sexta-feira, 21 de agosto de 2009

Entrevista de Roberto Romano à Gazeta do Povo, Curitiba, sobre o Senado, Lula e quejandos.


Divulgação /
Entrevista

“Senadores foram capachos do Lula”

Roberto Romano, professor de Ética e Filosofia Política da Unicamp

Publicado em 21/08/2009 | André Gonçalves, correspondente

Brasília - O apoio do PT ao engavetamento das denúncias contra o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), é mais um episódio de servilismo do partido aos interesses do presidente Lula. A opinião é do professor de Ética e Filosofia Política da Universidade de Campinas (Unicamp), Roberto Romano.

Segundo ele, Lula age como uma “criança mimada” ao interferir nas decisões do Congresso Nacional. “Ninguém tem coragem de dizer verdades ao presidente.”

Romano também alerta que a ética dos senadores está se afastando cada vez mais da ética do restante da sociedade. “Os senadores estão cometendo haraquiri político ao acabar com a legitimidade deles próprios.”

O PT passa por uma crise ética?

Eu acho que a resposta é relativa. Crise ética não é bem o caso, nem é correto restringi-la ao PT. A ética vivida no Senado é bastante sólida – uma ética absolutamente contrária à democracia, à responsabilidade e ao respeito ao cidadão. Mas ela é concreta, tanto que livraram mais uma vez a cabeça do chefe (José Sarney). Esse episódio mostra de novo que a ética dos políticos conflita com a da sociedade. O que existe na verdade é uma crise entre a ética do Senado e a da sociedade brasileira. A sociedade evolui e nossos senadores mantêm o padrão patrimonialista de sempre. Os últimos acontecimentos acabaram com a penúltima amarra entre eles e a sociedade. Os senadores estão cometendo haraquiri político ao acabar com a legitimidade deles próprios.

O que significam as saídas de Marina Silva e Flávio Arns do partido?

Eles estão saindo do PT porque es­­­tão perdendo o vínculo com a sua representação. A decisão dos dois va­­loriza o compromisso com os eleitores. O senador Arns, por exemplo, tem um patrimônio simbólico inestimável. Ele carrega o nome e o legado do cardeal dom Evaristo Arns e da doutora Zilda Arns, figuras internacionais. É um capital perene, que ele soube honrar.

Como fica a situação dos senadores petistas que votaram a favor de José Sarney?

A cara de pau da maioria dos senadores nesse caso foi tremenda. E vai continuar assim porque faz parte da ética que eles próprios construíram. Delcídio Amaral, Ideli Salvati e João Pedro jogaram contra eles próprios e visivelmente se envergonharam do que fizeram. Não foi à toa que o Delcídio se escondeu atrás de livros durante a sessão, que a Ideli evitou falar alto ao microfone. Atitudes lamentáveis. Eles foram capachos do Lula.

A população percebe essa situação?

Temos percepções muito distintas. A população do centro-sul do Brasil, de Porto Alegre até o Sul de Minas Gerais certamente está acompanhando tudo com uma indignação muito grande. No Nordeste e Norte depende muito do grau de mobilização da sociedade, do nível de dependência dos programas assistenciais do governo. Não diria que estão todos alheios ou todos indignados. Mas o Lula sabe o tamanho do desgaste que vem sofrendo.

Quer dizer que Lula pode enfim ficar com a imagem arranhada, após tantas pizzas e escândalos?

Lula continua tendo o charme de sempre e aperfeiçoou-se ainda mais no uso do discurso demagógico, o que minimiza o desgaste. Mas o castigo pode vir de forma diferente. Apesar de todo esforço, ele não tem como certa a adesão do PMDB à candidatura da ministra Dilma Rousseff. Além disso, Dilma tem se mostrado uma candidata desastrosa. Ela é tão explosiva e insensata quanto Ciro Gomes.

Lula é o responsável pela ambiguidade ética do PT?

O PT é responsável pela ambiguidade do Lula. E vice-versa. O partido sempre investiu no Lula dentro de uma relação de servilismo. Durante 20 anos o PT não permitiu que aparecessem outros candidatos à Presidência. Lula é o dono do PT. Ele parece uma criança mimada. Ninguém tem coragem de dizer verdades ao presidente. Por outro lado, ele diz todo tipo de absurdos. Essa história de falar que o Sarney não é homem comum foi uma calamidade. Mas não é de agora. Ele sempre foi assim e sempre porque o PT permitiu.