Papa questiona contas de bispo do Ceará
D. Fernando, de Crato, já foi convocado pelo Vaticano para dar explicações sobre acusação de irregularidades em venda de imóveis
15 de dezembro de 2013 | 2h 06
Jamil Chade, correspondente / Genebra - O Estado de S.Paulo
Um bispo no Brasil está na mira do papa
Francisco, que vem marcando seu pontificado com a luta contra a
corrupção, a reforma da Cúria e a exigência de posturas exemplares por
parte dos religiosos. O bispo da diocese de Crato, d. Fernando Panico,
de 67 anos, entrou no radar do chefe da Igreja em Roma depois de
inquérito aberto pela Polícia Civil em sua cidade por causa de uma
polêmica em torno da venda de casas da diocese e até por acusações de
estelionato.
Fontes no Vaticano confirmaram ao Estado que
Francisco ainda não tomou uma decisão sobre o que será feito e espera a
conclusão das investigações da Justiça. Mas Jorge Bergoglio não gostou
do caso.
O número de acusações contra d. Fernando Panico não é pequeno. Mas,
acima de tudo, fontes no Vaticano revelam que é justamente a atuação de
uma diocese como negociadora de imóveis que desagradou ao papa.
As investigações foram abertas depois que o bispo foi acusado de ter
continuado a cobrar aluguéis das casas de prioridade da diocese, mesmo
depois de elas terem sido vendidas. Outra acusação era de que a venda
dos imóveis ocorreu sem que os moradores tivessem a opção de compra. O
bispo acabou sendo convocado para depor.
O caso chegou até Roma e, em outubro, Panico esteve reunido em duas
ocasiões com o papa no Vaticano. Oficialmente, as audiências tinham como
meta debater o processo de reabilitação canônica do padre Cícero
(1844-1934) e sobre o processo de beatificação de Benigna Cardoso da
Silva, mártir da castidade (1928-1941).
Mas um dos temas centrais da conversa foi justamente a cobrança do
papa para que Panico desse explicações sobre as denúncias de estelionato
e formação de quadrilha. Um primeiro encontro ocorreu com outros
participantes, no dia 9 de outubro. Cinco dias depois, o bispo voltou a
ser convocado, desta vez para uma audiência a portas fechadas.
D. Fernando, um italiano naturalizado brasileiro, ordenou-se padre em
1971, em Roma. Chegou ao Brasil em 1974 e está à frente da diocese do
Crato desde maio de 2001.
Exemplos. Francisco deixou claro que não iria
tolerar esse tipo de escândalo e tem coletado uma série de casos que, em
sua avaliação, poderiam prejudicar a imagem da Igreja. Há um mês, o
Vaticano suspendeu um bispo alemão por seus gastos considerados
excessivos. O punido foi o bispo de Limburg, Franz-Peter Tebartz-van
Elst, depois que gastou 31 milhões (R$ 93 milhões) para renovar sua
residência oficial.
O papa, desde o primeiro dia de seu mandato, havia deixado claro que
queria uma "Igreja pobre para os pobres" e que a função dos religiosos
era servir. Elst acabou se transformando em um primeiro teste para o
argentino. O caso ainda revela que o pontífice está disposto a punir
esse tipo de comportamento, enquanto dá demonstrações de que não vai
perseguir bispos por declarações sobre a doutrina.
Em pouco meses, Francisco deu diversas demonstrações de que seu
estilo é o de recusar a ostentação e ordenou ao clero que siga o mesmo
caminho da simplicidade. Ele criticou os carros usados por padres, optou
por não viver no Palácio Apostólico e condenou gastos elevados. Além
disso, instaurou regras de transparência das finanças do Vaticano e
ordenou uma varredura geral nas contas da Santa Sé.