Uma bandeira para unificar:
Constituinte já!
mas uma constituinte só dos cidadãos, sem os partidos
em defesa do estado democrático de direito
– I –
CONSTITUIÇÃO
Toda constituição é
feita para ser eterna. Constituições somente são substituídas em
momentos de mudança ou ruptura institucional.
Graças à sua atual constituição, de 1988, o Brasil vive no estado democrático de direito. Existe liberdade.
O estado democrático de direito é um valor em si.
A constituição pode também ser um valor em si, desde que
se mostre capaz de proporcionar à nação um grau de ordenamento
institucional minimamente satisfatório. Assim, em tese, toda
constituição deve contar com algum tipo de mecanismo para o seu
auto-aperfeiçoamento, para o melhoramento do ordenamento institucional
vigente.
Na nossa
constituição, esse mecanismo são os votos de três quintos da Câmara e do
Senado, em dois turnos. Assim, também em tese, a nossa constituição
deveria dotar a classe política dos meios para implantar as mudanças que
se façam necessárias.
A abortada (por
nós) PEC 37, que extirparia do Ministério Público os seus poderes de
investigação no claro propósito de acobertar a corrupção, ilustra
exemplarmente como são empregados pela nossa classe política tais
instrumentos: para piorar as coisas.
Por que não existe no Brasil uma lei simples? “Toda
prefeitura publicará mensalmente na internet as planilhas dos custos e
das receitas das empresas de ônibus, bem como a metodologia de cálculo
das tarifas”.
Não existe porque não interessa à classe política.
Depois que as
pessoas ocuparam as ruas, a classe política vai fazer algo que chamará
de “reforma política”, para dar alguma satisfação à sociedade.
Mas, a sério, dá para chamar essa gambiarra de reforma política?
Eles vão considerar o fim do voto obrigatório? Não.
A revogação de mandatos por recall?
As candidaturas avulsas sem necessidade de filiação partidária?
Eles vão resolver o inchaço vergonhoso de uma Câmara com 513 deputados, quando somente existem 396 assentos no plenário?
Vão limitar a
atuação do Senado às questões federativas, porque é só para isso mesmo
que serve uma casa com representação paritária dos estados?
Vão questionar a
necessidade de 5.567 municípios serem entes federados plenos, todos eles
com câmara de vereadores, procuradoria etc. etc.?
Não, eles não vão fazer nada disso.
Como de praxe, eles vão aproveitar para tentar piorar as coisas.
A atual classe
política brasileira já não detém mais qualquer legitimidade. Enquanto
requisito necessário ao bom funcionamento do estado democrático de
direito, ela já morreu e não sabe (veja por exemplo aqui).
Isso não é de
agora, depois das manifestações que sacudiram o Brasil. A classe
política enquanto instituição legítima morreu faz tempo, as
manifestações apenas evidenciaram isso. Ela pode ainda não saber que
morreu – mas a sociedade sabe.
Quando falamos em
“atual classe política” não nos referimos apenas às pessoas que são os
políticos (até porque há alguns bons políticos, cada vez mais exceção),
mas também, e principalmente, à mentalidade, à cultura política brasileira predominante, bem como ao arcabouço normativo das regras atuais.
O país precisa ter a coragem de assumir que a atual classe política brasileira é irrecuperável.
É chegada a hora
de encarar uma dura verdade: o nosso texto constitucional, ainda que a
nossa constituição seja democrática, ainda que tenha devolvido o país ao
estado democrático de direito após vinte anos de ditadura, é o
responsável pelo estado das coisas (status quo) do nosso ordenamento
institucional. É o responsável por ser a nossa classe política tal como
é.
Por que?
Antes de mais nada, porque a constituição foi escrita por essa classe política. Democratizou o país? Sim, e devemos gratidão eterna por isso. Hoje, isso é o bastante? Não mais.
Mas também porque
os mecanismos de alteração do texto constitucional, por meio do voto em
dois turnos de três quintos da Câmara e do Senado, são de uso exclusivo dessa classe política, e jamais serão por ela acionados contrariamente aos seus interesses.
Novamente: “classe
política” não é somente o Congresso Nacional, abrange os três poderes
nos três níveis, os ocupantes de cargos, os detentores de privilégios na
máquina do Estado, os partidos políticos etc. etc. etc.
Então, não se
trata da constituição ser boa ou ruim, ou dela conter coisas boas ou
ruins. Se trata dela não poder ser transformada. Se trata de que a
classe política detém um monopólio sobre as alterações na constituição
que foi instituído para ser legítimo – desde que legítima também fosse a
classe política.
