quarta-feira, 25 de setembro de 2013

O Globo, 25/09/2013

Especialistas criticam partidos criados como ‘negócio’

  • TSE aprovou a criação da 32ª legenda no Brasil
  • Cientistas políticos dizem que estranham aprovação de PROS e Solidariedade e dificuldades da Rede Sustentabilidade
Jaqueline Falcão (Email · Facebook · Twitter)
Marcelle Ribeiro (Email · Facebook · Twitter)

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SÃO PAULO - Ao mesmo tempo em que acreditam que a criação de novos partidos permite maior representatividade de diferentes correntes políticas no país, cientistas políticos ouvidos pelo Globo criticam legendas formadas apenas para negociar cargos e tempo no horário eleitoral na TV. Na terça-feira, o Tribunal Superior Eleitoral autorizou a criação de mais dois partidos no Brasil, que agora tem 32 legendas: o Partido Republicano da Ordem Social (PROS) e o Solidariedade. Ambos estavam envolvidos em suspeitas de irregularidades na obtenção de assinaturas para suas fundações.

O Solidariedade é ligado ao movimento sindical e tem como organizador o deputado e presidente da Força Sindical, Paulo Pereira da Silva (PDT-SP). O PROS servirá como uma janela para troca-troca partidário. A expectativa é que, na próxima semana, o Tribunal discuta ainda a criação do Rede Sustentabilidade, idealizado pela ex-senadora Marina Silva. Especialistas viram como “estranha” a autorização do TSE ao Solidariedade e ao PROS ao mesmo tempo em que a Rede encontra dificuldades para aprovar assinaturas.


Para Roberto Romano, professor de Ética e Política da Unicamp, quanto mais partidos políticos disputarem o voto do eleitor, melhor. O problema é como essas novas legendas são "produzidas".

— Já tem cúpula com interesses determinados. O Solidariedade já tem até aliança, tudo pronto. Quem assinou pela criação não foi consultado sobre programa, estratégia de aliança, que são essenciais para existir um partido — avalia Romano.

Para ele, o movimento para se criar um novo partido deve vir de baixo para cima, não o contrário.
— Isso também aconteceu no caso da Rede, da Marina Silva. Mas sabemos que o programa político é a defesa do meio ambiente. No caso desses dois novos partidos é a velha receita: caciques que vão tomar conta, que vão negociar cargos nos poderes municipal, estadual e federal. Não vejo nada de novo nesses dois partidos criados — diz Romano.

Na opinião dele, os dois estão vindo à tona com "a benção da Justiça Eleitoral apenas como coadjuvante de um quadro partidário já existente".

Para o professor de Ciência Política da Fundação Getúlio Vargas em São Paulo (FGV/SP) Cláudio Couto, se a princípio a existência de partidos diferentes traz mais representatividade à população, é preciso questionar se faz sentido criar mais legendas.

— A questão é saber se a criação obedece à representatividade ou se é um negócio político. Há partidos que são voltados para a venda de espaço na TV. Tem partido sem consistência que fala, no rádio, “filie-se e concorra”. Isso é fonte de renda para o partido e para quem controla ele. E o indivíduo com pretensões eleitorais ilusórias se candidata. Por outro lado, a meia dúzia de votos ajuda a eleição de outros cujas pretensões não são ilusórias — disse Couto.

O professor da FGV-SP diz que o excesso de partidos eleitorais na campanha eleitoral pode dificultar a compreensão do eleitor.

— Entender tantos partidos é difícil. É como uma pizzaria que oferece 70 tipos de pizza. O cliente fica confuso e escolhe sempre os mesmos sabores. É muito ruído, excesso de informação. Acho que não devemos ter um número limite mágico, mas tem que haver instituições que desincentivem a multiplicação desenfreada — disse Cláudio Couto.

Cláudio Couto ressalta que o TSE tem sido excessivamente rígido em relação à aprovação da criação da Rede Sustentabilidade.

— Causa estranhamento porque eles são tão rígidos para a Rede e não para esses dois (Sustentabilidade e PROS), que são menos consistentes. Me estranha esse rigor excessivo — disse Couto.

Cientista político e professor aposentado da USP, Renato Janine Ribeiro diz que as dificuldades enfrentadas pela Rede ao mesmo tempo em que PROS e Sustentabilidade são aprovados criam uma situação “paradoxal”.

— Aparentemente eles (Sustentabilidade e Pros) cumpriram a lei. O que surpreende é o alto número de impugnação de assinaturas da Rede. Não estou dizendo que o TSE está errado. Mas é estranho porque há seis meses ouvimos que a Rede está coletando assinaturas. E o Solidariedade e o PROS conseguiram assinaturas e não estavam nas páginas dos jornais. Eles conseguiram 500 mil assinaturas cada um sem a gente saber, não tentaram conquistar a opinião pública — disse Ribeiro, afirmando que o partido de Marina Silva teve “inabilidade política” e demorou demais para começar o processo de coleta de assinaturas.

Para Ribeiro, o Brasil não tem partidos políticos demais.

— Tem gente que vota neles, a maior parte tem poucos votos. O Brasil tem uma estrutura com três partidos principais, PT, PSDB e PMDB, que são representativos da sociedade. Fora isso, tem mais uns três ou quatro importantes. Esses sete é que contam. Nenhum partido na sua estrutura tem mais que 20% da simpatia popular. É nossa cultura — disse Ribeiro.

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