quarta-feira, 17 de março de 2010

Correio Popular de Campinas.


Fotos, algumas apenas, dos "grandes feitos" e "grandes líderes" dos militantes no século 20. Pelo visto, outros virão, para vergonha e tristeza do ser humano. RR





Publicada em 17/3/2010


Militância sem caráter



O militante é soldado mantido pela ordem partidária. Quando o Partido Comunista apoiou Vargas, disse Gregório Bezerra: “Eu, pessoalmente, achava que Getúlio devia sair pelas armas, embora estivesse plenamente de acordo com o apoio do Partido a Vargas (...) Enfim, eu era um soldado do Partido e cumpria suas decisões, depois de discutidas e aprovadas pela maioria”. (G. Bezerra: Memórias, 1979). Qual seria a missão da Escola de Quadros do Partido Comunista ? Esse é o tema de uma tese escrita por Sérgio Rückert, cujo PDF pode ser lido na home page da Unicamp. O alvo, segundo Miguel Alves no “Informe ao Pleno do Comitê Central em janeiro de 1956”, seria “preparar política e teoricamente quadros capazes de levar o programa do partido ao povo e transformá-lo em programa de todo o povo”. A educação deve “contribuir para formar homens novos, verdadeiros comunistas, revolucionários práticos de novo tipo, homens que sejam soldados da revolução.”

Para Diógenes Arruda Câmara, dirigente do partido, tudo o que os militantes fazem deve ser orientado “pela doutrina marxista-leninista, doutrina todo-poderosa porque verdadeira”. (Câmara, D. : “Forjemos nosso partido à imagem e semelhança do partido de Lenin e de Stalin”, Revista Problemas, 1953). Importa, na escolha dos quadros, diz Prestes, “o devotamento à causa da classe operária e a fidelidade ao partido (...) o espírito de disciplina e a intransigência pela aplicação da linha no partido” ( “Informe ao IV Congresso do Partido Comunista do Brasil”, Revista Problemas, 1954). A escolha dos militantes não vem do seu nível intelectual, mas do acatamento de ordens superiores. Alcides Campos, selecionador de quadros, afirma ser erro acolher pessoas “não por sua fidelidade, abnegação, espírito de sacrifício e devotamento ao partido, mas pelo seu nível cultural (...) Esse critério pequeno-burguês e liberal levou a que fossem propostos para membros dos comitês regionais elementos que não eram de comprovada fidelidade ao partido” (Campos, A. “Seleção, distribuição e formação dos quadros de nosso partido”, Revista Problemas, 1955). “Somente a sabedoria coletiva do Comitê Central, tendo à frente o camarada Prestes, permite dar aos militantes uma educação de elevado teor ideológico” (M. Alves, Informe em nome do Presidium ao Pleno do CC, Revista Problemas, 1956).

“O partido”, diz Arruda Câmara, “é a aureola do militante. Fora do partido os que eram grandes se tornam pequenos, os gigantes se transformam em anões” (“Reforçar a vigilância revolucionária, tarefa vital do partido”, Revista Problemas, 1952). Diz bem Lefort: “Não há comunista sem se subordinar incondicionalmente aos princípios do partido” (A invenção democrática). Leoncio Basbaum expõe o modo pelo qual um projeto foi analisado no partido e mostra os truques dos “superiores” em relação aos militantes. “Quando começou a discussão do programa, já havia entre nós uma forte indisposição contra a direção do partido, sobretudo pela chantagem visível que pretendiam fazer contra os membros das bases, para impedir que o documento fosse discutido. Essa chantagem consistia em afirmar, sem provar, que o programa havia sido elaborado por nada menos de 400 economistas e de alto gabarito (...) a mentira era forte demais. Não havia 400 economistas no partido, nem 40, talvez nem 4” (Leoncio Basbaum, Uma vida em seis tempos, Memórias). O costume de mentir em termos de qualificações acadêmicas, na ordem curricular, não é novo nas hostes militantes.

A ética mentirosa e manipuladora gerou estalinistas e trotskystas de espinha torta, língua inquinada, joelhos rotos. Seus filhotes mostram os mesmos trejeitos e má-fé. A corrupção de caráter vem do partido idiotizante, pouco importa o nome ostentado, se PC, PT, PSol ou quejandos. Boa parte da chamada militância, na verdade, não possui mais caráter ou vergonha. Ela silencia diante de tiranias, como a cubana, e apoia a fala do presidente militante sobre dissidentes cubanos, comparados a bandidos. Tal apoio mostra o alcance da infâmia. Assim foram gerados o Gulag, o Kmer Vermelho, a Stasi, a KGB. O torturador dormita no peito militante, à espera da sua chegada ao poder absoluto. E fétido.