Ou: a atual classe
política não seria irrecuperável se os meios para a sua recuperação –
especialmente a constituição – não estivessem sob o seu jugo.
A esse respeito, o sociólogo das redes Manuel Castells foi categórico: “a
classe política brasileira em sua maior parte é corrupta, não só pelo
dinheiro, mas também pelo poder, porque acreditam que o poder é dela e
não dos cidadãos (...) O Congresso atual não pode se
auto-reformar. Deveria ser dissolvido para que se inicie um processo
constituinte de reforma da democracia. O Brasil poderia ser um exemplo
para o mundo”
O que compromete o estado democrático de direito é esse estado das coisas.
Isso é de
lastimar, muitíssimo. Constituições foram escritas para serem eternas.
Mas também foram escritas para serem capazes de se auto-renovar, de
evoluir. A nossa, lastimavelmente, acabou escravizada por quem deveria
fazê-la florescer.
Quanto mais tempo
esse estado das coisas perdurar, quanto mais tempo a classe política
conseguir mantê-lo, mais espaço surgirá para aventureiros e golpistas,
de todos os matizes. Mais risco real haverá para o estado democrático de
direito. Quem vocifera contra a Venezuela deveria procurar evitar que o
Brasil trilhe o caminho de transformar-se numa.
Dissemos de início
que constituições somente são substituídas em momentos de mudança ou
ruptura institucional. Pois promovamos a mudança institucional, para
evitar que chegue o dia de uma ruptura institucional (sobre os riscos
disso e a coragem para enfrentá-los, veja aqui).
O que está
acontecendo agora no Egito deveria servir de alerta: as redes sociais
mobilizaram, o povo foi às ruas, uma ditadura corrupta de décadas
desmoronou... para quê? Para o país mergulhar no caos? Mudanças
institucionais que evitem rupturas requerem duas coisas básicas: 1) um
mínimo de predisposição na sociedade para a conciliação, em meio aos
dissensos e 2) o estado democrático de direito. Degraçadamente para o povo egípcio, eles lá não têm nem uma coisa nem outra (veja aqui).
Aqui no Brasil, caso a polarização entre as duas tribos (a dos
anti-Lula e a dos pró-Lula) continue a rumar para a incivilidade, então
que pelo menos se salvaguarde o estado democrático de direito.
Infelizmente, a
atual classe política nos trouxe a um ponto em que a única forma de
salvaguardar o estado democrático de direito no futuro é construir o
quanto antes uma porta de saída para essa classe política, e ao mesmo
tempo criar as condições para que possa ser gestada uma nova classe
política sintonizada com as aspirações da nação, um novo caráter de
agentes políticos com quem as pessoas possam se identificar e a quem
possam respeitar e admirar.
Esta, a sutileza
de que precisamos nos dar conta: a atual classe política brasileira pode
até não ser inimiga do estado democrático de direito, mas a sua
sobrevida é.
– II –
REFORMAS
As pessoas não
foram para as ruas por reforma política. Elas foram para as ruas por
transporte público, por saúde pública, por educação pública e por
segurança pública.
Alguém conhece UM único estado ou município brasileiro onde esses serviços sejam de boa qualidade?
Nota: o Brasil tem 27 estados e 5.567 municípios.
É claro que as pessoas estão indignadas porque boa parte dos nossos governantes é incompetente, desonesta ou ambos.
Ainda assim, daria para afirmar que a causa do problema é que todos os governantes dos 27 estados e dos 5.567 municípios são incompetentes ou desonestos?
É óbvio que os
governantes têm a obrigação de ser honestos e competentes, mas também é
óbvio que as causas são estruturais do Estado brasileiro.
Nenhuma reforma política resolve isso. Se fosse muito
bem feita (e não será), a reforma política poderia resolver o problema
da legitimidade da representação (o povo considerar legítimos os seus
representantes nos governos e nos parlamentos), mas não resolveria o
problema dos serviços públicos vergonhosos e iníquos (saúde, educação,
segurança, transporte etc.), nem resolveria o problema da corrupção que
permeia o Estado em todos os seus níveis e poderes. Nas palavras do jornalista Fábio Pannunzio: "o
Estado é uma engrenagem construída não para gerir o bem coletivo, mas
para conspurcá-lo. Não há remédio para cessar a roubalheira no ambiente
da instituições".
Reforma política
só não basta, tem que haver também reforma do Estado e reforma da
administração pública. Tem que haver mudanças também no funcionamento
dos poderes, na organização do Estado, no pacto federativo. Tem que
haver uma nova constituição. Tem que haver a refundação do Estado
brasileiro.
