Acusado em escândalo vira assessor da Receita
Ronaldo Medina é apontado pelo Ministério Público como um dos responsáveis por norma que facilitou importação de máquinas de jogos
O novo secretário da Receita Federal, Carlos Alberto Barreto, nomeou para sua assessoria pessoal um colega que responde a processo por supostos atos de improbidade administrativa, num caso que foi escândalo anos atrás. Ronaldo Medina é apontado pelo Ministério Público (MP) como um dos responsáveis por uma norma técnica supostamente destinada a facilitar a importação de máquinas de jogos de azar, que é proibida no País.
Medina foi nomeado para a assessoria de Carlos Alberto Barreto no dia 25 de março. Ex-secretário da Fazenda do Distrito Federal no governo de José Roberto Arruda, ele já tinha ocupado outros cargos de destaque no Fisco.
Agora, será um dos homens de confiança do secretário da Receita e terá contato com as discussões mais importantes do País em matéria tributária. "Esse processo do Ministério Público contra mim é um erro", diz Medina.
O secretário da Receita respondeu, por meio de nota, que as investigações internas não encontraram "motivação suficiente" para arrolar Medina e que, apesar da acusação do MP, não seria justo impedir sua nomeação "pois deve prevalecer a presunção de inocência até que ocorra a manifestação final do mérito na esfera judicial".
Norma viciada. No centro da confusão está a Solução de Consulta 9 (SC 9) - norma técnica produzida na área então chefiada por Medina, no final de 2002.
Segundo o MP, essa norma enquadrava máquinas de jogos - como videopôquer e videobingo - na mesma categoria dos computadores, para fim de importação. Teria sido feita sob medida para empresários do ramo de jogos, que a usaram na tentativa de liberar máquinas apreendidas no Aeroporto Internacional do Rio de Janeiro. A tentativa falhou porque fiscais do Rio não aceitaram o teor da SC 9 e o caso virou escândalo.
Acusados de produzir uma norma viciada, quatro funcionários da Receita, entre eles Medina, respondem a processo na 7.ª Vara da Justiça Federal no Distrito Federal. Um deles já foi demitido da Receita. E a SC 9 acabou sendo revogada, mas só depois que o episódio veio a público, pela imprensa.
"Associação criminosa". Segundo o Ministério Público, além de aprovar a SC 9 quando era coordenador-geral do Sistema Aduaneiro, Medina teria ignorado quatro avisos diferentes de que a norma era irregular.
"O ato administrativo ilegal foi editado com o nítido apoio dos auditores réus e contou com a cobertura do coordenador-geral aduaneiro, Ronaldo Lázaro Medina, cuja atuação decisiva contribuiu para viabilizar o propósito ilícito da associação criminosa", afirma a acusação das procuradoras da República Valquíria Quixadá e Raquel Branquinho.
"Não tive participação na edição dessa norma. Ela foi aprovada por outra funcionária que tinha delegação para isso", afirma Medina. Sobre sua assinatura junto à norma publicada no Diário Oficial da União, Medina diz: "É o sistema eletrônico. Ele coloca automaticamente o nome da pessoa que coordena a área". Medina também nega ter ignorado avisos de que a SC 9 estaria viciada.
"Não tratei a coisa levianamente como estão dizendo", afirma Ronaldo Medina. "Eu estudei, me aprofundei e conclui que a norma estava certa. Aquilo é computador, uma máquina de processamento de dados. Quem determina como será usada é o ser humano."
Para Roberto Romano, professor de Política e Ética da Unicamp, dar ou não um cargo estratégico para um servidor nessa situação não é uma decisão fácil.
"Ao mesmo tempo em que não se pode cortar a carreira de uma pessoa em razão de um processo em andamento, essa questão não é apenas jurídica, é também uma questão de prudência", diz o professor. "É uma situação difícil."
PARA ENTENDER
Norma permitia importação de máquina ilegal
A Solução Consulta 9 (SC 9) foi produzida dentro da Receita Federal com base numa fraude. A consulta havia sido feita em nome da Federação Brasileira das Empresas Lotéricas (Febralot), mas a assinatura do presidente da entidade era falsa. De acordo com as investigações, a verdadeira interessada era a International Gaming Technology (IGT), dona das máquinas presas no aeroporto do Rio.
Para o Ministério Público Federal, a SC 9 teria sido produto de um conluio entre funcionários da Receita Federal e empresários do ramo de jogos, que queriam importar equipamento proibido.
O objetivo da SC 9 teria sido abrir uma brecha para que essas máquinas entrassem no País. A tentativa foi frustrada, segundo o raciocínio do MPF, porque em fevereiro de 2003 auditores fiscais do Aeroporto Internacional do Rio de Janeiro barraram a entrada de dez máquinas de jogos trazidas dos Estados Unidos. Para tentar liberar as máquinas, a IGT apresentou a tal SC 9.