quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

Para recordar e recordar. Sobretudo em vésperas de eleição.

12/08/2002 - 18h47


Leia a seguir a íntegra da parte da sabatina do presidenciável Luiz Inácio Lula da Suilva (PT) em que ele responde às perguntas da platéia. A sabatina faz parte de um ciclo de encontro com os presidenciáveis promovido pelo jornal Folha de S.Paulo.

Participam da sabatina a editora-executiva da Folha, Eleonora de Lucena, e os colunistas do jornal Clóvis Rossi, Luís Nassif e Gilberto Dimenstein.

Clóvis Rossi: Pergunta do professor Roberto Romano, onde é que está o Roberto Romano? Não enxergo nada daqui. Oi Roberto, tudo bem? São várias, vou fazer só a primeira, Roberto, senão não dá tempo. "Governos eleitos na América do Sul enfrentam pesadas críticas da imprensa as quais tentam responder com atitudes respectivas, isso ocasiona choques que chegam a ameaçar a estabilidade institucional como no caso da Venezuela. Qual será a sua política para a mídia internacional e brasileira, como pretende vossa senhoria se relacionar com os formadores de opinião?

Lula: Permita chamá-lo Roberto, eu tive a oportunidade de, estando com o Chavez, dar um conselho ao Chavez, disse que conselho se fosse bom a gente não dava, a gente vendia, mas como eu estava com ele eu tive a oportunidade de dar esse conselho para ele, o Chavez é um jovem de 40 e poucos anos, tem a sua formação iminentemente militar, ele não é um político na essência da palavra. A Venezuela não tem partidos como tem no Brasil, não tem sindicato como tem no Brasil, não tem sequer uma igreja progressista como tem no Brasil, é um Estado de instituições mais frágeis, onde a empresa de petróleo consegue até derrubar um presidente da República. .

Então, eu disse ao Chavez: Olhe Chavez, eu acho que é preciso acertar na política, ou seja, esse negócio do presidente da República ficar dizendo que não conversa com A, com B, não cabe ao Presidente da república dizer que não conversa, ele é presidente de todos. Então você precisa conversar com todo mundo. Eu, quando cheguei lá, no dia que eu cheguei lá, tinha uma turma batendo panela contra ele e outra turma soltando rojão, foguete a favor dele. Eu falei: isso aqui é impossível. Ou seja, é preciso criar um canal de conversação com a sociedade e restabelecer, sabe, a tranqüilidade para você não poder executar a sua política social que você sonha. Uma coisa, Roberto, grave que aconteceu na Venezuela, porque o movimento estava muito nervoso lá, uma das coisas que mais mexeu com a elite venezuelana foi, primeiro a questão da terra, ou seja, quem tinha mais de 5.000 hectares de terra, ou seja, não queria passar por um recadastramento, tinha muita gente que tinha terra como no portal do Parapanema, que o Montoro tentou recuperar as terras em 92, tem muita gente que é dono de terra ilegalmente, ele tentou fazer isso e as pessoas se rebelaram. A questão da pesca, ou seja, ele proibiu a questão do arrastão, quando passa a rede imensa no fundo do mar, aquilo acaba com a fauna, ou seja, ele queria que prevalecesse a chamada pesca artesanal. Essas foram as razões maiores do ódio contra o Chavez. Eu disse para ele: Chavez, não tem jeito, ou você estabelece uma negociação com a sociedade, com os empresários, mesmo com aqueles que são mais duros contra você, com os donos dos canais de televisão com os donos dos jornais para que se estabeleça a possibilidade de governar este país. Ninguém vai conseguir viver nessa tensão a vida inteira.

Agora, você sabe que essa não é a minha horta. Eu sou tão negociador que em 1975, quando Petrônio Portela disse: vai começar o processo de negociação, me chamou, tinha muita gente que dizia: Lula, não vá.

Eu falei: Eu vou. Por que você vai? Porque eu tenho o que dizer. Eu fui lá. Então a minha vida inteira só fiz isso, sabe, fazer acordos, fazer negociações (...) Em outros tempos, o que aconteceria, Roberto?

Um dirigente sindical correria e iria para outro país. O que eu fiz? Como eu não era politizado, o que eu fiz?

Eu cheguei ao sindicato, vi a manchete da Folha, liguei para o comandante do segundo Exército, eu falei: O senhor recebeu o Vidigal, eu quero ser recebido. Fui lá, conversei 3 horas com ele e cumpri o que ele disse para mim. Fiquei no sindicato e o Exército não se meteu nas nossas greves. Depois então veio o Miltinho, e botou o Exército para bater na gente.

Mas eu acho que no Brasil nós não temos nem essa cultura, nossa sociedade é mais organizada, acho que os sindicatos estão mais preparados, sabe, então eu acho que nós não temos nenhum problema de ter algo assimilar aquilo lá. Até porque se o cara não quiser conversar comigo eu vou em cima dele para conversar.

Clóvis Rossi: Ainda bem que é para conversar...