– III –
UNIFICAÇÃO
O movimento Occupy
Wall Street começou nas redes sociais e se espalhou pelas praças de
todos os Estados Unidos. Aconteceu o mesmo com os Indignados na Espanha.
Afora isso, o que têm eles em comum? Ambos se desmilinguiram, ambos são
hoje uma sombra do que já foram.
Eles se
desintegraram porque suas pautas são abrangentes e difusas demais,
exacerbando as divisões internas. Eles não conseguiram se unificar em
torno de uma pauta mínima que os mantivesse unidos e mobilizados. Sem um
norte comum, as pessoas acabaram por se cansar, e retornaram para as
suas vidas (para uma análise histórica de processos dessa natureza veja aqui).
As manifestações
de rua no Brasil já refluíram, e era inevitável que fosse assim. A
História não progride linearmente, ela avança em idas e vindas. Mas,
depois desse mês de junho o Brasil nunca mais será o mesmo. A sociedade
descobriu a força que tem. Isso não tem volta.
A força do
movimento não está no número de pessoas que irão para as ruas no dia de
hoje, e sim na disposição delas de se manter mobilizadas pelo tempo que
se fizer necessário. (o “já” da proposta pode levar meses ou anos...)
Isso requer uma causa que as unifique.
Unificadora, não
única. A multiplicidade das causas é saudável, afinal as pessoas pensam
diferente umas das outras, e que bom que é assim. Os adeptos da tarifa
zero podem fazer uma manifestação num bairro enquanto os adeptos da
redução da maioridade penal fazem outra manifestação noutro bairro,
todos debaixo de uma mesma bandeira unificadora.
Precisamos, em
especial, de humildade. A humildade de reconhecer que aquilo que cada um
de nós quer não necessariamente é o que todo mundo quer.
Por exemplo, a
tarifa zero. É claro que faria aumentar a demanda pelo transporte
coletivo, logo, teríamos mais ônibus circulando nas ruas. Os autores
deste texto simpatizam com a proposta da tarifa zero. Mas, será que todo
mundo também simpatiza? E será que todo mundo concordaria com aumento
de impostos (IPTU) para bancar a tarifa zero? Nós podemos ir para as
ruas defender a tarifa zero. Mas não podemos esperar que todo mundo vá
para as ruas defender conosco a tarifa zero.
Sem contar que,
se a falta de uma bandeira unificadora favorece a pulverização, ela
pode também favorecer uma polarização, à la Venezuela (para uma boa
notícia a esse respeito, veja aqui).
Outra coisa: não é
verdade que o movimento necessite da consolidação de alguma liderança.
Ele pode e deve continuar horizontal. Se as pessoas abraçam uma causa em
comum, qualquer uma delas pode ser líder num dado momento ou lugar.
Parêntesis: na Itália, Beppe Grillo reuniu o “seu”
movimento Cinco Estrelas para expulsar a senadora recém-eleita Adele
Gambaro, novata na política como todos no partido, simplesmente
porque... ela criticou publicamente o seu estilo de liderança. Fecha
parêntesis.
Tampouco é verdade
que o movimento requeira institucionalização. Se o movimento é plural,
fragmentário, qualquer institucionalização também deve ser assim. O
movimento não só pode como deve dar origem a novos (no plural) e
diversificados partidos políticos, que ajudem a forjar uma nova classe
política.
Não precisamos de
liderança nem de institucionalização. Precisamos de uma bandeira
unificadora, clara, forte, concreta, arrebatadora e certeira, que
mantenha as pessoas unidas e mobilizadas.
– IV –
CONSTITUINTE
Uma constituinte é
o que pode rasgar uma porta de saída para a classe política atual e
incubar uma nova classe política, verdadeiramente identificada com as
aspirações maiores da nação.
Uma constituinte é
o que pode trazer respostas inovadoras para os problemas históricos da
estruturação do Estado, do combate à corrupção e tantos outros.
Uma constituinte é o que pode ser uma causa unificadora, que nos mantenha unidos e mobilizados.
Mas, em que medida uma constituinte seria compatível com a defesa do estado democrático de direito?
Em que medida uma constituinte poderia reter, evitando que se perdesse, aquilo que a atual constituição tem de bom?
Em que medida uma constituinte não acabaria capturada por grupos de interesse?
Construir essas respostas é um desafio.
Passamos agora a essa discussão. Veja também na seção Controvérsias (que não tem esse nome à toa) considerações quanto ao caminho que estamos delineando para que essas coisas aconteçam.
– V –
ELEIÇÃO CIDADÃ
O que é uma constituinte, democraticamente eleita pelo povo? É um esforço de entendimento nacional.
