Reforma da saúde contraria essência dinâmica dos EUA
O Partido Democrata não é estruturado para reduzir os gastos com a saúde e a seguridade social; ele não diz "chega de gastar" -ao contrário, alimenta e protege
DAVID BROOKS
DO "NEW YORK TIMES"
O DNA do Partido Democrata é reconhecível no conteúdo da reforma do sistema de saúde e na maneira como ela foi aprovada. Houve o nervosismo e a irascibilidade inevitáveis, as mesquinhas trocas mútuas de favores políticos, mas também o idealismo elevado e a preocupação fundamental com os setores vulneráveis da população.
E houve também a fé no grande projeto de esquerda. Desde o New Deal, os democratas protegeram os desempregados, os idosos e os pobres. Agora, graças à reforma da saúde, milhões de famílias trabalhadoras irão dormir sabendo que uma doença não as ameaçará com a ruína financeira.
Os membros da equipe Obama-Pelosi passaram o último ano numa busca tortuosa, suportando a opinião pública hostil, críticas justas, desinformação grosseira, uma multidão de ideias descabidas e as previsões equivocadas de pessoas como eu, que achavam que a sorte não estava do lado deles. Eles merecem as homenagens da posteridade por sua capacidade de perseverança.
Idosos e dívida
A segunda maior ameaça ao dinamismo dos EUA é a explosão da dívida federal. Os democratas podem falar em contenção fiscal, mas eles não sentem a paixão por isso. A nova lei é repleta de artifícios que visam uma boa avaliação do Escritório Orçamentário do Congresso, mas não equilibram o Orçamento de fato. Os democratas fizeram o suficiente para resolver seu problema político (não dar a impressão de insensatez fiscal), mas não o suficiente para resolver o problema real.
Ninguém sabe como a lei vai funcionar na prática. É um empreendimento exponencialmente mais complexo que a Guerra do Iraque, por exemplo. Mas, para mim, a sensação é que ela representa o fim de algo, e não o começo de algo. É a conclusão nobre do grande projeto esquerdista de erguer um sistema abrangente de bem-estar social.
A tarefa que temos pela frente é salvar os EUA da estagnação e da ruína fiscal. Precisamos elevar os impostos sobre o consumo. Precisamos preservar os benefícios para os pobres e reduzir os da classe média. Precisamos investir mais em inovação e capital humano
O Partido Democrata não parece estar em condições de fazer frente a esse desafio que está por vir (o Partido Republicano tampouco). Os EUA se encontram na posição de uma família que gasta livremente e se aproxima da falência e que, no último minuto, anuncia que fará uma doação gigante para organizações de caridade. A gente admira o ato de generosidade, mas deseja que a família tivesse vendido alguns de seus Mercedes para pagar por ele.