A CULTURA DA LENTIDÃO
“Tudo vem de Brasília, tudo volta para Brasília”
ENTREVISTA Roberto Romano, professor da Unicamp
Estudioso de temas relacionados a Estado e Igreja, o professor de ética e política da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Roberto Romano, alerta que a burocracia, o centralismo e a impunidade emperram os serviços públicos. Doutorado em Filosofia pela École des Hautes Études en Sciences Sociales (França), diz que governantes brasileiros não deveriam ser protegidos pelo foro privilegiado quando falham. Em outros países, autoridades são levadas a tribunais para responder por seus erros. Confira a entrevista concedida por Romano desde São Paulo, por telefone.
Diário Catarinense – O Estado brasileiro é lento?
Roberto Romano – Em primeiro lugar, é preciso levar em conta a grande extensão do território nacional. Responsabilidades deveriam ser divididas, com autonomia a estados e municípios. Mas ocorre que no Brasil é tudo centralizado. Não existe a prática da federação, à diferença do que ocorre nos EUA e na Europa.
DC – Como o centralismo se reflete em estados e municípios?
Romano – As leis, por exemplo, desconsideram diferenças regionais. Lei editada em Brasília vale para Manaus e para Porto Alegre. Isso gera insegurança jurídica. Um governador ou prefeito nunca pode ter certeza de estar operando no seu âmbito. Tudo vem de Brasília, tudo volta para Brasília.
DC – O centralismo explicaria a lentidão no agir?
Romano – A máquina burocrática federal, por maior que seja, jamais dará conta de tudo na aplicação das políticas públicas. Temos um país imenso, cuja população cresceu e ocupou o interior, mas uma estrutura arcaica e absolutista de governo.
DC – Os prefeitos e os governadores não podem agir?
Romano – É como dizem, o Brasil é uma suposta federação, um império de verdade. Estados e municípios não têm autonomia. Estão dominados por uma máquina que virou burocraticamente monstruosa.
DC – Por que as obras demoram a ser concluídas?
Romano – São vários os componentes. As empreiteiras se tornaram problema sério desde que passaram a ser fornecedoras do governo. Há as licitações, com trâmites que demoram séculos. Uma obra, iniciada como prioridade no governo anterior, acaba sendo preterida. E não há elemento que constranja o novo governo a continuar a obra anterior. Não existe a ideia de planejamento obrigatório. É falta de prudência, desperdício.
DC – Os governantes são cobrados por seus atos?
Romano – Em outros países, como na França, onde vivi, governantes são responsabilizados diante de tribunais e da população. Aqui, as autoridades estão protegidas pelo privilégio do foro. Se não temos o princípio da responsabilização, quem irá responder por uma obra que não terminou? Ninguém.