A tarifa zero passará a constar da nova constituição? Talvez.
A redução da maioridade penal passará a constar da nova constituição? Talvez.
A desmilitarização da polícia passará a constar da nova constituição? Talvez.
Nós pensamos diferente uns dos outros quanto ao que seja o melhor para o Brasil.
A nova
constituição será do agrado de todos? Claro que não, isso jamais
acontecerá. O importante é que ela seja acatada e respeitada por todos.
Para isso, o processo precisa ser percebido por todos como tendo sido justo.
É óbvio que essa
constituinte não pode ficar na mão dos partidos, porque senão eles
aproveitam para estragar ainda mais o país. Se for para eleger uma
constituinte com a regra eleitoral atual, é melhor que não haja
constituinte nenhuma.
Uma constituinte é
uma carta branca, para o bem ou para o mal. Nós não fomos para as ruas
para dar carta branca a ninguém. A carta branca tem que ser dos
constituintes eleitos pelos cidadãos brasileiros, segundo as regras dos cidadãos brasileiros, não segundo essas regras viciadas dos partidos.
A proposta de emenda constitucional (PEC)
para convocar a constituinte tem que determinar um processo eleitoral
digno e limpo, que pertença aos cidadãos e não aos partidos:
- Voto facultativo ao invés de obrigatório.
- Somente
candidaturas individuais avulsas, de parte de qualquer cidadão. Em
igualdade de condições. Nada de chapas, nada de voto de legenda, nada de
monopólio dos partidos (cada parlamentar, se quiser, poderá se
candidatar na qualidade de um cidadão a mais dentre todos os outros,
desde que para isso ele abra mão do seu mandato).
- Cada eleitor vota em apenas um único candidato (do contrário surgirão “chapas”, e haverá maior influência do poder econômico).
- Financiamento
das candidaturas somente por doações de pessoa física, e limitadas a um
teto baixo. Criminalização pesada do caixa dois. Criminalização pesada
de doações por pessoas jurídicas.
- Fim da
propaganda gratuita no rádio e na TV. Viva o território livre da
internet. Viva a capacidade autônoma de cada um de fazer a sua própria
campanha na sociedade. Viva o velho e bom boca a boca.
- Criminalização pesada de qualquer propaganda paga. Criminalização pesada de propaganda disfarçada pelos órgãos da imprensa.
No entanto, romper
o monopólio dos partidos só não basta. Mesmo com regras novas e
verdadeiramente democráticas existe o risco do poder econômico se impor.
Grandes grupos
econômicos, os bancos e o mercado financeiro, o agronegócio, as
corporações da mídia, a indústria farmacêutica, os planos de saúde, os
donos de cartórios e até as federações de futebol, todos vão tentar
fazer a balança pender para o seu lado. As regiões (vide guerra fiscal)
também, as religiões também, não apenas os evangélicos. Os sindicatos de
servidores públicos também, e tanto mais quanto sintam que têm a
perder, e os demais sindicatos também. Até mesmo o crime organizado (por
que seria diferente?) também.
Tirando o último, é
legítimo que queiram impor um peso desproporcional ao seu real tamanho
na sociedade. Só não é legítimo que consigam.
Se a constituinte
vier a ser capturada por grupos de interesse, o risco de que a nova
constituição acabe pior que a atual é real.
E, se a constituinte vier a ser capturada por grupos de interesse, a nova classe política a ser formada igualmente o será.
Já propusemos que haja somente candidaturas avulsas de cidadãos sem necessidade de filiação partidária. Vamos agora além.
Estamos propondo
uma constituinte com quinhentos membros. Mesmo com essas novas regras, a
capacidade do poder econômico de influenciar a eleição daqueles que
serão os quinhentos mais votados será imensa. Mas, e se ao invés de
apenas quinhentos, forem os cinco mil mais votados? E se forem os
cinquenta mil mais votados? Claramente, essa influência se diluiria.
Se a diferença de
votos ente aquele que for o 500º mais votado e aquele que for o 501º for
exígua – e certamente será mínima – eleger o 500º em detrimento do 501º
fará diferença para esses dois candidatos, mas não fará diferença
nenhuma para a sociedade. Se todas as candidaturas são
“candidaturas-do-eu-sozinho”, então não importa o candidato em si, o que
importa é que a sociedade esteja adequadamente representada pelo
conjunto dos eleitos.
Então, se estamos trabalhando com candidaturas individuais, podemos auferir proveito do princípio estatístico da amostragem.
