então, por que assusta a CPI da Petrobras? Porque há o risco, ainda que mínimo, de repetir o fenômeno de mobilização midiática do mensalão. Porque podem surgir na tela dos lares e vitrines do país outros valérios, delúbios e silvinhos. Porque tudo que o governo não precisa é de um Parlamento ressuscitado e de um Executivo enfraquecido às vésperas das eleições de 2010.

No auge da crise dos Correios, o senador Delcídio Amaral, petista que presidia a CPI, deu entrevista criticando a postura de confronto adotada por Lula, e declarou o seguinte: “O país está conectado, a tensão é muito grande. Não se pode fazer coisas erradas”. Delcídio disse que o presidente não devia ter culpado o Congresso por todos os males da República. Certamente o petista sabia do que falava.

O Brasil conectado e tenso aguardava as sessões transmitidas ao vivo como expiações públicas de culpa. Deputados choravam no plenário. Militantes boquiabertos provavam o gosto da desilusão, enquanto os cínicos buscavam razões ao lado e no passado para não largarem o osso.

É provável que uma CPI como aquela seja impraticável em 2009. Ao invés de espanto, a apatia domina a platéia, e raros senadores habilitam-se a postar a bandeira da ética.

Mas não se deve menosprezar o poder do palco eletrônico. Chamem-no de circo, comparem-no a uma espécie nova de inquisição... o fato é que a CPI promove, sim, a diversão e o julgamento: quando não aparecem culpados, um cheiro misto de decepção e pizza percorre a opinião pública. As pessoas esperam da CPI muito mais que a apuração de um “fato determinado”. Querem a confirmação das desconfianças, o desenrolar do fio da suspeita e, se possível, a encarnação dos demônios – e vê-los exorcizados no palco da CPI.

O primeiro candidato a demônio é o presidente da Petrobras. José Sergio Gabrielli acercou-se do rei da mídia maranhense para afirmar que, abre aspas, “CPI é para investigar fatos concretos. Uma CPI que não tem fatos concretos para investigação serve como palco para grandes denúncias de tudo que pode acontecer”. Para Gabrielli, sem fatos concretos a CPI vira palco de “espetáculos midiáticos”.

São os fatos concretos que determinam o tamanho do espetáculo e o alcance midiático de um inquérito parlamentar. A CPI é um fato que a mídia transmite. Se a TV Senado vai ou não voltar a ser uma campeã de audiência, caso vingue a CPI, dependerá dos fatos concretos que a Petrobras esconde ou não esconde – e não dos virtuoses em suas performances televisivas.

Fábio Lucas é jornalista e mestre em Filosofia.