Podemos considerar que os cinco por cento mais votados expressam a
vontade soberana da população. São suficientemente representativos, em
detrimento dos noventa e cinco por cento restantes. E podemos extrair os
500 constituintes desse universo dos cinco por cento mais votados, na
qualidade de uma amostra representativa do mesmo.
As eleições municipais de 2012 tiveram cerca de meio milhão
de candidatos a prefeito, vice-prefeito e vereador, cada um deles
filiado a algum partido político. Podemos supor que uma eleição aberta a
qualquer cidadão brasileiro, para escrever a constituição do país,
tenha muito mais candidatos. Vamos supor, por baixo, que esse número
seja de um milhão. Cinco por cento de um milhão são... os cinquenta mil
mais votados. Desses cinqüenta mil, se sorteiam os quinhentos
constituintes. Se o total de candidatos atingir, digamos, cinco milhões
de cidadãos, o sorteio dos quinhentos dentro dos mesmos cinquenta mil
mais votados significaria extrair a amostra dento de um universo de um por cento do total dos candidatos, ficando excluídos, pelo voto, os outros noventa e nove por cento! Como algo assim poderia não ser considerado expressivo da vontade do povo brasileiro?
Delírio? Pois foi exatamente isso o que foi feito na Islândia.
Naquele país, a
crise econômica de 2008 desmascarou o conluio da classe política
juntamente com o mercado financeiro e a grande imprensa (qualquer
semelhança não é mera coincidência...). A comoção nacional impunha a
mudança institucional, através de uma constituinte.
Uma análise
estatística indicou que o número de novecentos e cinquenta cidadãos
seria suficiente como amostra representativa de toda a sociedade (a
Islândia é um país de quatrocentos mil habitantes), e assim foram
aleatoriamente sorteadas novecentas e cinquenta pessoas para decidir
tudo o que constaria da nova constituição. Depois que isso ficou pronto
foi formado, por eleição, um colegiado de outras vinte e cinco
pessoas para a tarefa técnica de redigir o texto constitucional. Esse
trabalho de redação foi aberto na internet, e todos os cidadãos foram
instados a acompanhar e enviar críticas e sugestões ao que estava sendo
escrito (cerca de um por cento da população participou dessa
co-autoria). Em outubro de 2012 a nova constituição foi a referendo, com
aprovação por 67% dos votos. Resta como último passo a ratificação pelo
parlamento, onde ainda há resistência de partidos ligados ao cartel da
indústria pesqueira, cujas reservas de mercado serão abolidas pela nova
constituição.
Ah, em tempo: todo
o processo se dá em plena vigência do estado democrático de direito,
com um respeito à constituição existente que será mantido até o dia da
promulgação da nova constituição (é justamente devido a isso que o
processo ainda sofre resistência dos políticos).
O que estamos
propondo é até mais conservador que a solução islandesa, com o acréscimo
de dois “filtros” prévios ao sorteio dos constituintes: o primeiro é
que apenas serão considerados aqueles cidadãos que, manifestamente, se
dispuserem a escrever a constituição (os candidatos - esse seria o
"filtro da auto-proposição"), o segundo é que o sorteio se dará apenas
entre aqueles mais votados (como vimos, algo entre um e cinco por cento
do total de candidatos - esse seria o "filtro da representatividade").
Tudo isso consta da proposta de emenda constitucional (PEC).
As ruas devem exigir este texto específico para a PEC. Não saiamos
delas enquanto a PEC não tiver sido aprovada, nestes termos.
Ajude a divulgar essa ideia!
Veja aqui mais detalhes da proposta
Veja aqui a Proposta de Emenda Constitucional (PEC)
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Para contato, escreva para contato@constituinte.com.br
(...) nós temos a aventura de fazer o gênero humano novo, a mestiçagem na carne e no espírito (...) Então,
nós fizemos um povo. Um povo capaz de herdar dez mil anos de sabedoria
indígena, de adaptação ao trópico e fazer uma civilização tropical (...) lavados em sangue negro, em sangue índio, melhorado (...) esse
povo vai realizar sua potencialidade. Não é possível que durante tantos
séculos uma classe dominante infiel nos queira explorar como um
proletariado externo. Isso não vai continuar, não (...) nós vamos amadurecer e é preciso vencer um dia a canalha (...) é o gene Tupinambá, os que foram mortos. É a herança dos trópicos.
– Darcy Ribeiro
Os homens vão se rebelar
Dessa farsa descomunal
(...)
Das ruínas um novo povo vai surgir
E vai cantar afinal
As pragas e as ervas daninhas
As armas e os homens de mal
Vão desaparecer nas cinzas de um carnaval
(As Forças da Natureza, João Nogueira e Paulo César Pinheiro)